19 de fevereiro de 2024
BLOG Sinapse

Espontaneidade, legado e cocriação estão entre tendências criativas do D&AD Trends Report

 

Sempre existem verdades universais que transcendem as tendências. E o relatório “Annual Trend Report 2023”, baseado nos cases ganhadores do D&AD Awards, celebra o melhor trabalho criativo em publicidade e design através do olhar de 300 profissionais sobre 12000 inscrições em 40 categorias. E traz já no início alguns pilares importantes sobre comunicação e criatividade para agora e os próximos anos:

ESPONTANEIDADE

De roteiros improvisados e entrevistas à gamificação, os trabalhos ganham em alegria espontânea e entretenimento. Estudos já atestaram que as pessoas preferem ações improvisadas ou não planejadas porque fazem com que o entretenimento pareça mais autêntico. A única ressalva é a qualidade final percebida do trabalho, mas geralmente o risco vale a pena. Momentos inesperados de alegria foram um fio condutor digno de ser olhado.

DEIXANDO UM LEGADO POSITIVO

O trabalho vai além da duração de uma campanha para impactar a sociedade no longo prazo. O trabalho com legado está capturando, registrando e preservando a história, e produtos com vida útil prolongada estão causando o menor impacto possível na Terra. Além disso, as campanhas que capacitam e apoiam subculturas e comunidades sub-representadas plantam sementes de mudanças positivas.

CORRIGINDO ERROS HISTÓRICOS

Os povos indígenas e marginalizados foram amplamente ignorados, estereotipados ou retratados de forma imprecisa ao longo da história nas comunicações. Mas os tempos estão mudando. Através de uma miríade de meios e formas de arte, trabalhos agora têm trazido comunidades indígenas e carentes para o processo criativo, para contarem autenticamente as suas histórias com uma compreensão mais profunda dos seus próprios contextos culturais. As marcas estão ouvindo e se alinhando.

ESCAPISMO

Nos mundos virtuais, nas experiências surreais, nos jogos, não há dúvida de que, em tempos difíceis, procuramos experiências e formas de escapar da vida quotidiana. Os trabalhos têm transportado ao passado, ao futuro e aos limites da nossa imaginação para explorar mundos e dimensões imaginárias.

COCRIAÇÃO

O público não é mais participante inativo no processo criativo porque, num mundo cada vez mais isolado, é preciso sentir-se conectado e contribuindo para a sociedade. A participação capacita as pessoas, quebra barreiras e permite que o trabalho seja ampliado. As marcas estão trazendo pessoas para o trabalho, desde a redação do roteiro até o casting de rua, com resultados fenomenais.

Moldados pelas mudanças no mundo mais amplo e apontando para o que está por vir, algumas tendências podem ser traçadas no decorrer da análise das categorias:

Joyful Surrealism

Justaposições inesperadas e novas formas de experimentar o mundo foram vistas em toda a variedade de meios criativos. O trabalho criativo surpreende e emociona, transportando o público para mundos inesperados, envolvendo conceitos surreais e fantasia e trazendo experiências multissensoriais para evocar sentimentos de admiração. E brincar com o humor contrabalança a incerteza de um mundo turbulento.

Através do Joy Surrealism, as pessoas podem experimentar uma gama mais ampla de respostas emocionais, desde medo e confusão arrepiantes até puro prazer. A dica é por respostas extremas, ultrapassando os limites da originalidade e do realismo. Vale ainda dizer que a nostalgia foi um ponto de partida para o humor, e acenar para gêneros como ficção científica e fantasia acrescentou truques e surpresa.

Brincando com contrastes e justaposições, misturando camadas de áudio – de efeitos sonoros a partituras musicais – com recursos visuais – de filme a animação – foram vistos trabalhos emocionantes que evitam o óbvio. E, num mundo de incertezas, o impacto vem da irreverência, até mesmo de uma voz cômica que se encaixa no DNA de uma marca.

