A minha ficha sobre as desigualdades entre homens e mulheres no mercado corporativo demorou para cair. Miopia que refletia o privilégio de quem nasceu e foi criada na bolha de uma família branca de classe média/alta, pai engenheiro e empresário e mãe psicanalista que criaram sua primogênita com certa liberdade sobre escolhas profissionais. Minha primeira experiência profissional, que durou cerca de 5 anos, foi em uma grande construtora. Por atuar junto às áreas de Comunicação e RH, com grande presença feminina na liderança, e por ter tido a sorte de vivenciar um ambiente acolhedor, permaneci com a visão embaçada.
Foi só aos 30 anos, quando no mestrado, e me deparando com diálogos mais profundos sobre questões de gênero, que me enxerguei frágil e vulnerável na cadeia produtiva. Obviamente muito menos vulnerável que a maioria da população, mas ainda sim indignada com os dados e fatos que tratam, por exemplo, da discrepância salarial entre homens e mulheres, principalmente na liderança e mais ainda conforme a idade avança.
Aos 33 a maternidade chegou avassaladora: dentro de mim cresciam, ao mesmo tempo, duas meninas e um menino. E apesar dos poucos minutos de diferença de idade entre eles, me lembrei que o Antonio já estaria em vantagem diante das suas irmãs pelo simples fato de ter nascido homem. A inquietude reverberou: Não é esse mundo que eu quero para as minhas filhas. O que eu posso fazer por elas? O que eu posso fazer para educar um homem quebrando os padrões que tanto me incomodam?
Em 2020, o retorno da licença maternidade em um cenário pandêmico, já em uma companhia global líder em infraestrutura e energias renováveis, coincidiu com a ascensão do acrônimo ESG em substituição ao conceito de Sustentabilidade, que, apesar de se pautar em um tripé social, ambiental e econômico, se materializava na maioria das empresas, por meio do aspecto ambiental, do cuidado com a natureza, seguramente pela maior facilidade de tangibilização e impacto de reputação de tais iniciativas.
A força do termo ESG e a percepção por parte das empresas de que não poderiam ficar de fora do movimento da vez, iluminou a necessidade de equilíbrio entre os pilares Ambiental, Social e de Governança. E como comunicadora, fez-se mandatório aprender a dialogar e imergir nesse novo cenário mercadológico, que identifica e repudia o greenwashing, que enfrenta a falta de posicionamento das marcas diante de catástrofes e que discute com muito mais comprometimento a questão da equidade de gênero em seus comitês e áreas de diversidade. E foi aí que comecei a encontrar espaço para, como comunicadora, promover diálogos de letramento e até apoiar o impulsionamento de ações afirmativas no meu ambiente laboral.
Por um infortúnio do destino, no início de 2022, fui vítima de um crime digital que carregava uma mensagem misógina (o vídeo em questão só foi removido da plataforma digital que o hospedava quase dois meses após sua publicação, o que demandou uma ação judicial movida por algumas das mulheres que tiveram suas imagens detratadas). A dor da vergonha e da impotência foram proporcionais à vontade de ser voz. E sigo buscando formas de causar impacto e encontrar aliados.
Maria Helena, Maria Luiza e Antonio: a minha promessa segue em pé. A estrada que nos levará a uma sociedade na qual vocês três terão as mesmas oportunidades pode ser longa e tortuosa, mas estou aqui para garantir que suas curvas sejam em forma de S de social e D de Diversidade.
*Texto atualizado em 12 de maio às 9h30.
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