06 de abril de 2022

O impacto da pesquisa em comunicação: geração Z, influência, metaverso, trabalho e liderança – parte 1

A 25ª edição do International Public Relations Research Conference (IPRRC) foi realizada em março deste ano, ocasião em que ocorreu mais uma entrega do International Aberje Award, premiação que reconhece estudos acadêmicos de pesquisadores estrangeiros relacionados à comunicação no Brasil e na América Latina. Voltando ao formato presencial, a conferência reuniu em Orlando (Estados Unidos) profissionais e pesquisadores de 14 países, que apresentaram 67 trabalhos em sessões que ocorreram de forma simultânea.

Durante os três dias de conferência, tivemos contato com pesquisas – concluídas ou ainda em progresso – e debatemos seus impactos na profissão e no dia a dia do comunicador e relações públicas. Com o objetivo de expandir o conhecimento e inspirar a rede associada, fizemos uma seleção, dividida por temas de interesse, das pesquisas mais interessantes que vimos por lá.

Confira os principais estudos do campo que estão mudando a profissão

A chegada da Geração Z

Não é nenhum segredo que as expectativas dos consumidores para as marcas mudaram.  De acordo com o Relatório Especial do Edelman Trust Barometer – Brand Trust em 2020, 80% dos consumidores querem que as marcas resolvam os problemas da sociedade.  Os consumidores da Geração Z estão no centro do impulso para essas mudanças que visam soluções para as questões sociais. Em poucas palavras: eles exigem mais e esperam que as empresas se posicionem, inclusive e, principalmente, sobre questões sociais controversas. As demandas da Geração Z estão mudando a forma como as empresas estão se comportando e, consequente, a sua forma de comunicação.

O que o trabalho “Is that CSA or CSR? Understanding Gen Z Consumer Expectations and Evaluations of Companies Level of Engagement with Social-Political Issues”, de Holly Overton (Penn State University) Joon Kyoung Kim (Universidade de Rhode Island) e Carrie Sipes (Universidade de Shippensburg) traz é que pessoas entre 18-24 anos possuem interesse em organizações que se posicionam em relação às questões sociopolíticas controversas, dentro do que é chamado de advocacy social corporativo. Isso significa que questões como justiça racial, equidade de gênero, empoderamento feminino, direitos LGBTQ+, direito a voto, saúde mental dos indivíduos e bem-estar de refugiados são, por exemplo, temas sobre os quais, quando tratados pelas organizações, fazem com que a Geração Z tenha uma percepção mais positiva em relação a sua autenticidade, podendo gerar uma defesa da marca, aumentar a intenção de compra de produtos e serviços e o interesse em trabalhar nelas.

Outra grande mudança na comunicação, com a chegada da Geração Z, é em relação à novas plataformas tecnológicas. O TikTok foi a rede social mais baixada em 2021 e é a plataforma em que a Geração Z mais está presente. Acostumados a criar no mundo digital o que não existe no mundo real, estão dispostos a comprar itens que são apenas virtuais para seus avatares. Suas intenções e decisões de compras são altamente influenciadas pelas pessoas que seguem em suas redes. Com a chegada deles, há grande oportunidade para os profissionais de Relações Públicas aperfeiçoarem suas estratégias com influenciadores em mídias sociais.

Um mundo cada vez mais influenciável

Como o papel das relações públicas é continuamente definido pelas mídias sociais digitais, saber trabalhar estrategicamente com influenciadores torna-se uma necessidade crescente.  O trabalho “I’ve Been Influenced! Using Q-Methodology to Decipher Influencer Follower Motivations for Public Relations”, dos pesquisadores Danielle Hallows, Staci Smith, Brian Smith e Ljubica Ivanovic, da Brigham Young University, estabeleceu uma interessante orientação aos relações-públicas, examinando a relação influenciador-seguidor.  Os resultados da metodologia-Q (que mescla entrevistas em profundidade qualitativas com análises fatoriais qualitativas) mostram que os seguidores, considerados possíveis públicos de uma organização, podem ser movidos por diferentes características e interesses:

