21 de fevereiro de 2020

Luanda Leaks movimenta profissionais de comunicação

(Imagem: International Consortium of Investigative Journalists)

Um escândalo está dando muito trabalho para agências e áreas de comunicação de várias empresas em Portugal e Angola. Trata-se do “Luanda Leaks”, a investigação que revelou, entre outros assuntos, como Isabel dos Santos, filha de um ex-presidente angolano, fez chegar pelo menos US$ 115 milhões dos cofres da petrolífera estatal Sonangol, da qual era presidente, a uma empresa off-shore em Dubai controlada por pessoas próximas a ela. A denúncia surgiu após mais de 715 mil arquivos terem sido analisados pelo ICIJ (International Consortium of Investigative Journalism) formado por 249 jornalistas investigativos de mais de 90 países e que conta ainda com parcerias com mais de 100 organizações de mídia da qual fazem parte os portugueses Expresso e SIC.

Vale lembrar que o papel do ICIJ é desenterrar delitos internacionais, casos de corrupção e abuso de poder. Além do “Luanda Leaks”, que demonstra como a mulher mais rica do continente africano fez fortuna ao longo das últimas décadas, o consórcio também foi responsável por casos como o “Panama Papers” e a “Bribery Division”, que envolve a brasileira Odebrecht. As revelações feitas pela investigação jornalística provocaram um verdadeiro tsunami em várias organizações de Portugal onde Isabel dos Santos é acionista ou mantém algum tipo de relação. Para se ter uma ideia da dimensão da apuração, foram identificadas mais de 400 empresas que estiveram ligadas a ela nas últimas três décadas.

Pela abrangência e impacto causado pela divulgação, o assunto ganha destaque diário nos noticiários de Portugal. O “Luanda Leaks” tornou-se pauta obrigatória nas rodas de conversa pelo país e, certamente, aumentou consideravelmente o volume de trabalho de agências e as áreas de comunicação das empresas envolvidas (ou não) com o escândalo. O cidadão comum só vê o noticiário sobre o tema e muitos não têm ideia da quantidade de profissionais envolvidos tanto na apuração jornalística ou no trabalho dentro das empresas para definição das estratégias de comunicação para minimizar os danos na imagem das organizações.

Já foram – e ainda estão sendo – gastas dezenas de horas de trabalho em elaboração de relatórios, levantamentos de informações, elaboração de posicionamentos para os diversos públicos envolvidos, treinamentos para entrevistas, reuniões com advogados e profissionais de compliance, etc, etc, etc… Quando uma situação de crise chega não tem como ficar parado. Qualquer falha nessa comunicação pode agravar a situação ou gerar novas crises, danificando ainda mais reputação. Essa situação só comprova a necessidade e a importância de se estabelecer gabinetes e comitês especializados em crise nas empresas, além de políticas robustas de compliance que envolvam toda a organização e normatizem as relações público-privadas.

Em casos como “Luanda Leaks”, é fundamental que os envolvidos garantam a coerência e alinhamento dos posicionamentos de acordo com os públicos e a estratégia adotada para minimizar os danos reputacionais. Houve também quem decidisse manter o silêncio como forma de escapar do impacto negativo ou ainda quem comunicou somente o essencial com receio de uma exposição ainda maior. Cada caso deve ser avaliado com bom senso, ética e profissionalismo, e varia de acordo com o nível de envolvimento da empresa no escândalo. Nesses casos, experiência em gestão de situações de crise conta, e muito.

Do outro lado, boa parte da estratégia adotada por Isabel dos Santos parece não ter sido suficiente até agora. Os diversos posts nas redes sociais, posicionamentos elaborados por renomado escritório de advocacia e as dezenas de entrevistas concedidas, na maioria das vezes, transformaram-se em munição contra a empresária angolana. Desmentir os fatos sem argumentos consistentes e provas convincentes não vai surtir efeito para esclarecer os fatos e minimizar os danos à sua imagem de empresária e empreendedora de sucesso.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Sandro Rego

Sandro Rego é CEO da Priori, agência de comunicação em Portugal dedicada a causas e projetos de impacto social. Foi general manager da FleishmanHillard e executivo de Comunicação do Banco Safra, Grupo Boticário, Bunge e Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Foi eleito Comunicador do Ano no Prêmio Aberje 2014. Atualmente vive em Portugal e é o editor da seção "Also in Portuguese" da BRpr, newsletter internacional da Aberje.

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