03 de agosto de 2021

Maratona ou corrida de velocidade? (parte 2)

Eventos Esportivos: Comunicação e planejamento

Na primeira parte desse artigo, tratei dos eventos esportivos sem levar em conta o efeito da pandemia nas competições mais recentes. A ideia foi falar da base para a comunicação de eventos, antes e depois do coronavírus. Claro que o momento coloca vários obstáculos na pista de corrida das ações esportivas, mas seguindo com o otimismo de que vai passar, aponto o que acredito que vai ficar de “herança” para o futuro. São novos desafios ou oportunidades…

Difícil não ter visto em alguma rede social, por exemplo, os muitos protocolos que jornalistas, dirigentes, equipes de suporte e atletas estão seguindo nos Jogos e fazendo questão de mostrar em diversos posts. Isso vai ficar e é uma das grandes transformações na comunicação de eventos. Um ponto importantíssimo: não estou falando dos protocolos – ainda bem! –, mas da quantidade gigantesca de pessoas divulgando conteúdo.

A sempre celebrada democratização de conteúdo das redes está em ritmo acelerado. Se estamos acostumados a pensar nos atletas como influenciadores digitais, o que fazer com os muitos outros grupos? Dirigentes, produtores e, principalmente, os próprios jornalistas estão postando o seu dia a dia, os bastidores, as curiosidades e uma infinidade de outras informações. Muitos deles em suas contas pessoais, não necessariamente ligadas diretamente aos seus veículos de comunicação.

Alguns até podem ter status de influenciadores, mas outros estão “simplesmente” postando o dia a dia. Só que isso está gerando interesse e acaba competindo com o material produzido pela própria imprensa e influenciadores profissionais, e não pode ser descartado.

Sem público, mesmo com forte cobertura da imprensa, o interesse e curiosidade de quem está de fora é grande e isso reforça o poder de quem tem acesso aos eventos. A facilidade de difusão de conteúdo pelas redes, o que inclui o avanço tecnológico dos celulares, e o próprio engajamento do público, demonstram que essa cobertura generalizada tende a se manter.

E, neste cenário, como as empresas conseguem passar suas mensagens? Sinceramente, é um desafio novo e complexo. A resposta que tenho até agora é assumir como oportunidade e, assim, atuar com criatividade no conteúdo e interação.

Na prática, o que todos estão mostrando são as dificuldades e as curiosidades, o que não é usual e envolve os bastidores. Então, o desafio das equipes de comunicação continua sendo atrair a atenção, gerar o desejo das pessoas de compartilhar sua mensagem ou ativação, seja quem for. Aí é questão de estratégia, objetivo e criatividade. Que tal, por exemplo, uma ação pontual e inusitada ou um ponto “instagramável” que circula pelos bastidores?

Basicamente, é o que fazemos desde os princípios, a questão é que o público-alvo aumentou e se diversificou. Teremos de pensar em novas categorias de geradores de conteúdo digital, não necessariamente influenciadores. Importante lembrar que temos nas redes sociais jornalistas, e outros profissionais ligados ao mundo esportivo, de todos os tipos e gerações, com visões e interesses muito diferentes, mas com muitos seguidores.

E, claro, ainda temos os que, normalmente, a Comunicação e o Marketing sempre tiveram como foco: os atletas. Eles também estão mais conscientes de seu poder, como já foi visto na NBA ou na Fórmula 1, entre outros eventos recentes. Cada vez mais os desportistas demonstram seus posicionamentos e usam a crescente popularidade para defender causas.

Isso, naturalmente, reforça a necessidade do refinamento da relação entre marcas e atletas. É o que destacou em uma postagem nas redes sociais Murilo Moreno, um dos mais criativos profissionais de Marketing que conheço, ao avaliar as diferentes reações de jogadores de futebol com as bebidas exibidas nas coletivas de imprensa da Eurocopa. “Estamos vendo o aparecimento do patrocínio 2.0. Até antes das redes sociais, o atleta sabia que era influente, mas não tinha meios de externar essa força. Agora, eles passaram a ter contato direto com o fã, como influencers. Os patrocínios vão ter que evoluir e considerar essa nova variável”, escreveu Murilo.

Como citei na primeira parte do artigo, acredito que a relação com os atletas também deve ser tipo maratona, de longo prazo, para permitir a associação entre o indivíduo e a marca. Se o alinhamento entre mensagem e postura sempre precisaram ser levadas em conta, agora a questão fica mais profunda, ou realista. Envolve posicionamento, opinião. O atleta/influenciador, mais do que nunca, tem que estar muito alinhado com a cultura e a postura da empresa em relação aos valores no campo da ESG.

