29 de maio de 2007

Mudar para ser sustentável

A comunicação empresarial é, nas empresas, o elemento estratégico e agregador do tema sustentabilidade, ainda um fantasma a rondá-las, mais pela ameaça para a imagem, reputação e resultados, do que pela necessidade de posicionar-se diante de valores que sustentem o respeito pelo outro e pelo meio ambiente.

Acredite: o conceito de sustentabilidade, como sinônimo de responsabilidade histórica, forçosa e definitivamente veio para ficar no meio de nós, uma vez que trata da sobrevivência do planeta e, consequentemente, da perspectiva de garantir alguma qualidade de vida para as pessoas de hoje e de amanhã, que vão além dos acionistas, empregados e consumidores, os públicos tradicionais das organizações.

As decisões, atividades, postura e atitudes no cotidiano – econômico, social e ambiental – de cada empresa, em escala mundial, invariavelmente geram impactos que podem se refletir nos quatro cantos do mundo, para o bem e para o mal. Mais este do que aquele.

Diante dessa nova premissa insofismável, as empresas têm necessidade de legitimar seus impactos diante da sociedade. Tudo isso ganha ainda mais relevância e velocidade a partir da comunicação globalizada, digital, permanente, extremamente móvel. É impossível esconder, ou não explicar, suas atitudes.

Sociedade de risco

Não cabe mais nas organizações que querem sobreviver e se perenizar o discurso cínico, o jogo de cena, a retórica vazia para ludibriar o cidadão e mascarar atividades que poluam ou produzam desastres ambientais, as conseqüências sociais e econômicas de fusões e aquisições de empresas, que resultam em desemprego, no desaparecimento de empresas inteiras, processos de trabalho, produtos e marcas tradicionais.

Inaugura-se a época de dialogar com a sociedade, em uma nova dimensão, na qual este falar e ouvir liga-se à confiança e, consequentemente, passa a ter valor econômico e ético. Diante desta realidade, que impõe um quadro de mudanças complexas, reconhece-se o comunicador ainda a trabalhar apenas mensagens voltadas para resultados de curto prazo, de caráter quantitativo, despossuídas de transcendência e que ignoram os impactos das atividades empresariais.

E esses impactos constroem a ‘sociedade de risco’: lugar repleto de perigos para a humanidade e para o meio ambiente, com impactos nunca vistos na identidade de países e pessoas, na geografia, na tradição, nas estruturas familiares e na democracia, como conceituam Antony Giddens, Ulrich Beck e Scoth Lash na obra Modernização reflexiva, de 1997. Este caráter daninho foi também destacado por Gareth Morgan, em Imagens da organização, o qual, desde 1986, é lido por acadêmicos e administradores das melhores escolas do Ocidente.

Profissional educador

Morgan afirma que ‘nossas organizações estão nos matando’ pelo envenenamento sistemático e diário da comida e da água. E, também, pela promoção do ‘vício pelo trabalho e formas relacionadas de estresse mental e social’. A face repugnante das organizações foi retomada recentemente no cinema em filmes como The Corporation, de Mark Achbar e Jennnifer Abbot, e Quanto vale ou é por quilo?, de Sérgio Bianchi. O professor Gilberto Dupas, em Atores e poderes na nova ordem global, de 2005, e em O mito do progresso, de 2006, alerta sobre a noção de progresso: gerador de produtividade vertiginosa que, se não interrompido, levará a humanidade para a extinção.

Marc Augé, em sua obra Não-Lugares, de 2003, provoca a interpretação das empresas, principalmente as de alta performance, como lugares tristes e sem alma, espaços destituídos de história, de expressões simbólicas de identidade. Não-lugares voltados para uma inovação destrutiva, que despreza a tradição. Ambientes nos quais predominam relacionamentos frágeis e quebradiços, cultura de manual e de auto-ajuda, que bloqueia a reflexão, fundamental para a discussão das questões complexas, entre elas a sustentabilidade.

A alta direção das empresas e seus comunicadores têm diante dos olhos um cenário novo, logo, difícil, que corrói a utopia e a esperança, que obriga o profissional de comunicação a posicionar-se não mais como um difusor de mensagens vazias, mas um ser culto, politizado, um educador.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Paulo Nassar

Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje); professor titular da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP); doutor e mestre pela ECA-USP. É coordenador do Grupo de Estudos de Novas Narrativas (GENN), da ECA-USP; pesquisador orientador de mestrado e doutorado (PPGCOM ECA-USP); pesquisador da British Academy (University of Liverpool) – 2016-2017. Entre outras premiações, recebeu o Atlas Award, concedido pela Public Relations Society of America (PRSA, Estados Unidos), por contribuições às práticas de relações públicas, e o prêmio Comunicador do Ano (Trajetória de Vida), concedido pela FundaCom (Espanha). É coautor dos livros: Communicating Causes: Strategic Public Relations for the Non-profit Sector (Routledge, Reino Unido, 2018); The Handbook of Financial Communication and Investor Relation (Wiley-Blackwell, Nova Jersey, 2018); O que É Comunicação Empresarial (Brasiliense, 1995); e Narrativas Mediáticas e Comunicação – Construção da Memória como Processo de Identidade Organizacional (Coimbra University Press, Portugal, 2018).

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