15 de dezembro de 2023

Ainda há um longo caminho no enfrentamento às mudanças climáticas, mas a COP28 chega ao final com sinalização positiva

Com uma dia a mais de duração e uma reviravolta final nas negociações, foi concluída, nesta quarta-feira (13/12) a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2023, a COP28.

A conferência estava prevista para terminar na terça-feira (12/12) mas, em virtude de impasses e para destravar as negociações finais, as discussões e o fechamento do acordo e do texto final adentraram pela madrugada e pelo dia de quarta, num esforço derradeiro.

Como principais legados, a sinalização histórica da transição dos combustíveis fósseis para outras fontes de energia, além de outros compromissos, anúncios e discussões relevantes, desde a adoção de um fundo de perdas e danos até um maior reconhecimento da contribuição das florestas, dos oceanos e de outros ecossistemas para a mitigação e adaptação às alterações climáticas, passando ainda pelo mercado de carbono, energias renováveis e pelo papel da urbanização, da agricultura e dos sistemas alimentares, bem como pelos impactos na saúde e em outras esferas.

Combustíveis fósseis

Olhando pelo copo meio cheio, o resultado final apresenta uma sinalização bastante positiva, uma evolução histórica. O documento não fala em eliminar totalmente, ou mesmo gradualmente, o uso dos combustíveis fósseis (petróleo, carvão e gás), como queriam alguns países e boa parte de especialistas e representantes da sociedade civil presentes na COP, mas o acordo final divulgado assinala o “início do fim” da era dos combustíveis fósseis, preparando o terreno para uma transição rápida, justa e equitativa, sustentada por cortes profundos nas emissões e pelo aumento do financiamento, condições essas indicadas no texto. Dessa forma, o texto final apoia a transição energética dos combustíveis fósseis para fontes de energia mais limpas.

É importante lembrar que, até esta conferência, a expressão “combustíveis fósseis” jamais havia constado de textos oficiais das COPs, realizadas há mais de 30 anos.

Os combustíveis fósseis são os maiores responsáveis pelos gases de efeito estufa (GEE), que causam as mudanças climáticas. Apesar disso, propostas formais nas COPs para a transição energética para combustíveis mais limpos sempre sofreram oposição dos grandes países produtores de petróleo.

O texto de “balanço geral” (Global Stocktake) convoca os países a adotar ”a transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de uma forma justa, ordenada e de forma equitativa, acelerando a ação nesta década crítica, de modo a atingir zero emissões líquidas até 2050, de acordo com a ciência”.

Assim, de maneira inédita na história das COPs, representantes dos quase 200 países presentes no evento aprovaram texto que propõe que se comece a reduzir o consumo global de combustíveis fósseis, para evitar os piores impactos das mudanças climáticas, embora isso não tenha sido dito de modo tão explícito.

O teor do documento, inédito, sinaliza que a era dos combustíveis fósseis pode estar se encaminhando para o fim, ainda que a linguagem escolhida seja considerada mais “amena”, pelos ambientalistas e por vários países (principalmente os mais vulneráveis às consequências das alterações climáticas), do que a necessária, em função da urgência de se conter as mudanças climáticas, tendo em vista que o ano de 2023 é o mais quente já registrado na história da humanidade, como aponta o observatório europeu Copernicus.

Outro avanço é que o primeiro “balanço global”, formalizado no acordo final da COP28, enfatiza o objetivo global de se manter o limite de aumento da temperatura global em até 1,5°C. O documento “reconhece ainda a necessidade de reduções profundas, rápidas e sustentadas nas emissões de gases do efeito estufa em linha com trajetórias de 1,5°C”. O documento de 2015 (Acordo de Paris) citava a possibilidade de aquecimento até 2°C, o que, hoje em dia, entende-se que representa um risco maior de eventos climáticos extremos.

Essa referência é importante porque reafirma o compromisso de que os países devem trabalhar para manter o nível máximo de aquecimento global a 1,5°C, em média, em relação aos níveis pré-industriais.

“Embora não tenhamos virado a página da era dos combustíveis fósseis no Dubai, este resultado é o início do fim”, exaltou o secretário executivo da ONU para Alterações Climáticas, Simon Stiell, no seu discurso de encerramento. “Agora, todos os governos e empresas precisam transformar estes compromissos em resultados para a economia real, sem demora”, complementou.

Além das menções aos combustíveis fósseis e ao aumento da temperatura até 1,5°C, o texto insta os países a “triplicar a capacidade de energia renovável a nível mundial e duplicar a média global da taxa anual de melhorias na eficiência energética até 2030”.

