Estrutura é networking
Gabriela Soutello
Cenários prateados, carros que voam, comida impressa em 3D e comunicação por hologramas. Há pouco mais de 50 anos, surgia o primeiro episódio do desenho Os Jetsons, com previsões futuristas para 2062, quando, segundo o pensamento dos anos 1960, o futuro seria caracterizado pela tecnologia avançada, presente em todos as áreas do nosso cotidiano. Se naquela época tudo parecia distante demais, nos últimos 20 anos uma porta a um enorme avanço tecnológico foi aberta – e uma série infinita de janelas vem se escancarando. A porta, com suas inúmeras abas, é a internet.
Segundo dados de 2014, só no Brasil, pelo menos metade da população usa a internet todos os dias para fins variados. Nos Estados Unidos, as pessoas passam de cinco a seis horas por dia na internet. Seja na substituição da informação dos jornais de papel pela oferecida em portais, do gesto para pedir um táxi por um clique na tela touchscreen, ou da caminhada até a loja pelo download de novos CDs, a internet consolidou a troca de recursos que costumávamos utilizar tranquilamente – e sem grandes perspectivas de mudança – dez anos atrás. Com praticidade, interação e rapidez.
Há quem diga que a internet mudou quase que integralmente tudo o que podemos fazer na vida “real” – tanto no universo paralelo criado nos videogames ou na vida virtual criada para cada pessoa no Facebook. Quase tudo o que antes fazíamos apenas fisicamente, hoje, se ainda não foi substituído, teve ao menos sua necessidade reduzida. E as possibilidades fornecidas pelo digital se expandem cada vez mais, desconstruindo e recriando todas as áreas da vida humana. A comunicação não só não fica de fora, como é um dos principais campos atingidos pela tecnologia: é possível opinar, criticar, classificar e discutir sobre tudo no mundo virtual.
O negócio do banco de dados
Já verificou o que o Google revela quando você digita seu nome no espaço de busca? Dados considerados simples são expostos publicamente, como identidade, ocupação profissional, fotos e mídias sociais das quais fazemos parte. Dentro do banco de dados interno da empresa, porém, um extenso perfil de cada indivíduo que usufrui de seus programas – como a ferramenta de busca, o editor de documentos, os armazenamentos de arquivos e o e-mail, que é hoje o mais utilizado do mundo – é registrado.
Não é à toa que anúncios que podem nos interessar aparecem com frequência em nossas caixas de correio eletrônicas; em vez de pagar ao Google com dinheiro, fazemos isso com nossos dados, hábitos e gostos. Valendo-se do mesmo princípio, o Facebook, enquanto empresa, lucra dinheiro, nos mostrando exatamente o que poderíamos estar procurando em sites como Amazon e Trivago. Nesse contexto, vemos as empresas se inserindo cada vez mais no campo da internet, adaptando seus modelos de negócio para sobreviverem.
A própria internet tornou-se uma plataforma para acelerar o desenvolvimento das empresas. Entre elas, podemos citar a companhia de locações imobiliárias Airbnb, o aplicativo gastronômico iFood, a loja virtual Amazon e o Easy Taxi, primeiro aplicativo de táxis do Brasil, que permite ao usuário digitar seu endereço e esperar no local o táxi cadastrado mais próximo.
Tanto o Google como o Facebook se transformaram em trampolins ao ofertar dados. São plataformas que divulgam os serviços de empresas condizentes com o gosto de seus usuários. Uma vez que, para se cadastrar em um site ou aplicativo on-line, há a opção de logar com o Facebook ou com a sua conta Google, está feito: todas as suas buscas e preferências são disponibilizadas à empresa. Quanto maior o número de cadastros realizados e de interações entre aplicativos, maior o número de dados compartilhados.
Geração internet
“Em vez de reuniões intermináveis para definir o perfil dos clientes – o que eles gostam e como apresentar o produto –, as empresas se associam aos gigantes que têm todas essas informações”, explica Gustavo De Carlis, estudante de Engenharia Mecânica na Universidade de Darmstadt, na Alemanha. “Isso acelera o desenvolvimento das empresas, porque livra os empreendedores e desenvolvedores de certas partes burocráticas, além de fornecer respostas mais rápidas.”
De Carlis faz parte da geração que cresceu lado a lado com a expansão da internet. Ele desenvolve na universidade uma pesquisa sobre o conceito “internet das coisas”: é a conexão, por meio da internet, de objetos comuns que integram o cotidiano do indivíduo. Segundo ele, tal conceito – que ainda engatinha, mas que em um momento não muito distante deve ser incorporado à realidade – acarretaria em ainda mais informações enviadas para a geração de dados da população.
