07 de dezembro de 2021

ESG demanda mais que protocolos, demanda engajamento

Na semana passada, à convite da Aberje, estive presente no 8º Congresso Internacional de Compliance, promovido pela LEC – Legal Ethics Compliance, em São Paulo. E, fica o registro: foi o primeiro evento corporativo presencial que participei depois do longo isolamento trazido pela pandemia de covid-19. De máscara, com a carteira de vacinação em dia, tentando o distanciamento com o espaçamento entre as cadeiras dos participantes. O novo normal estava refletido em todos os protocolos aos quais eu me engajo pela plena consciência de que não teremos saída coletiva da pandemia sem o esforço pessoal de cada um de nós.

E é exatamente sobre protocolos e engajamento que quero falar neste artigo. No evento, muito falou-se sobre a importância do Programa de Compliance para o G da agenda ESG. Eu defino o G como o coração da agenda ESG. Sem um bom G que determine limites para uma atuação que não prejudique o planeta, não temos como falar em atuação responsável com os recursos naturais e o meio ambiente. Sem um bom G que determine o escopo de geração de valor para os stakeholders, não temos como falar em atuação consistente para diminuição das desigualdades. E, neste sentido, o Programa de Compliance ganha ainda mais relevância, pois é ele quem cria mecanismos para aliviar e monitorar riscos, visando o funcionamento da empresa seguindo parâmetros éticos e íntegros.

Para uma atuação verdadeiramente alinhada às boas práticas da agenda ESG, o Programa de Compliance precisa não apenas existir. Ele precisa de engajamento. Cumprir as normas e os protocolos precisa estar no coração e na mente das pessoas como um hábito – executados de forma natural. Cumprir as normas e os procedimentos precisa também ser visto como uma ferramenta coletiva de segurança. E, sendo assim, nada mais natural que em suspeitas de risco à segurança, os envolvidos sejam denunciados, investigados e punidos, caso haja evidências.

Em outras palavras, de que adianta existir um documento que explica quais são os riscos ambientais de uma operação, se eles não são mitigados na execução das atividades? De que adianta existir um documento que determina que práticas de assédio moral são inaceitáveis, se elas continuam existindo na empresa? De que adianta existir um documento que tenta coibir práticas de corrupção, se a empresa paga “agrados” para ter vantagens? De que adianta existir um canal de denúncias se o trabalho escravo ou infantil existente não for denunciado? E, sendo denunciado, não for devidamente investigado? O mesmo vale para casos de racismo, para políticas de doações etc.

O Programa de Compliance é uma ferramenta para fazer chegar à alta gestão os problemas que precisam de solução, como o alto índice de denúncias de assédio ou a dependência de fornecedores pela concentração de grandes contratos. E o que isso tem a ver com a agenda ESG? Tudo. A concentração de fornecedores, por exemplo, dificulta a distribuição de renda e o desenvolvimento local. A corrupção corrói a livre concorrência e enfraquece as instituições. O assédio moral ou sexual impede que haja ambientes de oportunidades iguais para todos. Uma política de doações sem estratégia não é eficiente. Tudo está interligado.

A legitimidade da comunicação da agenda ESG vem de evidências, de práticas, de ações concretas. Além da segurança para as operações, o compliance é capaz de reunir e acompanhar as evidências de atuação alinhada às melhores práticas desejadas para a agenda ESG. Mas, para isso, precisa de engajamento coletivo. E este é o grande desafio.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Tatiana Maia Lins

Consultora em Reputação Corporativa, fundadora e diretora da Makemake - A casa da Reputação no Brasil e editora da Revista da Reputação.

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