O trabalho criativo pode ser emocionante e evitar a inevitabilidade ao brincar com contrastes e justaposições. Os criativos podem pensar em misturar realidade e fantasia, e dar vida aos personagens em cenários incomuns criará suspense.

Open-Source Casting

Escolher pessoas reais apresenta representações autênticas e socialmente inclusivas da sociedade, destacando os pontos em comum das pessoas em detrimento das suas diferenças, começando pelas marcas com as quais se alinham. Esta tendência reflete a antiperfeição num mundo imperfeito.

Trabalhos vencedores mostram alianças imprevisíveis, derrubando barreiras sociais à inclusão, criando unidade e camaradagem. Diversas culturas e comunidades ganharam vida através de áudio, gráficos e imagens.

Vê-se também a prevalência do foco na própria localidade. A adição de camadas visuais e sonoras de inspiração local capturou os contextos culturais e as comunidades da vida real estiveram autenticamente no centro do trabalho e as comunidades indígenas, línguas e dialetos nativos foram representados e celebrados.

Os sistemas de valores estão mudando. Há agora mais fluidez na forma como a sociedade se define, bem além dos dados demográficos confinados. Em outras palavras: não é quem você é ou o que você faz, mas o que você representa que importa no mundo e está impactando nossas decisões de compra. Além disso, o consumo cultural tornou-se mais específico, à medida em que os meios de comunicação tradicionais (televisão, rádio e imprensa) perdem a sua influência. Assim, as marcas conseguem atingir públicos de nicho, interagindo com subgrupos e subculturas em vários meios, desde plataformas sociais a podcasts. Os conceitos em torno do envolvimento e do consumo em massa estão a mudar.

A ‘TikTokification’ das redes sociais significa que o público agora espera conteúdo online não filtrado e da vida real. Portanto, não é de admirar que o casting de rua esteja penetrando na comunicação. Até mesmo a crescente economia dos influenciadores ocorre à medida em que o surgimento de microinfluenciadores com pequenos seguidores é adotado pelas marcas para atingir micropúblicos. E uma mudança de influenciadores para criadores de conteúdo está testemunhando uma mudança mais ampla da perfeição excessiva para interpretações não filtradas da realidade.

A ideia é interagir com as comunidades de forma autêntica, o que significa assumir um compromisso de longo prazo e entrar num diálogo onde a comunidade se sinta segura para partilhar a sua verdade única. As marcas devem se abrir e ver a sua comunidade como colaboradora, observando e ouvindo ativamente os fãs sub-representados.

Ownable Iconicity

Num aparente movimento em direção à familiaridade, muitos designs destilam o elemento icônico do DNA de uma marca para reimaginá-la através de uma nova lente. Um sinal icônico é aquele cuja forma se assemelha de alguma forma ao seu significado, e esse efeito foi amplificado em vários pontos de contato.

A forma está ligada ao significado. A iconicidade descreve a relação de semelhança ou semelhança entre os dois aspectos de um signo: sua forma e seu significado. É preciso investir em sistemas de design próprios, com letras, símbolos, logotipos, sons e sistemas de design completos representando e reforçando a essência da marca numa interpretação visual da sua herança e identidade.

O alinhamento entre a promessa da marca e a experiência do consumidor é extremamente importante no mundo cacofônico de hoje. Uma experiência memorável e distinta é um dos principais impulsionadores para a criação de uma marca forte e há um elemento de previsibilidade inerente a isto: a marca confirma as expectativas do consumidor durante todo o processo e, como resultado, temos uma sensação de tranquilidade.

Augmentation for all

Augmentation for All destaca as possibilidades de um futuro “phygital” onde as realidades física e digital coexistem. Destaca-se aqui o potencial das tecnologias aumentadas e virtuais e de como a IA, a AR e a aprendizagem automática trazem sociedades mais inclusivas.

