27 de novembro de 2024
BLOG Sinapse

Governança: a parte sob mais pressão

 

A COP 29, em Baku, e o G20, no Rio de Janeiro, em mais um ano de grandes tragédias climáticas, como no Sul do Brasil e Valência, na Espanha, conclamo à reflexão: entre narrativa e melhores práticas. Estamos muito longe dos objetivos traçados no intermédio das duas últimas décadas, como a Agenda 2030 e o Acordo de Paris. A natureza cobra a conta, como apontou a jornalista Sônia Araripe em seu brilhante artigo na Plurale. E, entre muitos problemas, o principal hoje na transição ao capitalismo consciente, na qual a gestão ESG é crucial, é que o desempenho financeiro ainda é o que tem definido, mais do que nossos reais impactos para superarmos os desafios. E se a Governança não acelerar sua tomada de decisões, todos vão perder!

Não vou me prolongar em apresentar dados de estudos e pesquisas sobre ESG de importantes organizações, complementares ao nosso estudo ESG Compass 2024, que sinalizou, em maio deste ano, para uma maior pressão ao papel da Governança. De fato, o G ainda está bem longe de ser inclusivo, de entender como pode atuar para reduzir desigualdades e enfrentar a emergência climática e acelerar decisões com sensibilidade para gerar impacto. Em minha opinião, no âmbito da comunicação, este fator traz um cenário ainda mais grave: as múltiplas ressignificações sobre seu papel e ações, somadas à polarização nas redes, têm gerado mais desinformação e levado ao esvaziamento do seu discurso diante da sociedade civil. As consequências mais evidentes são mais riscos de crises reputacionais às companhias, com consumidores, cidadãos e autoridades, que esperam mais impacto e propósito das empresas.

Cientificamente, não temos dúvidas: as catástrofes serão cada vez mais frequentes porque não estamos gerando impactos reais, nosso mindset não está pensando a longo prazo. Dá a sensação de que vivemos as últimas três décadas numa espécie de exercício “lúdico” para compreender e atuar em responsabilidade social e sustentabilidade, mas algumas organizações perderam à mão, e as que têm feito e evoluído, se perdem no ecossistema das redes. O problema é que as consequências estão aí.

Em suma, se analisarmos a materialidade das companhias, vemos que  não evoluiu muito, As emissões de GEE apresentam poucas variações a menos e, quando para mais, são sempre justificadas ano a ano pela necessidade de aumento de produção por alguma variável do cenário global; a equidade, inclusão e diversidade se reduziram aos indicadores de número de mulheres, homens em liderança ou de representatividade nas organizações de pretos, indígenas e LGBTQIP+  sem considerar muitas seccionalidades nestes grupos.

Capitalismo consciente não é conceito, é mudança real em transição. A sociedade civil está cada vez mais atenta e crítica, exigindo das empresas e organizações um compromisso real com a transparência e a ética. E é sobre isso que o  estudo ESG COMPASS 2024 da LLYC abordou este ano. Entre seus dados mais relevantes: 29,2% de aumento do interesse pelas melhores práticas da Governança na gestão ESG no Brasil, a democratização do termo na sociedade civil e a influência da desinformação na sua interpretação – embora a popularização do termo seja um avanço positivo, o seu uso como argumento para disseminação de informações errôneas pode distorcer a percepção pública das ações, sinalizando que é preciso ir além e mostrar seus impactos.

Quando olhamos a declaração final do G20 2024, voltamos a sonhar que é possível reverter e mitigar, mas precisamos de mais comprometimento, de ações efetivas e impactos, senão de nada adianta os acordos multilaterais. Por fim, este é um mundo em evolução, movido pela disrupção tecnológica, e vale reforçar que as conversas nas redes sociais evidenciam uma crescente preocupação com a dimensão social do ESG, moldando a percepção pública. Essa dinâmica será cada vez mais crescente e perene, invocando órgãos reguladores e governos a se posicionarem, num ambiente em que as empresas serão ainda mais pressionadas a mostrar seus reais impactos e contribuição. O futuro vai pertencer àquelas que já reconhecem  e estão comprometidas com esta urgência.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Anatricia Borges

Jornalista pela Universidade Federal Fluminense, tem Master em Responsabilidade Social e 3o Setor pela UFRJ e em Gestão de Stakeholders pela FIA USP. Atua há 20 anos na área de comunicação corporativa com foco em projetos de energia e sustentabiidade. Atuou em grandes veículos de imprensa nacionais, foi gestora de Comunicação da Iberdrola na América Latina e Gerente de Comunicação das ONGs Ação Comunitária SP e Cinema Nosso RJ. Atualmente, é Diretora ESG Brasil da LLYC.

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