08 de novembro de 2023
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Criatividade artificial, cultura do conforto e mais: o que consultorias veem como tendências de comportamento

 

Trata-se de uma curadoria anual de tendências, que busca situar no tempo movimentos que já acontecem e que, relacionados, são indicativos de algo maior: assim dá pra definir o relatório “Tendências de tecnologia e comportamento para marcas em 2023”, criação conjunta da WGSN com a Bits to Brands que se torna alvo desta edição do Sinapse Resumo.

Quando uma das tendências mais presentes na comunicação é a nostalgia, parece que não se está assim tão interessado no “novo”. Por outro lado, a mágica da inteligência artificial generativa só precisou de algumas semanas para dominar as conversas sobre arte, tecnologia, trabalho e futuro. No meio disso, alguns movimentos vão e voltam na sua constante evolução. A relação entre branding e performance, por exemplo, ora pende mais para um lado, ora para outro, mas parece que finalmente vai estar mais próxima do que nunca. Influenciadores e criadores de conteúdo seguem como força propulsora de engajamento e criatividade na internet, cada vez mais profissionais e ganhando novos papeis dentro e fora das plataformas.

Plataformas que, por sua vez, estão cada vez menos sociais – deixando toda uma geração mais saudosa do que nunca por tempos mais simples de selfies no espelho e fotos de sushi. Presos entre o normal e o novo, mais do que nunca entender o hoje e imaginar as possibilidades é o único jeito de construir o futuro que a gente quer. Influenciado por marcas e por tecnologia, ele é feito das escolhas que fazemos.

A seguir, as seis tendências que vêm pautando conteúdo, consumo, comportamento e a relação de uns com os outros e com a tecnologia em 2023: Criatividade Artificial; Branding que performa, performance que marca; Cultura do Conforto; Influência S/A; Redes menos sociais e Nutrição digital.

Criatividade Artificial

Os processos criativos não serão os mesmos agora que temos robôs como assistentes para as mais diversas demandas. Isto dá agilidade e também libera o ser humano criativo para outras questões estratégicas que podem ser mais relevantes.

Há menos de seis meses, está-se falando de maneira intensiva – e com cada vez mais novidades e também análises do lado ético, em Dall-E, Midjourney, Lensa, ChatGPT e outras ferramentas baseadas em inteligência artificial generativa. Inteligência Artificial Generativa é uma área da IA que faz com que computadores criem todo tipo de conteúdo original – imagens, poemas, música, texto, vídeos, interações e até códigos de programação. O resultado final é tão impressionante que é fácil imaginar que nós estamos entre máquinas que têm vida própria e espírito criativo – mas esse não é o caso. Esses sistemas são imitadores muito bons da criatividade humana. Eles foram treinados por milhões de artefatos humanos como documentos, artigos, desenhos, pinturas, filmes e todo tipo de conteúdo armazenado em bases de dados. A tecnologia por trás já existe há alguns anos, mas foi no final de 2022 que esses sistemas vêm atingindo um nível de maturidade para serem lançados ao público.

Entre os motivos para prestar atenção neste rápido movimento, está o aumento de popularidade da inteligência artificial e dos assistentes virtuais, o fato de ser uma ferramenta altamente personalizável e escalável e a capacidade de gerar texto humano natural, com personalização e escalabilidade, além do crescente interesse popular nesse tipo de tecnologia para marcas que têm ou querem ter a inovação reconhecida em seu DNA.

A sensibilidade, aleatoriedade e imperfeição humana seguem sendo elementos essenciais no processo criativo do que é feito para gerar conexão emocional. Mas elementos desse processo passam a ser muito facilmente automatizados – como resumos, geração de ideias e busca por referências.

É preciso pensar num novo conceito em estágio inicial: a inteligência coletiva (IC). Nele, múltiplas formas de conhecimento – o humano, o ecológico e o tecnológico – se fundirão sob a bandeira da inteligência coletiva. Para as empresas e consumidores, isso significa que será possível encontrar melhores soluções para serviços e produtos ao combinar a eficiência da máquina com as qualidades humanas, como empatia, criatividade e intuição.

