09 de junho de 2022

COlabora #15 – A história que nos une

*Publicado originalmente no LinkedIn em 02 de junho de 2022

escrito em parceria com Augusto Rodrigues, presidente do Centro da Memória da Eletricidade no Brasil

Na complexa teia de relações em torno da qual, atualmente, orbita a comunicação empresarial, uma condição essencial para o sucesso de nossos empreendimentos é a colocação das pessoas no centro de nossas ações, iniciativas e estratégias. O alinhamento de propósitos e a construção da identidade empresarial com base nos valores compartilhados, com os colaboradores e com os demais stakeholders, é a missão principal de uma área de Comunicação que se pretenda estratégica.

Esses aspectos estão evidenciados no Global PR & Communication Model 2021, da Global Alliance, confederação que reúne as principais instituições de Comunicação e Relações Públicas do mundo. Estruturado em cinco blocos, o modelo tem por objetivo capacitar os executivos de Comunicação a melhorarem o seu estilo de liderança e o seu processo de tomada de decisão, nas suas respectivas áreas de negócios, promovendo uma conexão real e autêntica com os stakeholders de sua organização.

Os cinco blocos desse modelo refletem uma construção alinhada, e reforçam a ideia de que a diferenciação, o engajamento e a legitimidade social, objetivos buscados pelas áreas de Comunicação de nossas empresas, são consequência de um longo e consistente trabalho, no qual o que chamamos comumente de Comunicação é apenas um elemento, entre outros objetivos, que devemos buscar insistentemente. Esse modelo, construído em alguns eventos internacionais, com a participação de centenas de profissionais do mundo inteiro, busca articular a criação e a gestão de uma marca forte com o desenvolvimento de uma Cultura Organizacional coesa, associando esses objetivos à Gestão da Reputação empresarial.

Assim, as pessoas, e as relações que elas estabelecem entre si, estão no centro de tudo, no coração dos programas de Comunicação. Disso resulta que, cada vez mais, é necessário conectar valores e trajetórias organizacionais a valores e trajetórias pessoais, mudando a forma como nós, dirigentes de Comunicação, temos lidado com as ideias de motivação e de engajamento dos profissionais. Já não basta ter fortes valores e fortes propósitos, se eles não se conectam com os anseios, com as necessidades e com as expectativas dos nossos diferentes públicos de relacionamento. Já não basta comunicar o que a empresa é, por melhor que ela seja. O que os stakeholders esperam é poder participar da construção dos valores da empresa. Eles querem conhecer os valores da organização. Eles querem gostar deles. E perceber que compartilham também desses valores. Isso vale ainda mais para os stakeholders internos.

Nesse sentido, as conexões entre a Comunicação e a Memória Organizacional tornam-se ainda mais importantes, e mais potentes. Já não é novidade que esses dois temas caminham juntos, compreendendo-se a Comunicação como um dos instrumentos da Memória Organizacional, e esta, como uma ferramenta para fortalecer a identidade e o senso de pertencimento dos públicos internos da organização.

Se olharmos essa realidade, no entanto, pelo prisma dos laços entre a história da empresa e as histórias pessoais dos públicos que com ela mantêm estreitos vínculos, as oportunidades de fortalecimento dessa frutífera relação se aprofundam exponencialmente. De um lado, temos vivenciado a bem-vinda valorização da diversidade, daquilo que cada um de nós traz de único – sua contribuição singular, a marca que uma pessoa quer deixar por onde passar. De outro, temos visto a importância do solo comum, aquele espaço que possibilita o encontro e a construção conjunta de uma realidade. O individual e o coletivo se alimentando, se fortalecendo e potencializando o cenário que está se desenvolvendo.

Isso é o que pode acontecer, também, com a relação entre a Comunicação Empresarial e a Memória Organizacional, quando parte de um trabalho estratégico, organizado em objetivos específicos de longo prazo. A Comunicação entendida não mais, apenas, como um instrumento de difusão da Memória da empresa, e esta, não apenas como uma ferramenta de Comunicação. Mas, antes disso, as duas como interfaces que, trabalhadas de modo integrado, podem estruturar a experiência coletiva, com muito mais eficiência e sucesso, baseando-se nos valores e nas memórias pessoais.

Essas referências às experiências pessoais dos profissionais fortalecerão o relacionamento entre as pessoas, intensificando, ainda mais, os seus vínculos com a organização. E isso sobretudo, neste mundo contemporâneo, quando as relações são cada vez mais fluidas e efêmeras, e as empresas enfrentam o desafio da reter os talentos de uma geração que precisa de muito mais do que o valor de sua remuneração ou de seus benefícios para construir uma carreira sólida dentro de uma organização.

No artigo ‘Memória e Comunicação Organizacional no Brasil – Interfaces’, de Lúcia Santa Cruz, publicado em 2014, a autora elenca cinco chaves conceituais, relacionando comunicação e memória, em nosso país:

1. Memória como estratégia de Comunicação – A memória como ingrediente da Comunicação, fortalecendo a disseminação dos valores empresariais e a imagem da organização;

2. Memória como cultura organizacional – A memória como instrumento de Gestão de Pessoas, fortalecendo a identidade empresarial, e o senso de pertencimento profissional;

3. Memória como gestão do conhecimento – Preservação, compartilhamento e transferência do capital intelectual das organizações;

4. Memória como trajetória institucional – Percurso histórico da organização;

5. Memória como saber coletivo – Conjunto de valores, crenças e símbolos de uma coletividade.

Ainda que a autora aponte a baixa incidência desses estudos, ressaltando o campo fértil para o desenvolvimento de novas pesquisas sobre esse tema, o texto traz pistas importantes sobre as múltiplas interfaces e as suas possibilidades estratégicas, chamando a atenção, também, para o amplo espaço ainda a ser explorado dentro das organizações.

Esse entendimento é corroborado pela pesquisa ‘História e Memória Empresarial no Brasil’, realizada em 2020, numa parceria do Centro da Memória da Eletricidade (CME) com a Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE), na qual apenas 18% das empresas respondentes afirmaram possuir um programa estruturado de memória empresarial, enquanto 29% desenvolvem ações eventuais nessa área, e 48% não têm qualquer iniciativa neste campo. Os 5% restantes afirmaram já ter desenvolvido programas, hoje desativados.

Seja por meio de ações pontuais, mas trabalhadas de modo estratégico, em conexão com as datas comemorativas e fortalecendo rituais coletivos, seja por meio de um programa consistente e contínuo, a interface entre Comunicação e Memória traz, para o cenário empresarial, a necessária conexão entre as trajetórias pessoais e a trajetória da organização, estruturando a experiência coletiva em torno de valores, emoções, sentimentos e ritos de passagem, que enchem de significado o tempo e o trabalho compartilhados.

Seremos, sempre, seres em relação e, onde quer que estejamos, sempre haverá uma história que nos une.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Renata Petrocelli Bezerra Paes

Superintendente de Comunicação da Eletrobras, Renata Petrocelli é jornalista e publicitária, com mestrado em Ciência da Arte pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e MBA em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Atualmente, cursa o Global Business Management do IBMEC. Atuando há mais de 10 anos na comunicação corporativa da Eletrobras, também coordena o Comitê de Comunicação Integrada das Empresas Eletrobras, que congrega todas as subsidiárias do grupo, e representa a empresa na Plataforma Ação para Comunicar e Engajar da Rede Brasil do Pacto Global. É membro do Conselho Editorial da revista "Comunicação e Memória", publicação da Memória da Eletricidade.

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