“Eu praticamente moro na internet”, diz De Carlis. “Só hoje de manhã, por exemplo, eu acordei, vi que o Foo Fighters tinha lançado músicas novas, graças a sites que sabem meus gostos e me recomendam publicações, e coloquei para ouvir no Spotify.” O estudante afirma que a internet está presente em todas as áreas de sua vida: seja para obter informações, trabalhar, estudar, se divertir ou interagir socialmente. “Para estudar, eu quase só utilizo o tablet; baixo apostilas, faço anotações e troco arquivos.” Entre os aplicativos que ele mais usa, estão o WhatsApp, o Airbnb e o TripAdvisor.
Interação público e empresa
Para Daniel Courtouke, responsável pela comunicação do Trivago no Brasil, o e-commerce mudou o panorama de muitas empresas. “Isso se deu pela facilidade, praticidade e conforto de poder comprar produtos sem sair de casa”, afirma. A empresa foi fundada na Alemanha em 2005 e chegou ao Brasil em 2009. Ela já nasceu no universo on-line e hoje é considerada o maior buscador de hotéis do mundo, estando presente em 50 países e tornando possível a comparação de mais de 900 mil hotéis em instantes.
“A internet ajudou a revolucionar muitas atividades e processos e a comunicação talvez tenha sido um dos campos que sofreu mais mudanças”, afirma Courtouke. Com relação às interações entre público e empresa, Courtouke afirma: “Usamos as informações que o público nos oferece por meio de buscas no site, filtros e feedback nas redes sociais para criar um conteúdo que vá ao encontro do interesse dos usuários”. Segundo ele, há uma conversa: o emissor da mensagem se transformou também em receptor. “O usuário passou a interagir de fato e isso é muito benéfico para a empresa”, explica.
Para Bob Wollheim, head of digital do grupo ABC, fundador do festival digital youPIX e criador da Yes! Design em 1996, quando a internet ainda engatinhava no Brasil, a comunicação nas companhias “deixou de ser uma coisa rígida, estabelecida e controlada pela empresa”. Segundo ele, entre os importantes pontos que estão mudando na comunicação empresarial, com o avanço da internet, está “a busca por uma comunicação mais verdadeira e franca, a aproximação dos consumidores e prospects e o fato de a empresa não ser apenas o emissor da imagem, o que a torna, também, menos controladora”.
Confiança nos clientes
Entre as tantas revoluções trazidas pela internet, uma das principais é a forma de interação e comunicação na sociedade. No novo formato, o caminho se mostra aberto tanto à interação entre cliente e empresa, como à avaliação e opiniões dos usuários. Uma vez publicadas, elas poderão ser compartilhadas e discutidas, criando referências a serem consideradas por outros possíveis clientes de um mesmo site ou aplicativo. “A tendência é que a opinião de um amigo ou de alguém que você conhece seja mais valorizada do que a de um especialista – como agente de viagem, jornalista, vendedor”, diz Wohlheim. “Isso abre um enorme espaço para o surgimento de plataformas como essas mencionadas.”
O objetivo do TripAdvisor é promover o acesso a informações, com base em experiências reais de usuários. Assim, são disponibilizadas avaliações e referências sobre hospedagem, pontos turísticos e restaurantes, que facilitam as escolhas de quem está planejando uma viagem. Claudia Martinelli, porta-voz do TripAdvisor no Brasil, afirma que o traço distintivo da empresa está na participação de seu usuário a partir da publicação de opiniões e avaliações. “Outras pessoas entram na comunidade para dividir suas experiências e ajudar outros viajantes. São 190 novas postagens por minuto, e o banco de dados tem mais de 46 milhões de fotos feitas pelos usuários.”
É curioso que a relação de confiança iniciada nos domínios on-line tenha saído do campo digital para ser incorporada também ao real. Alguns estabelecimentos recebem o Certificado de Excelência do TripAdvisor em suas portas. É mais uma referência “de confiança”, já que é fundamentada nas avaliações dos próprios clientes da marca. “É a participação dos viajantes que mantém o crescimento constante do nosso negócio”, diz Claudia.
A Easy Taxi, por sua vez, nasceu em 2001, durante um evento de Startups no Rio de Janeiro. Considerado o maior aplicativo de táxi da América Latina, ele é usado hoje em 30 países e conta com cerca de 400 mil taxistas cadastrados. Pelo menos 1300 funcionários trabalham direta ou indiretamente para o aplicativo – isso sem contar os principais divulgadores da empresa: os próprios usuários.
“Os usuários acabam recomendando o serviço no ‘boca a boca’ e se tornaram um o principal agente de comunicação para nós”, afirma Dennis Wang, co-CEO global da Easy Taxi. “A maior parte de novos usuários chega até nós por recomendação de outros usuários.”
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