Jogos e mundos virtuais não são apenas puro entretenimento. Cada vez mais, as inovações neste espaço são educativas e impactantes, tornando o mundo um campo de jogo mais equitativo para aqueles com deficiências físicas e mentais.

O trabalho criativo mostra como as personas virtuais e físicas coexistem. A evolução dos avatares e bots está mudando o cenário. À medida em que se torna mais sofisticada, a tecnologia emergente tem o potencial de transformar a nossa vida quotidiana. Ao replicar o mundo real em domínios digitais, vê-se o potencial dos mundos virtuais para envolver os consumidores em novas experiências que aumentam as realidades físicas.

Ainda permanece uma questão em torno da inclusão. As tecnologias emergentes nivelam as condições de concorrência para que as pessoas com deficiência desempenhem um papel mais importante na sociedade, mas ainda há algum caminho a percorrer para alcançar a paridade.

Vale ainda fazer referência aos eventos ao vivo, desde desportos a concertos musicais, porque são um terreno fértil para a inovação. As marcas devem pensar de forma disruptiva sobre como os eventos podem melhorar a oferta ao cliente.

Preserving the past

Num mundo ameaçado, esta tendência explora trabalhos que preservam culturas, revivem costumes antigos, restauram ambientes e corrigem os erros da história. A criatividade é a solução de problemas para lembrar e capturar a nossa história e herança, a fim de moldar o futuro.

Através das tecnologias, monumentos, culturas e ambientes em risco de extinção devido à guerra e às alterações ambientais podem ser reinventados em espaços digitais. O passado fala com o presente, desde a preservação de artefatos e a restauração da arquitetura até ao destaque de tradições antigas, processos contemporâneos e conceitos de design e captura e recontagem do patrimônio e da história com integridade.

Nunca foi tão importante preservar, restaurar e proteger o planeta e as suas culturas, e contar histórias para refletir com precisão a história de cada um. O trabalho criativo neste espaço precisa alertar o público para a destruição e as necessidades urgentes de um mundo em rápida mudança.

Pay it forward

As marcas estão projetando conscientemente um futuro positivo para as pessoas e para o planeta. O trabalho criativo explora como serão o design e as comunicações intencionais agora e no futuro, e como se desenrola a tensão entre a necessidade econômica e os sistemas, produtos e serviços regenerativos.

Os sistemas de economia circular estão a refazer, reutilizar e regenerar produtos e materiais para limitar o desperdício. A comunicação não pode ficar alheia a isto. É preciso demonstrar como as marcas e designers estão adotando o pensamento circular e aumentando a consciência do consumidor no processo. As marcas também estão repensando o produto até a compra – com novas formas de consumir.

Os consumidores estão equilibrando escolhas sustentáveis com a necessidade de valor. O equilíbrio entre propósito e lucro, e a tensão entre a necessidade econômica e a necessidade de sistemas, produtos e serviços regenerativos cada vez aumentam mais. As crises ambientais e sociais convergentes levam a esta reavaliação dos hábitos de consumo.

Produtos sustentáveis que forneçam soluções para a gestão de resíduos são essenciais para um futuro mais verde, mas os designers devem agora equilibrar o valor com o propósito, à medida que os consumidores navegam na crise do custo de vida.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Rodrigo Cogo

Rodrigo Cogo é o curador do Sinapse Conteúdos de Comunicação em Rede e responsável pela distribuição digital dos canais integrantes da plataforma. Formado em Relações Públicas pela Universidade Federal de Santa Maria, é especialista em Gestão Estratégica da Comunicação Organizacional e Mestre em Ciências da Comunicação, com estudos voltados para a Memória Empresarial e Storytelling, ambos pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (SP). Atuou na Aberje por 14 anos, passando pelas áreas de Conteúdo, Marketing e Desenvolvimento Associativo e tendo sido professor em cursos livres e in company e no MBA da entidade por 10 anos. É autor do livro "Storytelling: as narrativas da memória na estratégia da comunicação".

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