O universo dos geradores de conteúdo está muito amplo. De jornalistas experientes, como Álvaro José, em sua 11ª cobertura do maior evento esportivo do mundo, ao jogador de vôlei Douglas Souza, que viu seu número de seguidores em uma única rede social passar em poucos dias de cerca de 300 mil para mais de 2,5 milhões, e subindo…

Passando do poder dos indivíduos para o da mídia, também há muita mudança e isso precisa ser levado em conta no planejamento de comunicação. A facilidade de transmissão e de chegar ao público dá cada vez mais relevância aos canais superespecializados, basicamente online, que ganham relevância e crescem muito no período dos eventos, realmente dividindo a atenção com as mídias já estabelecidas.

Os superespecializados têm ao seu lado os fãs das modalidades, o conhecimento profundo do assunto, a relação próxima com clubes e atletas e a agilidade pela menor burocracia em comparação com os grandes veículos de comunicação. E, novamente, o avanço e a simplificação dos recursos tecnológicos, aliado ao domínio da linguagem das redes sociais, quase os transformam em “coletivos de influenciadores”.

Então, é preciso trabalhar com todas essas muitas variáveis e pensar como ativá-las. Diferentes tipos de “influenciadores”, canais digitais cada vez mais especializados e, obviamente, não dá para esquecer da mídia tradicional, considerando, inclusive, as suas redes sociais.

Se olharmos os últimos grandes eventos, as áreas de entretenimento e imprensa dos veículos de comunicação, com todas suas ramificações oficiais, seguem investindo em mais tecnologia para as transmissões, novos recursos para passar as informações ao público e permitir mais interação. Só que a concorrência vem de todos os lados.

Nesse universo, clubes e entidades estão também cada vez mais presentes na geração de conteúdo e mesmo na transmissão, graças as lives e possibilidades de streaming. Os objetivos são variados: 100% comercial, para engajamento dos fãs ou geração de conteúdo para a imprensa e diretamente para o público.

Um exemplo bem atual e muito interessante tem sido o Canal Olímpico do Brasil, do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). Ele está gerando uma grande variedade de conteúdos e fornecendo informações em primeira mão que engajam os fãs, mas tem um enorme valor para a imprensa, ainda mais considerando que muitos jornalistas não foram para o Japão pelas limitações provocadas pela pandemia. Sem falar dos que não têm condições de ir aos eventos internacionais por questões financeiras e de estrutura, o que torna o conteúdo mais relevante para democratizar a informação., ao mesmo tempo que contribui para divulgar as modalidades, o COB e seus patrocinadores.

Com tantas opções, é importante não esquecer que no fim sempre estão pessoas. Então é preciso saber falar e, além disso, interagir com elas. Criar experiências é fundamental. A tecnologia ajuda, mas o toque humano é poderoso. É preciso despertar a emoção, independentemente de como ou onde será a ação.

A diversificação dos influenciadores e o crescimento do posicionamento de cada um, o espectro ampliado com os muitos indivíduos geradores de conteúdo, as mídias superespecializadas e o avanço tecnológico são realidade hoje e seguirão para o futuro pós-pandemia. É um cenário em construção que nos obriga a repensar estratégias e buscar oportunidades que estão aparecendo ou ainda podem surgir.

É preciso agilidade e foco para cruzar a linha de chegada na frente, mas muita atenção e calma para não forçar demais e ficar sem fôlego no sprint final.

Lembro sempre que a ideia desta coluna é abordar a Comunicação Corporativa na prática e falar de vivências, servir como uma troca de experiências. Para isso, gostaria muito de receber sua opinião e ideias: rogerio.louro@gmail.com

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Rogério Louro

Formado em Comunicação Social e pós-graduado em Marketing, Rogério Louro tem mais de 25 anos de experiência no setor. Em sua trajetória, desempenhou diferentes funções na área de Comunicação e atuou como jornalista em veículos como o jornal O Globo, a agência Auto Press, a TV Educativa e o site Automotive World. Atualmente, é Diretor de Comunicação Corporativa e PR da Nissan do Brasil, onde entrou em 2013 e foi responsável pela Comunicação Corporativa da marca nos Jogos Rio 2016 e em diversas ações nos últimos anos. Em 2018, foi reconhecido como um dos “Comunicadores do Ano” pela Aberje.

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