10 de novembro de 2016

Sair do armário no trabalho

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A questão da sexualidade no ambiente de trabalho ainda é um tabu em muitas organizações. Tirando algumas multinacionais que replicam por aqui as políticas de diversidade adotadas nas matrizes norte-americanas e europeias, a maioria das empresas tem dificuldade em tratar deste assunto com tranquilidade. O resultado é um ambiente de comentários maldosos, gays e lésbicas acuados e baixos níveis de produtividade.

Pesquisa da ONG OutNow realizada em 11 países confirma esta realidade. Se na Austrália 51% dos funcionários LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros) são totalmente open no trabalho, no Brasil o número cai para 35% – e na Índia despenca para 8%.

Nós ostentamos ainda o incômodo título de campeões em homofobia no trabalho: 68% dos funcionários gays e lésbicas já ouviram comentários preconceituosos, muitas vezes disfarçados de piada, nas organizações.

Entre os 968 LGBT brasileiros entrevistados nesta pesquisa, apenas 25% dos gays acreditam que seus ambientes de trabalho são totalmente livres de homofobia. Entre as lésbicas, a situação piora: só 20% delas afirmam trabalhar em ambientes sem preconceitos. As pessoas trans têm acesso tão limitado ao mercado que a OutNow encontrou apenas três delas atuando em organizações no Brasil.

Com dados tão desanimadores, não é de se estranhar que tantos gays e lésbicas queiram mudar de emprego. Imagine a pressão psicológica que é passar a maior parte do dia num ambiente opressor e desrespeitoso.

Vamos fazer um exercício de empatia: imagine você, leitor (a) heterossexual, chegar à empresa na segunda-feira e não se sentir à vontade para falar sobre seu fim de semana, não poder colocar uma foto do seu (sua) companheira (o) na mesa de trabalho ou, pior, se policiar o tempo todo para mudar o gênero do seu amor. Chamar “ele” de “ela” é uma estratégia de sobrevivência bastante comum nas organizações.

O resultado de tanta opressão impacta nas contas da empresa: entre os LGBT assumidos, 75% acreditam que são produtivos no trabalho. Entre os que estão closeted, o número cai para 46%.

Não se trata, é claro, de tirar ninguém do armário à força. Muito pelo contrário. Mas é preciso criar condições objetivas (extensão de benefícios, treinamento em diversidade, sistema de ouvidoria eficiente) e garantir um ambiente mais acolhedor. Isso envolve uma profunda mudança na cultura da organização. Dá trabalho, mas os resultados compensam.

O mesmo estudo da OutNow estima – baseado em produtividade, turnover e processos judiciais – que a homofobia custa US$405 milhões à economia brasileira anualmente. Se o seu CEO precisa de números para se convencer a apostar em políticas de diversidade, dê um jeito deste artigo chegar até ele. Sua empresa agradece.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Ricardo Sales

Ricardo Sales é consultor de diversidade, pesquisador e conselheiro consultivo. É formado pela USP, onde também realizou mestrado sobre diversidade mas organizações. Atua para algumas das maiores empresas do país. É conselheiro do Comitê de Diversidade do Itaú. Foi eleito pela Out&Equal um dos brasileiros mais influentes no assunto diversidade nas organizações e ganhou o Prêmio Aberje de Comunicação, em 2019. Foi bolsista do Departamento de Estado do Governo dos EUA e da Human Rights Campaign, sendo reconhecido como uma liderança mundial no tema diversidade. É também palestrante, professor da Fundação Dom Cabral e da Escola Aberje de Comunicação, colunista da revista Você SA e do Estadão, além de membro-fundador do grupo de estudos em diversidade e interculturalidade da ECA/USP.

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