O agro (ainda) não é pop
Nicholas Vital*
O agronegócio brasileiro se tornou uma potência global, mas esqueceu de contar a sua história. Pesquisa inédita realizada pela Aberje indica que a comunicação do setor ainda tem muito a evoluir.
Intervalo da novela das nove. Entre um comercial e outro, surge uma lavoura dourada cercada por matas nativas, onde máquinas modernas trabalham na colheita de grãos. Na sequência, grandes números destacando os impactos econômicos e sociais da atividade saltam à tela, impressionando milhões de pessoas de norte a sul do país. Muito bem produzida, a campanha “Agro: a indústria-riqueza do Brasil”, veiculada há cerca de dois anos em horário nobre na Rede Globo, tem como objetivo valorizar o agronegócio nacional, que se por um lado consolida-se a cada vez mais como motor da economia brasileira, por outro é atacado dia sim e outro também pelos críticos do setor – que não são poucos. A qualidade dos filmes impressiona, mas infelizmente não é suficiente para convencer uma parcela significativa dos telespectadores, especialmente nos grandes centros urbanos.
Se em países como os Estados Unidos o produtor rural é visto como herói, responsável por produzir a comida que abastece as cidades e manter o preço dos alimentos estáveis, no Brasil a percepção é bem diferente. Mesmo sendo responsável por cerca de um quarto do PIB nacional, o agronegócio é visto com desconfiança pelos brasileiros. Em cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro, os produtores não raro são vistos como latifundiários, desmatadores, mercenários, inimigos dos índios e pouco preocupados com o bem-estar animal ou a saúde de seus consumidores. Uma imagem totalmente deturpada e descolada da realidade.
Mas como é possível um setor historicamente tão importante, que garante a comida barata na mesa dos brasileiros, gera milhões de empregos e ainda rende dividendos para o país, ter uma imagem tão ruim perante a sua população? A resposta é simples: embora ainda precise avançar em algumas práticas e processos, ainda falta uma boa comunicação. Nas últimas quatro décadas, graças à adoção de tecnologias de ponta, o Brasil deixou a incômoda posição de importador de alimentos para se transformar no celeiro do mundo. A produtividade média por hectare disparou, o que contribuiu, inclusive, para a sustentabilidade da atividade, mas o setor simplesmente se esqueceu de comunicar os seus feitos à sociedade. A história do agronegócio brasileiro, no fim das contas, acabou sendo contada pelos seus detratores.
De acordo com a pesquisa “A comunicação do agronegócio no Brasil”, realizada pela Aberje em parceria com a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), em somente 28% das empresas do setor a comunicação está estruturada em nível de diretoria ou vice-presidência. Outro dado revelador do levantamento, que ouviu 60 dos maiores grupos agro do país, gigantes que possuem um faturamento conjunto superior a R$ 800 bilhões, é que 10% dessas empresas não têm qualquer estrutura de comunicação.
“As estruturas de comunicação ainda são frágeis diante do tamanho e da relevância do setor”, afirma Paulo Nassar, professor da ECA/USP e diretor-presidente da Aberje. “A pesquisa é muito rica em dados e mostra falhas comunicacionais importantes. O que vemos é que a comunicação ainda está muito focada nas ações práticas, fora, portanto, da conversa em torno do desenho das políticas organizacionais. A alta direção é quem determina como a organização narra o mundo e como se comunica com a comunidade. Quando os comunicadores não participam dessas discussões, a organização acaba descolada da sociedade.”
A reportagem completa está disponível na edição 104 da revista Comunicação Empresarial.
*Nicholas Vital é jornalista, autor do livro Agradeça aos agrotóxicos por estar vivo, Head de Conteúdo da Aberje e Curador do Lab de Comunicação para o Agronegócio.
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