Lab de Comunicação para o Agronegócio, com patrocínio da Yara e da BHP, discute os desafios da comunicação do setor

No caminho para a COP30, que deve posicionar o Brasil no centro das discussões globais sobre mudanças climáticas, o agronegócio nacional se depara com um desafio: comunicar de forma autêntica seu compromisso com a sustentabilidade, em meio a um cenário de desconfiança e risco. Como as empresas têm estruturado suas áreas de comunicação para lidar com essas pressões? Como combater narrativas equivocadas e construir um posicionamento transparente e baseado em ciência?
Essas foram algumas das perguntas que nortearam o Lab de Comunicação para o Agronegócio, promovido pela Aberje no dia 24 de abril, em sua sede em São Paulo, com patrocínio da Yara e da BHP. O encontro foi moderado por Nêmora Reche, diretora de Comunicação Corporativa da Syngenta, e reuniu Danielle de Paula, diretora de Assuntos Institucionais e Comunicação da BHP no Brasil; Deise Dallanora, diretora de Assuntos Corporativos e Sustentabilidade da Yara Brasil; e Giuliano Ramos Alves, gerente de Sustentabilidade e Projetos da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG).
Com o objetivo de fortalecer a credibilidade do agro em um cenário cada vez mais exigente, o evento marcou a abertura do calendário de ações preparatórias para a COP30 e propôs um espaço para alinhar discursos, compartilhar práticas e repensar a narrativa do setor diante das transformações climáticas globais.
Comunicação como força estratégica no setor
Deise Dallanora chamou a atenção para o papel central da comunicação em sua atuação. Originalmente ligada à área de Sustentabilidade, Deise passou recentemente a liderar também a frente de comunicação da companhia. Segundo ela, o setor de fertilizantes responde por 11% das emissões da agricultura, que por sua vez representa 20% das emissões globais, segundo dados da FAO. Nesse cenário, a comunicação se torna uma ferramenta estratégica para mostrar como o setor está se transformando.
“Nosso propósito é atuar em toda a cadeia, da produção ao consumo, do campo à mesa. Queremos ser provedores de soluções para os desafios climáticos e isso exige narrativas baseadas em dados e ciência”, disse Deise. “Temos técnicas de agricultura regenerativa, produtos com menor pegada de carbono e apoio técnico da Embrapa, mas ainda comunicamos pouco. Precisamos ser mais propositivos”, explicou.
Ela reforçou a importância da colaboração com outros elos da cadeia alimentar para garantir que os compromissos ambientais se estendam a todos os atores. “Nosso compromisso como produtores de alimentos não começa nem termina na COP30. Ela é apenas uma das etapas de um processo mais amplo de transformação”, completou.
Giuliano Ramos Alves, da ABAG, ressaltou que o agro representa cerca de um terço do PIB brasileiro e metade da balança comercial. “O agro tem muitas vozes e isso pode gerar ruído. Precisamos de um posicionamento único, claro e alinhado para a COP30”, explicou. Ele destacou que, embora os acordos climáticos sejam conduzidos por representantes governamentais, o setor privado tem papel relevante na construção de narrativas e no impulso a compromissos internacionais. “A comunicação tem muito poder de influência. Na COP26, por exemplo, a atuação de organizações da iniciativa privada fez com que vários países assinassem o Compromisso Global do Metano, mesmo ele não estando nas negociações oficiais”.
Danielle de Paula, da BHP, enfatizou que o momento vivido pela companhia é de transição cultural. A mineradora, que desenvolve no Canadá um projeto para a produção de potássio, um insumo estratégico para o Brasil, que hoje importa 97% de sua demanda, busca alinhar suas frentes de comunicação, sustentabilidade e relações institucionais para garantir coerência e evitar riscos de greenwashing.