O presidente da COP28, Sultan Al-Jaber, considera este um momento-chave na história. O ponto em que o mundo mudou de rumo e começou realmente a exercer pressão sobre a fonte esmagadora das emissões que aquecem o nosso planeta: carvão, petróleo e gás. A sala de conferências da COP encheu-se de aplausos, com abraços e largos sorrisos nos rostos das delegações, quando o acordo foi anunciado. “Juntos encaramos a realidade e colocamos o mundo na direção certa”, acentuou.

Muitos países esperavam que o texto aprovado nesta quarta-feira (13/12) em Dubai apontasse a “eliminação gradual” do uso de combustíveis fósseis em todo o mundo. A eliminação gradual ou progressiva exigiria que os países reduzissem gradualmente a quantidade que produzem e utilizam até chegarem a zero. O acordo, no entanto, apela à “redução” do uso destes combustíveis, o que significa a diminuição do quanto um país depende de combustíveis fósseis, sem a exigência de uma meta de zero. Nos termos do acordo, os países também são chamados a contribuir para um esforço de transição global – em vez de serem totalmente obrigados a fazer essa mudança por conta própria.

Por outro lado, o texto não especifica como será feita essa transição energética nem quais recursos financeiros serão utilizados e, principalmente, não fala em eliminar totalmente os combustíveis fósseis. Além disso, não foi estabelecida nenhuma meta ou ano para que isso aconteça.

Após o anúncio do acordo, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, Marina Silva, disse que os países desenvolvidos deveriam assumir a liderança na transição dos combustíveis fósseis. “O desafio de cumprir esta missão de 1,5°C dependerá do compromisso de todos”, salientou.

O acordo firmado em Dubai (Emirados Árabes) após duas semanas de negociações, desde 30 de novembro, tinha como objetivo enviar um sinal expressivo aos investidores e formuladores de políticas públicas e à sociedade  de que o mundo agora está unido para dar fim ao uso dos combustíveis fósseis, algo que os cientistas afirmam ser a última e melhor esperança para evitar uma catástrofe climática. Esse sinal, de uma forma ou de outra, foi dado.

A sinalização histórica pode ser considerada muito positiva. O verdadeiro sucesso, no entanto, só poderá ser medido ao longo do tempo, pois estará na implementação das diretrizes consensadas.

Se nada for feito, o planeta ruma para um aquecimento entre 2,5ºC e 2,9ºC. O ano de 2023 está terminando como o mais quente da história e com emissões recordes, enquanto os planos para reduzir essas emissões ainda continuam insuficientes. Eventos climáticos extremos têm se multiplicado por todo o planeta, acumulando perdas humanas, materiais e econômicas. Assim, é fundamental evoluirmos em ações que nos preparem para lidar com isso.

Principais pontos discutidos e/ou anunciados na COP28

No total, o texto final relativo ao acordo da COP28 apresenta 196 tópicos sobre o que deve acontecer ou ser feito para mitigar os efeitos negativos das mudanças climáticas.

Dentre outras, destaque para algumas iniciativas anunciadas e/ou debatidas durante a conferência:

  • Transição dos combustíveis fósseis
  • Fundo de Perdas e Danos
  • Iniciativas ligadas à agricultura e sistemas alimentares
  • Fundo global para florestas tropicais
  • Energias renováveis
  • Mercado de carbono
  • Plataforma Onde Verde (que visa conectar quem oferece e quem procura soluções de transição para um futuro de carbono zero)
  • Recorde de emissões globais em 2023
  • Diminuição do uso do carvão
  • Petrolíferas anunciam pacto para redução de emissões
  • NDCs (contribuições nacionalmente determinadas, que representam as metas e compromissos de redução de emissões de GEE que cada país definiu para si a partir do Acordo de Paris).
  • Saúde
  • Urbanização
  • Desmatamento
  • Indígenas
  • Juventude
  • Conexão entre mudanças climáticas e guerras
  • Setor marítimo
  • Corais
  • Painel sobre hidrogênio no Brasil
  • Fundo Amazônia
  • Plano estratégico de desenvolvimento sustentável para a Amazônia
  • Iniciativas sustentáveis de estados como Amazonas, Pará, Tocantins, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Rio Grande do Sul
  • Acordo Mombak X Microsoft (para fornecimento de créditos de remoção de carbono de seus projetos de reflorestamento na Amazônia brasileira)
  • Plataforma para negociação de créditos de carbono na B3
  • Onde será a COP29

Mais detalhes sobre essas iniciativas em nossas publicações sobre a COP28. Acompanhe nossas publicações sobre isso aqui no site e em nossas redes sociais!

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Carlos Parente

Graduado em Administração de Empresas pela UFBA, com MBA em Marketing pela FEA USP, possui um sólido histórico de experiência em Relações Institucionais & Governamentais, Comunicação Corporativa e Advocacy, com participações e lideranças em processos de comunicação estratégica, inclusive internacionais. Carlos Parente é sócio-diretor da Midfield Consulting.

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