Além disso, a previsão é deixar para trás já no final deste ano a era da informação para entrar na era da imaginação, uma época em que a IA irá expandir a criatividade, criar mais possibilidades de storytelling, democratizar o mercado criativo e ampliar a área de atuação dos profissionais de marketing. Por outro lado, as ferramentas de IA irão levantar questões legais referentes à propriedade intelectual e direitos autorais.

Branding que performa, performance que marca

Se na sala de reunião uma coisa é “performance” e outra é “branding”, para o consumidor é tudo a mesma marca. E para a estratégia, essa integração vai ser essencial.

A inevitável aproximação de branding e performance deixa de ser um “extra” no processo de construção de uma marca forte, e torna-se um movimento essencial na estratégia de negócios que buscam eficiência no funil de vendas. Isso acontece por dois motivos. O primeiro, ligado às plataformas e à economia da atenção. O segundo, sobre percepção de marca e construção de atributos. Bem assim, um lado mais racional, o outro mais emocional.

As fórmulas que um dia funcionaram super bem são regidas por algoritmos, cuja lógica pode mudar a qualquer momento. E quanto mais marcas buscam a eficiência dos anúncios, menos eficientes eles ficam para todo mundo, já que ficam mais caros e chamam menos atenção das pessoas. Aí surge o chamado “platô de performance”, que é como tem sido chamado o fenômeno que acontece quando o investimento em performance cresce, mas o crescimento não vem na mesma proporção. Pelo contrário, ele começa a parecer uma linha reta.

O pesquisador e professor John Dawes ajuda a ilustrar bem essa questão com a teoria do “95/5”. Segundo ele, apenas 5% dos consumidores estão prontos para comprar naquele momento. Ou seja, por maior a frequência ou por mais “imperdível” que seja a oferta, ainda assim é provável que ela esteja atingindo muito mais pessoas que não estão em momento de compra. Assim, há um limite para as conversões imediatas que a comunicação é capaz de gerar. Mas pensar em estratégias para gerar lembrança, identificação e preferência, pode fazer com que os 95% escolham a marca quando estiverem prontos, ou seja sem depender, necessariamente, de mídia paga naquele momento.

Os criativos de performance e a estratégia de canais como um todo devem construir atributos de marca, uma lembrança positiva, uma mensagem memorável. E, claro, conectada aos objetivos do negócio e à identidade visual. Porque outra crença que vem se desconstruindo em 2023 é a de que “peças de performance precisam ser focadas nos seus objetivos, e não nos ativos de marca”. Talvez dentro de empresas em que essas áreas trabalham separadas, mas não aos olhos do consumidor.

Em 2023, equilíbrio será a palavra de ordem para as marcas. Os profissionais de comunicação e marketing irão priorizar tanto os objetivos de curto prazo quanto a construção da marca no longo prazo, adotando uma visão mais ampla das metas de uma empresa e mostrando que curto e longo prazos estão interligados. Isso significa que podem investir em conteúdo orgânico no curto prazo, mas o maior investimento deve ir para estratégias sólidas que demonstram o compromisso da marca com seus ideais e metas de longo prazo.

Cultura do Conforto

Ao mesmo tempo em que o futuro fica mais próximo, um retorno ao passado domina a cultura, a comunicação e a moda. A pandemia e a sensação de descontrole e por vezes até desamparo acelerou a busca pela segurança do familiar e do simples. E a conexão emocional que as referências nostálgicas trazem, trouxe resultado para as marcas em forma de views e engajamento.

Cultura do conforto é o fenômeno de perseguir memórias que despertam um senso familiar de alívio. Livros, filmes, seriados, músicas que você adora e que trazem um sentimento leve e agradável quando você os consome. As coisas que  marcam nessas épocas da vida têm o poder de transportar a elas. São máquinas do tempo no mundo real, e gatilhos fáceis de apertar especialmente quando o assunto é consumo.

O grande desafio das marcas nos próximos tempos será acompanhar a velocidade das mudanças e as tantas opções à disposição das novas gerações, enquanto buscam no passado lugares de afetividade que sigam apelando ao “conforto”. A palavra ‘nostalgia’ é definida como “uma busca sentimental ou um sentimento afetuoso do passado” e o uso do conceito tem sido uma importante ferramenta de marketing da última década, principalmente pela busca das marcas de tentar agradar a geração Millennial.

