Primeiro dia do Aberje Trends discutiu fake news, lobby e reputação
Por Jornalismo Júnior (Beatriz Garcia, Larissa Carolina e Pedro Smith)
Nos dias 25 e 26 de abril, a Aberje promoveu a 3ª edição do Aberje Trends – Tendências da Comunicação, no centro de eventos Rooftop 5, localizado no complexo do Instituto Tomie Ohtake, em Pinheiros, na capital paulista. O encontro contou com grandes nomes da comunicação brasileira e debateu os principais temas que concernem à comunicação das empresas e instituições na atualidade. Dentre as pautas tratadas estavam diversidade corporativa, relacionamento com a imprensa, relações governamentais, transformação digital, comunicação interna, relacionamento com a comunidade, entre outros. Confira a cobertura do primeiro dia (veja também a cobertura do segundo dia do evento aqui).
O Aberje Trends 3ª edição teve patrocínio master da LATAM Airlines; patrocínios da BASF, Bayer, CCR, Itaú, McDonald’s, Sabesp e Toyota; e apoio da CPFL Energia, Nexa e Rooftop 5 & Centro de Convenções.
Jornalismo e Negócios: A revolução digital e os dilemas do jornalismo
Com o tema “Jornalismo e Negócios: Novas Formas de Produção e Conexão”, a manhã do primeiro dia contou com a participação de Vinicius Mota, secretário de redação da Folha de S. Paulo; André Lahóz, diretor de redação da Exame; e Marcelo Diego, CEO da Máquina Cohn & Wolfe, sob a mediação do jornalista Carlos Graieb. A chamada Revolução Digital e suas consequências para a comunicação moderna deram a tônica da conversa.
André Lahóz destacou um fenômeno que não é recente, mas cujo termo se popularizou no debate público dos últimos tempos: as fake news que, segundo Lahóz, têm o poder de interferência social, tanto em casos de impacto internacional, como a eleição do presidente Donald Trump, quanto em exemplos domésticos, como a diminuição no número de vacinas devido a uma notícia falsa – o que, novamente, não é novidade na história brasileira, mas cujo poder de difusão aumenta exponencialmente com a revolução digital. O jornalista falou sobre a democratização da informação e os novos paradigmas enfrentados pela mídia impressa, em reestruturar seu modelo de negócios e digitalizar sua produção: “O dilema não é da audiência, mas do modelo de negócio”, afirma.
Vinicius Mota garantiu que, apesar de inúmeras transformações, a função social da comunicação mantém-se intacta. Ele compartilha a afirmação de Lahóz sobre o papel do jornalismo em “expor as contradições humanas, provocar reflexão e tirar as pessoas de suas respectivas zonas de conforto”, o que Mota define como o “bom jornalismo”.
Em sua fala, Mota também faz um alerta sobre um dos mecanismos de comunicação que mais influenciam a esfera pública: as redes sociais. Para ele, é necessário que se debruce com maior afinco no estudo e regulação desse espaço digital, alertando para o fato de ser “um ambiente de reiteração estéril de opiniões já formuladas”. Tal característica rompe justamente com os princípios do bom jornalismo. “Os veículos de comunicação devem operar como praça pública, pondo em tensão diferentes posições”, afirma.
Sobre os mecanismos das redes sociais, Marcelo Diego acrescenta: “Os veículos não têm mais o domínio da informação depois que a publica”. Ou seja, a partir do momento que a notícia se torna pública, as pessoas a “reembalam” nas redes sociais da forma que desejam. “Não se pode mais usar ironia no jornalismo. Metade das pessoas irão entender literalmente”, diz Mota.
O mediador do debate, Carlos Graieb, questionou se os meios de comunicação tradicionais também não atuam como “bolhas” – e não somente as mídias digitais –, já que os leitores buscam veículos de linha editorial semelhantes às suas concepções e ideias prévias. Os três conferencistas foram unânimes ao destacar que as redações sérias, que praticam o bom jornalismo profissional, se preocupam em evitar a univocidade e, ao contrário, buscam a pluralidade de posições e ideias.