a) Entusiastas de produtos, são aqueles seguidores cuja conexão emocional se dá através das novidades apresentadas pela marca. Por isso, o que querem ver são lançamentos de novos produtos ou produtos sendo testados, e esperam receber recomendações de compra por qualidade e preço, por exemplo; b) Buscadores de informação, por sua vez, estabelecem conexão orientados por conteúdos com foco na comunicação e responsabilidade social. Neste caso, a energia ativista do influenciador é importante para esse tipo de seguidor; c) Realistas inspirados, são aqueles que conexão é baseada em auto-aperfeiçoamento, ou seja, esse tipo de seguidor quer aprender algo e não gosta quando os influenciadores são “representantes de uma marca” e nem buscam uma apego emocional ou relacional com os influenciadores e d) Entusiastas do entretenimento, cuja conexão é baseada no valor de entretenimento de conteúdo, no carisma, humor e estilo de vida do influenciador.

O papel dos relações-públicas nessa questão é entender o que motiva cada público a seguir determinados influenciadores, a partir da análise de sua relação parassocial marcada por ressonância de problemas, semelhança percebida e tarefas compartilhadas. Nessa lógica, não dá, por exemplo, para se trabalhar temas de advocacy social corporativo com influenciadores cujos seguidores são entusiastas de produtos, de entretenimento ou realistas inspiradores. Da mesma forma que não será efetivo trabalhar com conteúdo de novos produtos com influenciadores sujos seguidores são buscadores de informação. É preciso compreender bem o que os seguidores esperam de determinado influenciador, antes de contratá-lo para uma ação de RP.

O surgimento do metaverso

Além de saber lidar com novas redes sociais, novas plataformas digitais, novas gerações e novas relações entre influenciadores-seguidores, qual a compreensão atual dos profissionais de comunicação sobre realidade virtual, realidade aumentada, mundos virtuais e realidades mistas? Essa foi a discussão trazida pelo trabalho “Emerging Technologies Create New Realities in Strategic Communications”, de Donna Z. Davis e Daniel Pimentel, ambos da Universidade de Oregon. A pesquisa apontou que poucos profissionais de Relações Públicas consideram as plataformas emergentes e imersivas que compõem o metaverso em suas estratégias de comunicação e engajamento. A pesquisa foi realizada por meio de uma parceria com uma empresa aeroespacial, em um treinamento online, revisando o uso da chamada “realidade cruzada”, para profissionais de comunicação, a fim de abordar tanto a mudança na conscientização sobre as novas tecnologias e realidades, suas competências em relação às novas ferramentas, bem como a compreensão e intenção dos participantes em adotarem novas plataformas para alcançar e engajar seus públicos de interesse.

Com o crescente aumento da conversa sobre metaverso em 2021, os profissionais de Relações Públicas e Marketing estão lutando para entender as plataformas anteriormente vistas apenas como forma de entretenimento e de jogos. Os resultados revelaram uma lacuna significativa na compreensão e na prática. Existem várias limitações e os desafios ainda são gigantes para os profissionais de comunicação. Antes do treinamento, os participantes não estavam nem mesmo familiarizados com as plataformas. “Esperamos que esta investigação ajude as organizações de outros setores a entender melhor como e por que integrar o metaverso em seus esforços de comunicação existentes”, disse Donna em sua apresentação.

O treinamento foi dividido em 4 sessões, fornecendo casos de uso que demonstraram experiências imersivas, recursos exclusivos de cada plataforma, utilização das realidades por diversos públicos, além de demonstrar estratégias de criação de conteúdo imersivo, discutindo como as marcas podem estar nesse novo universo e como pode ser o futuro do entretenimento, das compras e das conferências virtuais, por exemplo, e como a realidade aumentada pode ser utilizada como uma ferramenta colaborativa. “Existem marcas famosas vendendo seus produtos, os quais não existem no mundo real, e as pessoas compram e pagam caro para ter um artigo apenas digital. Além disso, empresas estão comprando terrenos virtuais para suas futuras lojas”, continuou Donna e nós, Relações Públicas, estamos empolgados? Estamos confortáveis? Estamos preocupados? Estamos preparados para entrar nessa nova realidade?