“A BHP tem como valor a diversidade, a segurança alimentar e a descarbonização. Estamos num exercício desafiador, de apropriação e escuta, para fazer com que esses temas estejam presentes em nossas práticas e em nossa comunicação”, explicou Danielle. Segundo ela, o empoderamento das equipes de comunicação tem sido fundamental para articular essas pautas de forma responsável.
Construindo narrativas legítimas e ancoradas em ciência
Uma das questões mais recorrentes no debate foi como lidar com a imagem negativa do setor associada ao desmatamento, apontado como um dos principais fatores de emissão de gases de efeito estufa no Brasil. Deise Dallanora argumentou que essa narrativa muitas vezes prejudica o setor como um todo, ignorando seus esforços e complexidades. “Precisamos olhar para a cadeia e garantir que nossos fornecedores e clientes estejam alinhados com práticas sustentáveis. Mas também temos que lidar com a dificuldade de criar narrativas baseadas em fatos em um cenário polarizado”, afirmou.
Giuliano Ramos Alves lembrou que o Código Florestal brasileiro impõe regras rígidas ao produtor rural, que tem a obrigação de preservar parte significativa de sua propriedade. “O agronegócio sério cumpre a legislação. Mas o desmatamento ilegal, que existe, acaba ganhando muita visibilidade e mancha a reputação de todo o setor”, disse. Segundo ele, garantir rastreabilidade em determinadas regiões ainda é um desafio logístico e cultural. “Precisamos de tempo, tecnologia e financiamento. A dificuldade maior do Brasil é estabelecer governança”, afirmou.
Deise Dallanora reforçou que a maioria dos produtores rurais no Brasil é formada por pequenos agricultores, que necessitam de crédito acessível e de incentivos para manter áreas preservadas. “Esses produtores precisam ser remunerados por suas boas práticas. Por isso, precisamos ter muito cuidado com as narrativas, que podem afetá-los injustamente”, explicou.
“O agro brasileiro tem uma oportunidade, porque o mundo nos observa. Mas para isso precisamos incorporar esses valores no nosso dia a dia corporativo”, disse Danielle de Paula, defendendo que os compromissos de educação e conscientização devem nascer dentro das organizações e se transformar em políticas internas.
“Contar e multiplicar pequenas histórias é uma forma de construir uma comunicação mais legítima. É preciso fazer comunicação setorial, por meio de associações e instituições, para fortalecer a percepção positiva do setor”, concordou Deise Dallanora.
Nêmora Reche destacou que o agronegócio é um dos poucos setores com potencial real de sair da condição de emissor para capturador de carbono. “Temos práticas sustentáveis no campo, mas que muitas vezes são invisíveis por estarem distantes dos centros urbanos. O agro por muito tempo se comunicou apenas internamente, mas o cenário mudou. Precisamos dialogar com a sociedade e mostrar o que fazemos com clareza e responsabilidade”, concluiu.
Sobre os Labs de Comunicação
Os Labs de Comunicação da Aberje são eventos imersivos voltados para o desenvolvimento de estratégias na comunicação corporativa. Esses labs reúnem profissionais e especialistas para explorar tendências e trocar experiências sobre desafios reais enfrentados pelas organizações.
Os Labs podem abordar temas variados, como ESG, inovação, inteligência artificial, comunicação interna, reputação, entre outros, sempre com um formato dinâmico que estimula a cocriação e a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos.
Destaques
- Liderança comunicadora ainda enfrenta desafios na comunicação interna
- Diretor-executivo da Aberje analisa impasse entre o senador J.D. Vance e o Papa Leão XIV em artigo n’O Globo
- COP30 exige nova cultura comunicacional, defendem executivos da Aberje em artigo no Anuário da Comunicação Corporativa
- Turmas de Jornalismo da UEL recebem diretor de capítulo Aberje Brasília para Roda de Conversa
- Em artigo no Valor Investe, Sonia Consiglio analisa papel da comunicação na COP30 e destaca pesquisa da Aberje
ARTIGOS E COLUNAS
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