Questionado sobre quais seriam as piores e melhores práticas da comunicação das empresas para a imprensa, Vinícius Mota respondeu sem hesitação. Segundo o jornalista, o caso da Operação Lava-Jato exemplifica as duas posturas opostas: no início das denúncias contra a Odebrecht, o comportamento da empresa era de negação e confronto com a imprensa. Depois, observou-se uma mudança, a empresa passou a buscar o esclarecimento. Segundo o jornalista, esta é a melhor prática possível. “Não seja desleal com o público, não minta, pois a verdade, uma hora ou outra, irá se impor. E será pior para a empresa”, diz Mota.
A mensagem final dos palestrantes levantou duas diretrizes básicas para o jornalismo contemporâneo: não mentir e operar, sempre, em prol da manutenção da democracia.
Produção de Conteúdo: O jornalismo no mundo empresarial
Na parte prática sobre produção de conteúdo e relacionamento com a imprensa, a programação contou com palestras de Adriana Lutfi, Gerente de Comunicação Corporativa do Mercado Livre Brasil; Paula Nadal, Gerente Sênior de Planejamento e Estratégia Digital da Edelman Brasil, para falar de “Digital Trends: Nunca jornalismo e negócios puderam andar tão juntos”; e, por fim, o case do Grupo Globo, apresentado por Tiago Afonso, Diretor de Desenvolvimento e Inovação Comercial do Grupo Globo de Publicações.
A pauta central dos painéis baseou-se no papel da Comunicação como criadora de conteúdo capaz de conectar e impactar, aumentando o alcance de diálogo das empresas com seus públicos e rompendo as “bolhas”. Nesse cenário, um dos debates é a questão dos limites entre o conteúdo jornalístico e o publicitário. Há também o dilema de como dar visibilidade ao conteúdo produzido, em tempos de intensa produção e congestionamento da comunicação, principalmente nas redes sociais, o que dificulta o acesso das empresas ao seu público.
Na esteira desse tema, discutiu-se a importância de boas histórias e da busca incansável pela verdade. Tornam-se, então, indispensáveis as lições do fazer jornalístico, capazes de angariar a confiança do seu público, cada vez mais saturado de informação. Dessa forma, a comunicaç
Diversidade Corporativa: Inclusão e comunicação
David Grinberg, diretor de Comunicação Corporativa e Marketing Esportivo do McDonald’s, falou sobre Diversidade Corporativa com o case “McDonald’s e o trabalho com PcD’s (pessoas com deficiência)”. O executivo apresentou as iniciativas de diversidade que a empresa tem, a partir do reconhecimento de que um ambiente de trabalho plural enriquece a companhia em diversos aspectos. Para a Comunicação, a diversidade é essencial para a produção de boas histórias e conteúdos relevantes. “Fazemos questão de que nossa força de trabalho represente o que é a sociedade. Portanto, diversidade está no nosso dia a dia”, afirma Grinberg.
Relações Governamentais: A importância da transparência empresarial e o lobby
Cícero Marcus de Araújo, diretor de Relações Institucionais, Comunicação Corporativa e Sustentabilidade do Itaú, falou sobre a relevância e os desafios de ter e manter a transparência dentro e fora de uma empresa. O diretor destacou a importância da mídia para a construção dos discursos, visando sempre à melhoria da transparência e à aproximação do público com as empresas e com o Estado.
Nesse caso o exercício do lobby é uma forma de aumentar essa aproximação, trazendo benefícios tanto para as empresas quanto para os demais setores da sociedade civil. Porém, essa prática, muito usada nos EUA, não é regulamentada no Brasil, onde o lobby ainda é muito associado a uma forma de corrupção. Para Joel Velasco, sócio-diretor na Albright Stonebride Group/ASG, o lobby pode ser utilizado para corrupção, mas vai muito além, é uma ferramenta de relacionamento. Então o problema não é com o lobby, mas com a ética.
