02 de dezembro de 2019

Gestão da reputação e governança: uma interlocução estratégica

(Imagem: Helloquence/Unsplash)

Publicado no portal do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) em outubro/2019

(Imagem: Helloquence/Unsplash)

Como todos sabemos os preceitos da governança corporativa direcionam as organizações para a geração de valor, a equidade no tratamento dos seus stakeholders, a correta mitigação de riscos e a busca da perenidade da organização. Como professor de governança e consultor de gestão da reputação com projetos implantados em várias organizações, vejo uma sinergia de propósito muito grande entre os conceitos centrais de reputação, de governança e compliance. Porém se são conceitos tão sinérgicos entre si, deveríamos ver um alinhamento das organizações na busca de uma gestão completa da sua reputação corporativa. Porém a prática demonstra que isso não acontece com a frequência e intensidade desejadas. O propósito deste artigo é contribuir para colocar luz nessa questão que é tão relevante para as organizações contemporâneas. As perguntas centrais que iremos abordar no artigo são:

  • Por que o tema gestão da reputação não está na agenda estratégica da maioria das organizações nacionais?
  • O papel de patrocinador da adoção dessa prática deve ser da diretoria da empresa ou dos seus conselhos de administração?

Desenvolvendo o trabalho de consultor, converso com C-levels de várias organizações nacionais e internacionais. É gritante perceber que o tema tem muito mais aderência nas agendas das organizações internacionais, seja por alinhamento com a matriz e/ou com o estágio de maturidade. Talvez isso explique por que nos últimos anos vimos tantas empresas nacionais destruírem o seu capital reputacional e a razão de algumas das empresas mais valiosas do Brasil na primeira metade da década, hoje lutam para reconquistar a confiança perdida.

Como o tema não é priorizado, a organização não desenvolve mecanismos de gestão com indicadores claros, prevalecendo o temível conceito da decisão baseada no feeling. Outro ponto bastante relevante é que em algumas organizações prevalece uma lógica empresarial perversa: em prol do atingimento do resultado do ano corrente e consequente conquista do bônus, vale tudo para o seu alcance. Nesta corrida frenética que podemos apelidar de “caça ao tesouro”, o comum é ouvir destas organizações que “da reputação cuidaremos no futuro, pois o importante é vencer o jogo”. Porém esse futuro nos reserva dois cenários bem distintos com um ponto em comum. No primeiro cenário, se no futuro, a organização estiver passando por um momento de crise, o pensamento reinante é de que não precisamos cuidar da reputação agora pois temos que cortar custos ao máximo e isto não é prioridade do momento. No outro cenário, se no futuro, a organização estiver alcançando o patamar máximo de vendas, também não precisaremos cuidar da reputação pois temos que aproveitar o bom momento do mercado. Resumindo: esse futuro, com a implantação de uma gestão da reputação com indicadores nunca chegará se não mudarmos o mindset empresarial, pois ela acabará sempre sendo vencida por imprevistos de última hora ou cortes de orçamento.

Se os presidentes das nossas organizações compreendessem o conceito de reputação e a força que ela gera para a organização, não teríamos tantos problemas e crises, porque entenderíamos que assim como os preceitos da governança disseminados pelo IBGC, gerenciar de forma constante a reputação é construir valor e perenidade para as organizações. Porém para sermos eficazes neste processo, como dizem os gurus de gestão, temos que medir e criar indicadores. Porque o que não se mede não se gerencia. Aliar um processo de monitoramento da percepção dos stakeholders da organização com uma base sólida de indicadores formada a partir do uso intensivo dos recursos dos analytics é fundamental para a construção de uma estratégia vencedora, seja para os momentos bons ou para os momentos “não tão bons assim”. Em outros casos, percebemos que quando falamos em reputação os gestores adotam somente as métricas que mais lhe agradam ou como chamamos as “métricas da vaidade” como a contagem dos likes e retweets de uma campanha como se esses indicadores sozinhos, apesar de relevantes, nos fornecessem uma análise completa do nosso contexto concorrencial e das percepções dos nossos públicos estratégicos e, em última análise, da nossa reputação perante todo nosso ecossistema de stakeholders.

A partir da leitura de um conjunto de estudos acadêmicos e projetos empresariais, podemos afirmar: “é a reputação o ponto de partida e o ponto de chegada das organizações”. Entendemos que é o ponto de partida, pois ela une a organização em torno de um propósito comum, alinha expectativas dos stakeholders e assegura uma implantação mais assertiva da nossa estratégia empresarial. Uma vez conquistada, ela gera atitudes favoráveis dos diversos públicos da organização como os investidores, regulares, colaboradores, consumidores, comunidades e formadores de opinião entre outros a partir do vínculo de confiança que foi estabelecido.

Também entendemos ser o ponto de chegada ou em outras palavras, o objetivo maior, pois no mundo atual muito das nossas escolhas rotineiras são decisões que envolvem critérios reputacionais. Por exemplo, decidir comprar da marca A ou da marca B, investir no banco X ou W, desenvolver uma associação com uma nova empresa ou escolher um novo trabalho são exemplos claros de decisões que envolvem a força, admiração e reputação da marca. Sendo assim, caso você esteja vivenciando uma crise, meu sincero conselho é: fortaleça a sua reputação, pois ela o ajudará a segurar as pontas e recuperar a confiança perdida. Se estiver em um momento bom, com o vento a favor, fortaleça ela ainda mais para conseguir criar uma barreira de entrada contra novos entrantes, além de gerar relevância.

No meu entendimento, a decisão sobre a implantação de uma gestão por indicadores da reputação da organização não deve ser uma escolha pessoal dos presidentes, mas uma recomendação estratégica de longo prazo do conselho de administração, pois uma vez empoderado pelos acionistas é o conselho que deve elevar o olhar da organização para a construção de valor de longo prazo. Ousando um pouco mais eu diria que a reputação deve ser um dos principais KPIs de toda a organização, abrangendo do presidente até os cargos mais iniciais da organização.

As empresas de vanguarda já entenderam esse conceito e arregaçaram as mangas para colocar essa gestão em prática. Uma boa gestão da reputação mitiga riscos corporativos, ajuda no processo de compliance, cria vantagem competitiva, elimina a possibilidade de crises e constrói valor e perenidade para as organizações.

Que tal seguirmos o que está dando certo?

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Dario Menezes

Criatividade e resultados se destacam na jornada de Dario. Trabalhou na VARIG e na Vale como principal executivo de marketing e em seguida trabalhou em uma consultoria tendo liderado projetos para Tetra Pak, Roche, Eletrobras e MSD entre outros. Responsável pela estratégia de treinamento dos voluntários Rio 2016. Hoje é o Diretor Executivo da Caliber, empresa (startup) de consultoria da Dinamarca com clientes como Airbus, PWC, Herbalife e British Airways entre outros. Professor da FGV e da ESPM, tem Mestrado, Pós em Marketing, MBA em Varejo e curso na Harvard Business School. Possui um networking expressivo e seu perfil é seguido por alunos de MBA de todo o Brasil e executivos do setor de comunicação, marketing e publicidade.

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