22 de novembro de 2005

Um adeus ao ‘velho jornalista’

Publicado originalmente no Observatório da Imprensa em 22 de novembro de 2005

Deveriam fazer um minuto de silêncio todos que, de alguma forma, tentam entender o que acontece no âmbito da Comunicação Empresarial moderna, caracterizada pela mestiçagem – fusão de jornalistas, relações públicas, publicitários, administradores, sociólogos, entre outras origens profissionais, e de conhecimentos multidisciplinares. Morreu Peter Drucker, ‘um velho jornalista’, como ele gostava de ser chamado, que mestiçou a gestão organizacional com política, filosofia, economia e se transformou, para muitos, na grande referência da administração moderna.

O título é merecido. Drucker, como outros baluartes intelectuais do século 20 com passagem por Viena, entre eles Eric Hobsbawm, teve uma educação humanística na Áustria, Inglaterra e Alemanha (onde fez doutorado em Direito Internacional) que se reflete em seus ensaios, livros, artigos e palestras sempre recheadas de conteúdos oriundos da história e das artes, entre elas a música. Lições calcadas na melhor teoria e orientadas para transformar o mundo, em constante mudança. Palavras faladas e escritas sempre com muita densidade, alheias aos opúsculos de auto-ajuda. Faz parte também da biografia de Drucker a perseguição política. Em 1933, um dos seus textos jornalísticos foi censurado pelo regime nazista.

A militância de Drucker por uma nova Administração fez a cabeça dos maiores empresários dos últimos 50 anos. Por exemplo, Bill Gates (Microsoft) e Andrew Grove (Intel). Entre os seus livros destacam-se Conceito da Corporação, que escreveu com base em estudos que fez para General Motors, nos anos 1940, e As Novas Realidades, escrito nos anos 1970, no qual trata da nova sociedade instruída e na organização baseada na informação e no conhecimento.

Foi professor de Filosofia e Política em Vermont, e de Administração na Universidade de Nova York por quase 30 anos. A partir de 1971, fundou, na Califórnia, a Escola de Administração Peter Drucker.

Novo paradigma

A obra de Drucker tem como temas assuntos indigestos para os comunicadores empresariais tradicionais e mecanicistas (que não pensam a comunicação de forma integrada). Entre eles, destaco itens como liderança, motivação, marketing, inovação, envolvimento e comprometimento dos empregados com os objetivos de uma empresa – este, um fator de sucesso em qualquer organização.

Por falar em público interno, Drucker, nos anos 1960, chamou atenção para um novo trabalhador que surgia no âmbito das empresas e instituições: o trabalhador do conhecimento, que não tinha mais na força física o seu grande trunfo. O trabalhador do conhecimento, segundo o ‘velho jornalista’, tem as suas máquinas entre as duas orelhas e se destaca pela capacidade de transformar informações em valor para a sua organização.

É claro que esse novo empregado demanda da empresa também um novo tipo de comunicação: mais inteligente, mais interessante, profissional, democrática e com predominância do diálogo. Uma comunicação empresarial mais mestiça, que trabalha temas e problemas mais complexos, os quais podem gerar controvérsias, muitos pontos de vista, soluções multidisciplinares e de conhecimentos não só de comunicação. Em resumo, uma nova comunicação, longe de índole taylorista, geralmente baseada na famosa expressão ‘manda quem pode obedece quem tem juízo’.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Paulo Nassar

Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje); professor titular da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP); doutor e mestre pela ECA-USP. É coordenador do Grupo de Estudos de Novas Narrativas (GENN), da ECA-USP; pesquisador orientador de mestrado e doutorado (PPGCOM ECA-USP); pesquisador da British Academy (University of Liverpool) – 2016-2017. Entre outras premiações, recebeu o Atlas Award, concedido pela Public Relations Society of America (PRSA, Estados Unidos), por contribuições às práticas de relações públicas, e o prêmio Comunicador do Ano (Trajetória de Vida), concedido pela FundaCom (Espanha). É coautor dos livros: Communicating Causes: Strategic Public Relations for the Non-profit Sector (Routledge, Reino Unido, 2018); The Handbook of Financial Communication and Investor Relation (Wiley-Blackwell, Nova Jersey, 2018); O que É Comunicação Empresarial (Brasiliense, 1995); e Narrativas Mediáticas e Comunicação – Construção da Memória como Processo de Identidade Organizacional (Coimbra University Press, Portugal, 2018).

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