Durante a pandemia, as experiências nostálgicas reconfortaram e geraram sentimentos de felicidade, gratidão e relaxamento para os consumidores, que almejavam a serendipidade (descobertas ao acaso) e momentos comuns do cotidiano pré-pandemia, uma época em que diversas possibilidades realmente pareciam existir. Esse estilo de vida “déjà vu” ultrapassou os dias de confinamento e agora ajuda as gerações mais novas a lidar com problemas como a falta de oportunidades de emprego, instabilidade financeira e toxicidade das redes. Ele também trouxe um outro efeito colateral positivo: a mudança da percepção de luxo pela Geração Z que evoluiu à medida que eles passaram a dar mais valor ao tempo passado com a família e fora das redes.

Influência S/A

Consolidados como plataformas de mídia, influenciadores agora monetizam a sua imagem e capacidade de criação, que tem cada vez mais valor.

Com o excesso de estímulo vivido nos últimos dois anos, com a hiper aceleração do digital, entramos em uma nova era da recessão da atenção. Os consumidores estão cansados e só criar, ou repetir conteúdo, não será mais suficiente. Por isso, o papel do influencer ou creator se expande, trazendo o poder da atenção que até mesmo grandes marcas não conseguiram atingir e passam a ter novos papéis na vida dos consumidores.

Se nos últimos anos a busca por criadores de conteúdo era pautada por “1 post e 3 stories” e o seu maior valor era o tamanho da sua audiência, as coisas estão mudando. Features como “publicação compartilhada” e a fluência que só o criador tem sobre o que funciona nas redes sociais, fazem com que o seu valor esteja não só no seu papel como mídia e na sua imagem, mas na sua capacidade de criação. Uma marca que precisa criar em formato de vídeo (e precisa ter um tom “caseiro” para ser melhor aceito…) ou criar para o TikTok terceiriza para esses criadores o que uma produtora faria, numa mudança de papéis que expande os negócios e beneficia os criadores que encontram um formato próprio.

Se mapear as marcas mais valiosas, praticamente todas têm a sua timeline povoada por influenciadores de diferentes nichos, com a clareza de que será um conteúdo que irá ressoar com a audiência. A marca divide parte da sua criação nas redes sociais com a creator economy – e fortalece todo o ecossistema no processo.

E quando o assunto é valor que a influência digital e as comunidades online podem gerar para as marcas, cada vez mais influenciadores têm buscado reverter esse valor para si próprios. Ou seja: se for para fazer propaganda de algum produto, por que não um produto seu? Mas aqui entra a capacidade de encontrar produtos que ressoem com a sua audiência e que se encaixem bem na sua narrativa – e produzi-los com qualidade e responsabilidade. Quando essa fórmula se encaixa, o criador de conteúdo torna-se empresário e empreendedor, papel que em muitos casos vira também uma nova editoria no seu perfil – formando um ciclo de valor em forma de engajamento e de resultado financeiro.

O fato é que marcas passam a enxergar e trabalhar com o creator não só como um espaço de mídia, mas também como um ecossistema de fornecimento de serviços de consultoria, produção, digital, criatividade e conteúdo. A Creator Economy passa a estar integrada na construção e entrega da comunicação da marca. Não há como negar que a creator economy é uma grande oportunidade, além de ter se tornado não só um caminho de carreira sério e reconhecido, também tem se mostrado potencialmente muito lucrativo. Alguns creators têm se tornado marcas e negócios a partir do seu status, expandindo seu potencial de receita e empoderando suas audiências.

Redes menos sociais

Entretenimento, ferramenta de busca e grupos fechados. As redes sociais ganham novos papéis e se afastam da ideia de “círculo social”.

As plataformas estão vivas e são parte essencial de como se passa o tempo, consume conteúdo e interage uns com os outros. O que vem mudando de forma acelerada é como. Porque antes, o foco das redes sociais como um todo era as pessoas que você segue – quem você conhece ou gostaria de acompanhar. E o conteúdo, claro, feito para conquistar seguidores. Mas, com a ascensão do TikTok, o que tem dominado a atenção das pessoas é o entretenimento, mais do que a sua origem. Você não precisa seguir ninguém, e muitas vezes não sabe nada sobre aquele creator que vive na For You Page. Conforme as outras plataformas vêm tentando capturar um pouco dessa mágica (e desse tempo de tela), elas também se tornam redes cada vez menos sociais.

