19 de setembro de 2019

Curso Aberje e ABCPública debate censura e patrimonialismo na gênese da comunicação pública no Brasil

Por Eduardo Maretti

Eugênio Bucci

No primeiro módulo do Programa Avançado de Comunicação Pública, “Novos olhares, novas práticas”, promovido no dia 3 de agosto por Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) e ABCPública (Associação Brasileira de Comunicação Pública), o jornalista Eugênio Bucci falou sobre conceitos e história da comunicação pública no Brasil, demonstrando o quanto ela é permeada por uma tradição distante do espírito republicano, democrático e iluminista.

República (res publica), do latim, significa “coisa pública”, enquanto democracia, do grego, quer dizer “poder do povo”. No entanto, para Bucci, se há uma área em que o bem público é usado para fins particulares, privados, familiares ou partidários, essa área é a da comunicação pública. “Se alguém defendesse que nas escolas públicas de determinada cidade só poderiam se matricular crianças cujos pais se filiaram a um partido, ou se os hospitais só aceitassem pacientes na mesma condição, seria um escândalo. No entanto, no Brasil, os recursos da comunicação pública são usados com critérios partidários e a gente acha que tudo bem”, afirmou.

A gênese da formação brasileira, do ponto de vista da comunicação pública, é ilustrativa. Os portugueses sempre foram rigorosos com a publicação de impressos. Desde 1536 (em Portugal) qualquer impressão de livro passava por três censuras: o Santo Ofício, Ordinário e o Desembargo do Paço. Quando vem para o Brasil para fugir da ameaça de invasão de Portugal por Napoleão, “a Família Real chega trazendo a biblioteca, as máquinas de tipografia da imprensa régia, e traz também a censura”, disse Bucci.

O primeiro órgão de imprensa a circular no país, Correio Braziliense, era publicado em Londres por Hipólito José da Costa. Era mensal, e ainda em 1808 foi posto na lista de obras proibidas, apesar de entrar no Brasil clandestinamente. “O indivíduo que abrange o bem geral de uma sociedade vem a ser o membro mais distinto dela: as luzes que ele espalha tiram das trevas, ou da ilusão, aqueles que a ignorância precipitou no labirinto da apatia, da inépcia e do engano”, dizia o jornal em junho de 1808, numa exposição explícita dos princípios iluministas.

“Mas a mentalidade censória instalada no Estado português veio para o Brasil. Ainda para entender a gênese da nossa comunicação pública, assim como a censura aparece antes da imprensa no Brasil, aqui o Estado nasce antes da sociedade civil”, sustentou Bucci.

Para o jornalista, nos Estados Unidos o processo foi exatamente o oposto do observado no Brasil. Enquanto, aqui, o Estado português chegou trazendo a censura, que deu forma à comunicação pública, nos EUA os chamados federalist papers (série de artigos que consolidaram a Constituição e a nação americana) foram publicados exatamente nos jornais daquele país. “No nosso caso, o processo infunde no DNA da comunicação pública algo que está presente até hoje”, pontuou Eugênio Bucci.

O próximo módulo do Programa Avançado de Comunicação Pública – módulo 2: Estratégia e Planejamento em Comunicação – acontece no próximo sábado, 21 de setembro, com os Instrutores: Cláudia Lemos e Bob Vieira da Costa.

Confira a programação completa: Programa Avançado de Comunicação Pública

*Parte 3 de 4. Confira a cobertura completa:
Parte 1: Desafios da comunicação pública e o cotidiano dos profissionais foram temas de curso Aberje e ABCPública
Parte 2:Para Janine Ribeiro, uma propaganda governamental pode ser um exemplo de como “empoderar” ou não os cidadãos
Parte 3: Curso Aberje e ABCPública debate censura e patrimonialismo na gênese da comunicação pública no Brasil
Parte 4:Para Andrew Greenlees, é preciso diferenciar dados da realidade do que é efeito de robôs ou fake news

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