De acordo com Guilherme Cunha Costa, presidente da Abrig (Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais), “há quem acredite que regulamentar o lobby é regulamentar a corrupção. Não é isso. Regulamentar o lobby é dar legitimidade aos atores que participam do debate sobre políticas públicas. É justamente dar transparência ao debate”. Entretanto, a regulamentação não pode ser excessivamente rígida e burocrática, pois isso trará justamente o efeito contrário – incentivará a irregularidade. Além disso, Costa defende que nem curso e nem registro sejam obrigatórios, porque eles acabam engessando a participação e nivelando por baixo a qualidade dos profissionais.
Curso obrigatório pode não ser produtivo para as relações governamentais. Entretanto, a profissão exige uma capacitação enorme para os profissionais. “O lobby é uma atividade sofisticada, abrangente e complexa. Pois o processo decisório estatal é complexo. Isso força o profissional a se capacitar cada vez mais”, afirma Andréa Gozetto, sócia-diretora da Gozetto&Associados e coordenadora de MBA da Fundação Getúlio Vargas.
Para Wagner Pralon Mancuso, professor da EACH-USP, a academia e os lobistas deveriam conversar mais, para de fato haver troca de conhecimento e para combater as ideias de negatividade acerca das atividades da profissão.
Ética e Compliance: Comunicação como base de reconstrução da reputação
“Estamos em fase de reconstrução da reputação”, essa foi a afirmação com a qual Marcelo Lyra, vice-presidente de Comunicação e Sustentabilidade da Odebrecht, iniciou seu discurso. Lyra relatou a importância de reformar as políticas de governança e criar conteúdo consistente dentro da empresa para poder “recuperar o direito de ser ouvido de novo”. Em sua palestra, o executivo contou sobre o planejamento de recuperação reputacional da empresa, cujo primeiro passo foi uma profunda revisão da governança corporativa, do compliance e dos controles internos. “Sem dúvida, o público primordial em um plano de recuperação é o público interno”, afirma. Isso porque a confiança é o principal alicerce para a reputação, e então deve ser construído de dentro para fora. De acordo com Lyra, “se o público interno não acredita na empresa, muito menos o fará o público externo”. Ele ressalta a importância de manter o canal de comunicação interno aberto e dinâmico, onde todos possam participar.
Já Reynaldo Goto, diretor de Compliance da Siemens, falou sobre o caso relativo à empresa: “não somos lembrados pelos nossos números, somos lembrados pelo dia 15 de novembro de 2006”. O diretor se refere ao escândalo que envolveu o nome da empresa, que incluiu mandados de busca e apreensão no escritório e em residências de alguns executivos. A partir daí, Goto contou a longa jornada que a Siemens passou para se manter viva no mercado. “A probabilidade de você morrer depois disso é maior do que a de sobreviver”, afirma. No caso da Siemens, a sobrevivência contou com um planejamento de longo prazo e ações rápidas. Foram os passos do compliance (programa de integridade). Algumas das ações imediatas foram a troca da diretoria da empresa, comprometimento público da alta direção, e realização de investigações independentes. Em seguida, o programa de compliance foi propriamente implementado, com reestrutura da governança e ferramentas de monitoramento. A partir de 2010, a empresa passou a falar em sustentabilidade dos negócios, que inclui acordos com o Banco Mundial e com o Pacto Global da ONU.
“Sou a favor do compliance a portas abertas”, afirma Eduardo Azevedo, superintendente de Gestão de Riscos e Compliance da Estre Ambiental. No caso da empresa, que é a maior em gestão de resíduos da América Latina, o programa de integridade foi implementado em camadas, no que ele chama de “nível de maturidade”: no primeiro ano, em 2015, empreendeu-se uma série de controles; depois, foram aperfeiçoados esses controles a partir do feedback; por fim, o programa foi consolidado. Hoje, são 78 controles, com funcionários que são multiplicadores de compliance, metas agressivas de compliance que afetam inclusive o bônus dos funcionários, eventos de engajamento com a alta direção. Tudo isso é feito a partir das necessidades que a empresa analisa ao longo do tempo. “Se você, por exemplo, identifica que existe uma falta de conhecimento sobre a relação com um agente público, você cria uma política de relacionamento com o agente”, afirma Azevedo. Para ele, o mais desafiador durante uma crise é não ser odiado, pois “com o ódio é difícil conquistar a confiança”.
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