24 de janeiro de 2020

Para Diretor da Unilever, preocupação com curto prazo é o principal obstáculo para a reputação

Em entrevista exclusiva para o portal Aberje, Calcagnotto fala sobre reputação, sustentabilidade, governança corporativa e outras questões.

Antonio Calcagnotto, head de Assuntos Corporativos da Unilever Brasil e membro do Conselho Deliberativo da Aberje

No início de Janeiro, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa promoveu a 89ª edição do curso para Conselheiros de Administração. A Aberje foi representada pelo membro do seu Conselho Deliberativo, Antonio Calcagnotto.

Antonio Calcagnotto é o head de Assuntos Corporativos da Unilever Brasil, sendo responsável pela comunicação interna e externa da corporação. Ele destacou a importância do curso pela possibilidade de integração com outros profissionais da área, atualização e aprofundamento de conceitos e pelo tema: reputação para a longevidade das organizações.

Calcagnotto falou com o portal Aberje e destacou a relação direta entre sustentabilidade x reputação. “Quando não há uma conduta pautada na ética e na transparência, que considera o que é melhor para o negócio, para o planeta e para os públicos envolvidos, certamente a reputação organizacional estará comprometida”, afirma o diretor.

Confira, abaixo, a entrevista na íntegra:

Você acredita que o IBGC e associações como a Aberje podem colaborar de forma mútua para práticas mais eficazes em comunicação corporativa?

Não só acredito, como considero as duas entidades fundamentais para a longevidade das organizações. A Aberje é o berço da comunicação corporativa. Um centro de excelência que tem justamente o papel de zelar pela profissionalização da área, promovendo a troca de boas práticas e experiências. O IBGC é a referência em governança corporativa no Brasil. Poder ver de perto o trabalho que fazem para sensibilizar novos conselheiros sobre seu papel no desenvolvimento, manutenção e evolução da reputação só demonstra o quanto o Instituto também é de suma importância para o fomento da comunicação estratégica na alta administração das organizações – sejam elas empresas, entidades ou associações.

Você destaca a importância da reputação para a longevidade das companhias. Quais pontos faltam amadurecer junto às empresas em termos de reputação?  

Na minha visão, um dos principais pontos é a excessiva preocupação com o resultado financeiro no curto prazo versus  um processo consistente e perene de gestão da reputação. Temos diversos exemplos concretos de instituições que privilegiaram o resultado financeiro em detrimento dos possíveis impactos dessas decisões na reputação, e o saldo foi desastroso.

O que não se pode deixar de considerar é que um impacto reputacional negativo não compromete apenas os resultados financeiros de curto prazo. Ele pode, inclusive, impedir a sustentabilidade daquele negócio. Com a condição de extrema transparência, que ganhou mais forma com a digitalização do mundo e das relações, não há mais espaço para condutas duvidosas. Elas trazem impacto imediato na imagem, na reputação e nos negócios. Por isso, é urgente e igualmente importante que os conselhos e a alta administração priorizem o tema em suas agendas. São eles que garantirão a gestão, a manutenção e a evolução da reputação institucional. Com isso, poderão garantir também a longevidade dos negócios, uma vez que os jovens de hoje são os consumidores e clientes de amanhã, e estão cada vez mais atentos a esses temas.

Atualmente, você é o executivo responsável no Brasil pela comunicação de uma das maiores empresas de bens em consumo do mundo. Nos últimos anos, você tem trabalhado ativamente com narrativas que envolvem a sustentabilidade a partir de uma perspectiva mais ampla: o pilar ambiental (emissão de gases, gestão responsável de água, aterro zero), o social (diversidade e inclusão) e também o econômico (gestão, compliance, etc). Isto é chave para melhorar a reputação das corporações?

Sem dúvida alguma. Se pensarmos somente na esfera econômica, os resultados de curto prazo estarão salvos. Agora, se considerarmos o famoso triple bottom line da estratégia à execução, o resultado estará salvo no curto, mas também no médio e longo prazos.

Quando não há uma conduta pautada na ética e na transparência, que considera o que é melhor para o negócio, para o planeta e para os públicos envolvidos, certamente a reputação organizacional estará comprometida.

Mais uma vez, trago a importância do envolvimento dos conselhos aqui. É imprescindível que eles construam estratégias claras, com processos de governança que abranjam as esferas social, ambiental e econômica. Organizações que resistem ao tempo têm essa premissa incorporada à estratégia.

Na sua opinião, qual a diferença entre reputação e imagem e o que deve ser considerado na hora de trabalhar cada um desses conceitos?

Como estamos falando sobre conselhos de administração de entidades e empresas, todas as ações que visem enaltecer ou reforçar a imagem de uma organização devem estar relacionadas a uma estratégia de longo prazo. Isto é, precisam gerar valor para a construção da reputação ao longo do tempo. O que eu quero dizer com isso? Imagem se refere a ações do dia a dia. Se tais ações forem coerentes com os objetivos do negócio e com o propósito da empresa, elas somam e colaboram para a construção da reputação no longo prazo. Isto vale não só para a comunicação. Vale também para o desenvolvimento de produtos e serviços, bem como para a gestão do relacionamento com os públicos estratégicos – em especial, formadores de opinião, governos e autoridades.

Além da reputação, quais os outros pilares que precisam ser trabalhados para uma boa governança corporativa?

Para mim, os aspectos mais importantes que devem reger a boa governança corporativa são transparência, visão de longo prazo, gestão end-to-end (cuidar com afinco de toda a cadeia de valor, porque somos corresponsáveis por tudo e por todos que participam do nosso processo produtivo), comunicação consistente (o famoso “walk the talk” nunca foi tão necessário) e o que eu chamo de assertividade gentil. Muitas vezes, até por nossas características culturais, somos excessivamente polidos na fala em reuniões-chave ou em momentos de tomada de decisão. Mas para que a cultura organizacional, os negócios e a própria reputação evoluam, precisamos ter conversas difíceis constantemente. Não há como ter coerência entre discurso e prática dentro dos muros da organização sem abrirmos mão do excesso de polidez que muitas vezes permeiam as relações e nos afastam do verdadeiro propósito de uma empresa – trabalhar para servir ao bem maior da sociedade.

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