As novas formas de trabalhar: de forma remota e com frequência flexível

O metaverso também será uma realidade para os ambientes de trabalho? Provavelmente. E as implicações em relação as estratégias de comunicação interna e fortalecimento da cultura organizacional precisam ser discutidas. Esse debate já é forte no que diz respeito as possibilidades do trabalho remoto, impulsionado pela Covid-19 e viabilizado pelas diversas plataformas digitais existentes. O modelo, que demonstrou ser muito mais econômico, produtivo e sustentável deve continuar em muitas organizações. O trabalho “The efficacy and Interaction Effects of Leardship Communication in Remote Work Contexts”, de Renne Mitson e Jay Hmieloski (Universidade da Flórida) e Hao Xu (Universidade de Minnesota), analisou a relação entre a liderança, os estilos de comunicação e a satisfação dos funcionários para compreender esse cenário de trabalho remoto, considerando a frequência do trabalho flexível. Para isso, foi analisado 3 diferentes tipos de comunicação da liderança: responsiva, vigilante e motivacional.

A comunicação de liderança responsiva tem qualidades profundamente relacionais e comunicativas na medida em que é medida por percepções de empatia, ajuda, simpatia, compaixão, sensibilidade, sinceridade, gentileza e acolhimento. A liderança vigilante é única na medida em que defende a abertura, a colaboração cruzada e a responsabilidade, de uma maneira que tenta unir a organização, observando sinais sutis de desafios que a organização pode encontrar, criando uma cultura de preparação. Já a liderança motivacional, pode reduzir a incerteza e orientar para certas direções, reforçar a construção de significado e tentar absorver a cultura para criar valor, ou ainda, trabalhar com a empatia para fortalecer os laços e os relacionamentos. Segundo a pesquisa, os líderes precisam de diretrizes sobre a melhor forma de liderar e como decretar essa liderança por meio da comunicação com seus funcionários. “Se os líderes conseguirem aplicar esses estilos de comunicação estrategicamente em espaços digitais, poderão ser mais assertivos e contribuir para a satisfação dos funcionários”, comentaram os autores.

Os novos papeis da liderança

Além dos novos papeis da liderança para a comunicação interna no ambiente de trabalho remoto e de horário flexível, que exigem uma maior abertura de diálogos com os funcionários, há também uma mudança nos papeis dos líderes quando se trata da comunicação externa, sobretudo para os novos consumidores da Geração Z. Para discutir isso, o trabalho “Enhancing Young Consumers Relational and Behavioral Outcomes: The Impact of CEO Activism Authenticity and Value Alignment”, de Jie Jin, Renee Mitson, Yufan Sunny Qin, Marc Vielledent e Linjuan Rita Men, da Universidade da Florida, investigou a intenção de compra desses novos consumidores de acordo com a autenticidade de ativismo do CEO de uma organização, ao apoiarem ou se oporem a determinadas questões sociais.

A autenticidade do ativismo do CEO é percebida como legítima e verdadeira, de acordo com o que comunicam sua posição pessoal e, principalmente, através de suas ações.  Foi realizada uma pesquisa online para testar o modelo hipotético em uma amostra aleatória de consumidores das gerações Z e Y (entre 18 e 39 anos) nos Estados Unidos.  Um total de 373 respostas qualificadas e completas foram coletadas para identificar: autenticidade percebida, alinhamento de valor percebido e identificação organizacional ligada a comportamento de compra. Os resultados, apesar de aparecerem de forma indireta, ilustram os benefícios da autenticidade e alinhamento de valores na formação de percepções sobre a organização. Na prática, os CEOs devem ter um histórico de comportamento consistente e iniciativa sincera ao cultivar um relacionamento com os consumidores. As organizações, seus líderes e, sobretudos os seus CEOs devem tomar medidas proativas para entender seus principais stakeholders e públicos-alvo em relação aos valores e crenças sociais que defendem e ser cautelosos ao decidir se engajar em determinados comportamentos

 

*Emiliana Pomarico Ribeiro é PhD em Ciências da Comunicação pela ECA-USP e gerente executiva da Escola Aberje de Comunicação.

Victor Henrique Pereira é mestrando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP e gerente de relações com associados, relações institucionais e internacionais.

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