A desconexão programada da geração Alpha e o papel estratégico das marcas no mundo real

Vivemos em um mundo onde estar online se tornou sinônimo de estar presente. Mas e quando essa presença começa a perder o sentido? Essa é uma das perguntas que a geração Alpha, nascida entre 2010 e 2024, começa a fazer, mesmo tendo crescido em um ambiente de hiperconexão. Ao contrário do que muitos esperavam, os mais jovens começam a questionar o excesso de estímulos e buscam uma vida com menos distrações e mais intencionalidade. E isso diz muito sobre o futuro das marcas, do consumo e da própria cultura.
A 12ª edição do Jaé, relatório de insights da 3mais, traz dados que evidenciam um movimento silencioso e, ao mesmo tempo, revolucionário. Intitulado “Desconexão Programada”, o estudo mostra que 74% dos jovens tentam reduzir o tempo de tela, e 83% valorizam marcas com presença física, como lojas e espaços de convivência. Ou seja, mais do que produtos, buscam experiências presenciais, repletas de autenticidade e significado.
Essa mudança não é apenas um capricho geracional. Trata-se de resposta a um esgotamento. Entre 2015 e 2024, o acesso à internet entre crianças de 6 a 8 anos no Brasil saltou de 41% para 82%, chegando a 97% nas classes A e B. O número de crianças com celular próprio dobrou. Em paralelo, estudos apontam que o uso excessivo de telas está ligado ao aumento de casos de ansiedade, depressão, distúrbios do sono e solidão.
Estamos diante de um paradoxo, pois nunca estivemos tão conectados e, ao mesmo tempo, tão cansados dessa conexão. A geração Alpha, mesmo sem ter conhecido o mundo antes da internet, já entende que viver de forma equilibrada é mais valioso do que estar 24/7 online. Trata-se de nova consciência em formação, que demanda das marcas atenção imediata. A chamada “desconexão programada” é uma prática individual e, não só pode, mas deveria ser incorporada como estratégia de marca, refletindo posicionamento mais alinhado às transformações no comportamento do consumidor.
Essa desconexão, no entanto, não é retrocesso tecnológico, mas um avanço humano e deve ser usado com mais intencionalidade. Casos como o do youtuber Orochinho, que se afastou das telas por um mês e leu 20 livros; ou da influencer August Lamm, que trocou o smartphone por um celular básico e resgatou sua vida social, mostram que esse movimento é real e, em muitos casos, transformador.
O papel das marcas, nesse novo cenário, é criar pontos de contato que sejam intencionais e relevantes. A presença física volta a ganhar importância, mas não como repetição do passado. Ela adquire novo sentido, voltado à experiência, ao afeto e à autenticidade. Não basta ocupar todos os espaços. É preciso estar nos lugares certos, com propósito claro, coerência com os valores da marca e conexão real com o que essa geração valoriza fora das telas. A LEGO, por exemplo, considerou esse contexto ao criar o LEGO Play Unstoppable, espaço de experimentação criativa sem a mediação de telas.
Ao se posicionarem como aliadas na formação desse novo olhar digital, as marcas ampliam seu papel social e fortalecem sua relevância cultural. Mais do que vender produtos, passam a atuar como agentes de transformação, ajudando a construir uma geração mais preparada para lidar com os impactos da hiperconexão. Essa postura não apenas agrega valor à marca, mas também responde a uma demanda urgente por responsabilidade e consciência no ecossistema digital, promovendo conversas e oferecendo ferramentas práticas, como semanas detox ou experiências offline.
Dados do relatório indicam que, enquanto a geração Z se identificava com marcas do universo alimentício, como McDonald’s e M&Ms, a Alpha se volta para marcas de tecnologia e vestuário: Nike, Apple, Adidas, Samsung, entre outras. Essa mudança também revela uma sofisticação precoce no entendimento de marca. No total, 71% dos pais acreditam que seus filhos têm, hoje, percepção mais madura sobre marcas do que eles tinham na mesma idade. Isso muda tudo.
A geração Alpha possui, em média, dez marcas favoritas, o dobro da geração anterior no mesmo estágio. Claro que isso tem relação direta com o acesso à informação de cada geração. Isso obriga as empresas a criarem narrativas mais éticas, transparentes e, consequentemente, com maior complexidade. Afinal, estamos falando de uma geração que já influencia decisões de consumo familiares e que, em poucos anos, estará no centro do mercado.
Identificar as características desse movimento agora trará vantagem estratégica enorme para as marcas. A desconexão programada não é tendência passageira. É uma resposta urgente e necessária a um modelo de vida e consumo que chegou ao seu limite. E se tem algo que aprendemos com novas gerações é que elas não esperam. Simplesmente criam, adaptam e escolhem.
O futuro será digital, mas, sobretudo, humano. Essa é a chave para compreender os movimentos da geração Alpha. As marcas precisarão acompanhar inovações tecnológicas e cultivar presença significativa, ética e emocional na vida das pessoas. Isso exige sensibilidade para ler os sinais do presente e coragem para romper com modelos de conexão que já não fazem sentido. As marcas que souberem equilibrar esses dois mundos permanecerão relevantes e se tornarão agentes ativos na construção de uma cultura mais consciente, saudável e intencional. Afinal, o novo valor não está apenas no que se oferece, mas no modo como se escolhe estar presente.
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