Mas é preciso observar que a autenticidade, o artesanal e o slow content seguem com lugar garantido. Mesmo que seguir “a favor” da lógica do TIkTok seja considerado fórmula de sucesso, há muitas coisas que viralizam justamente por ir na direção “contrária”. De toda maneira, é irrecusável constatar que, ao tornarem-se menos sociais e mais focadas em entretenimento e conteúdo, as redes sociais assumem um novo papel: o de ferramenta de busca.

A mídia social descentralizada está surgindo à medida que os usuários exigem espaços digitais mais seguros e autênticos que se alinhem com suas expectativas em relação à confiança, transparência e responsabilidade online. O reflexo disso será a busca dos usuários por espaços públicos digitais alternativos que sejam seguros e alimentados pela comunidade, que terá agora sua construção reinventada. Nesta nova era, a construção de comunidades surgirá por meio de praças digitais descentralizadas que ampliam a socialização e igualam a participação.

O alinhamento com as comunidades é o ativo mais valioso que uma empresa pode ter. A estratégia daqui para frente não é abandonar completamente as plataformas. As marcas precisam aplicar comportamentos saudáveis para garantir que seu conteúdo não amplifique a toxicidade e tenha conexão real com o seu público.

Nutrição digital

Sai o detox temporário, entra uma nova relação com o conteúdo consumido tantas horas por dia – menos excesso e mais qualidade.

Nutrição digital é a teoria que relaciona tipos diferentes de conteúdo com as emoções despertadas por eles. E coloca no centro da conversa o equilíbrio – como em uma dieta alimentar. Essa tendência é sobre desenvolver e implementar habilidades e criar novos hábitos que ajudem a retomar o controle sobre o consumo de tecnologia e conteúdo. Ao invés de ferramentas de controle absoluto de tempo, deve-se buscar estratégias, produtos e conteúdos que preservem a energia ao invés de sugá-la.

Outro aspecto que a nutrição digital ajuda a elucidar é o de que não existe uma fórmula que funcione para todo mundo. Aquilo que faz bem, que vale a atenção, é individual e varia conforme a rotina e os interesses de cada um. Mas, na busca por mais equilíbrio e saúde no conteúdo consumido, há três palavras-chave que podem ajudar: intenção (o que vim fazer aqui?), atenção (o que vale a pena dispender tempo em cada momento) e ação (aliar intenção e atenção na prática para não desperdiçar vida).

O resultado é que as redes sociais irão se transformar uma vez que os consumidores, cansados pelo esgotamento crônico do scroll infinito (doomscrolling) e da ansiedade algorítmica, buscam vidas alternativas e mais lentas. As plataformas tornaram-se espaços polivalentes para viver, aprender e se divertir e agora atendem a uma base de usuários intergeracional em expansão com interesses variados. Mas o usuário agora terá, e quer ter cada vez mais, o controle.

 

Autores

A Bits to Brands é um newsletter sobre branding, tecnologia e comportamento que, desde 2018, atualiza e inspira mais de 25 mil profissionais por todo Brasil. Caso queira assinar, basta clicar aqui.

Já a WGSN é uma consultoria internacional que, por meio de dados de inteligência e um alcance global, identifica, avalia, verifica e contextualiza tendências – com um monitoramos constante dos sinais das mudanças que impactarão o modo como o consumidor pensa, se sente e se comporta. Conheça mais sobre eles.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Rodrigo Cogo

Rodrigo Cogo é o curador do Sinapse Conteúdos de Comunicação em Rede e responsável pela distribuição digital dos canais integrantes da plataforma. Formado em Relações Públicas pela Universidade Federal de Santa Maria, é especialista em Gestão Estratégica da Comunicação Organizacional e Mestre em Ciências da Comunicação, com estudos voltados para a Memória Empresarial e Storytelling, ambos pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (SP). Atuou na Aberje por 14 anos, passando pelas áreas de Conteúdo, Marketing e Desenvolvimento Associativo e tendo sido professor em cursos livres e in company e no MBA da entidade por 10 anos. É autor do livro "Storytelling: as narrativas da memória na estratégia da comunicação".

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