Nova Desordem Mundial: Comunicar em Tempos de Tensão

Fala de Paulo Nassar, diretor-presidente da Aberje e professor titular da ECA-USP, na abertura do Aberje Trends 2025. O Aberje Trends 2025 contou com patrocínio da Arcelor Mittal Brasil, Arcos Dorados, BASF, Bayer Brasil, BHP, Gerdau, Itaú, Latam Airlines, Novo Nordisk e Stellantis, com apoio da Cortex, CPFL Energia, Prospectiva Public Affairs Latam, Vivo e Tetrapak, e media partner da Propmark.

Prezadas e prezados colegas,

Vivemos um tempo marcado pela incerteza, pela instabilidade e por disputas narrativas globais que desafiam os limites da linguagem e da ação. A chamada “Nova Desordem Mundial” não é apenas um rearranjo geopolítico – é também um terremoto simbólico, que exige do comunicador uma formação intelectual robusta, capaz de interpretar contextos, ler códigos culturais e antecipar consequências e oportunidades.

É nesse cenário que a figura do comunicador deixa de ser apenas um técnico da linguagem e passa a ocupar o lugar de um intérprete do mundo. E essa interpretação exige método – exige escuta ativa, pensamento crítico, capacidade de argumentação. Por isso, a formação do comunicador precisa ser não apenas técnica, mas filosófica, estética, histórica e ética. Mais do que um gestor, o comunicador deve ter uma estatura intelectual sólida.

Nesse ponto, gostaria de evocar Sócrates. Em tempos de inteligência artificial generativa e de abundância de dados, é a maiêutica socrática – essa arte do diálogo que provoca, questiona, inspira e faz nascer ideias – que pode nos guiar. A IA não é apenas uma máquina ou ferramenta: ela é uma nova forma de cultura. Uma forma de produzir artefatos, conceitos e interações que afetam valores, crenças e práticas sociais muito além do círculo de seus desenvolvedores. Inspirados por Thomas Kuhn, podemos compreendê-la como um novo paradigma – uma maneira radicalmente distinta de viver e de se relacionar com o mundo e com os sistemas culturais. Nesse novo paradigma, a tecnologia não apenas transforma os meios, mas reconfigura os próprios fins. E é por isso que, mais do que saber perguntar para os sistemas, é preciso saber perguntar para o mundo. A IA só adquire sentido quando está a serviço de uma consciência crítica, capaz de discernir, interpretar e produzir sentidos com responsabilidade histórica, ética e cultural.

Nesse contexto, a  educação continuada, portanto, não é um luxo – é a base da atuação profissional em tempos de crise permanente. Precisamos formar comunicadores que compreendam a complexidade, dominem múltiplas linguagens e desenvolvam atributos como empatia, escuta, repertório e clareza – especialmente em ambientes tensos, fragmentados e movediços.

E é exatamente esse compromisso que a Aberje, sob a minha liderança, tem renovado nos seus mais de 60 anos de história. A Aberje, que plantou a semente da comunicação institucional no Brasil, segue ampliando seu papel estratégico no fortalecimento da profissão.

Tenho um exemplo dessa ação. Hoje, em parceria com a Fundação Itaú, sob a liderança de Eduardo Saron, e a Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV-Rio, sob a liderança de Marco Ruediger, a Aberje é cofundadora de um Mestrado Profissional em Comunicação e Cultura de Dados, voltado especialmente à capacitação de comunicadores do terceiro setor – com bolsas integrais. A segunda turma, que será iniciada em breve, teve mais de 1.000 comunicadores do terceiro setor inscritos em seu processo de seleção de alunos, um número que expressa a urgência e a potência dessa iniciativa.

Além disso, a Aberje tem direcionado sua frente educacional para o campo da comunicação pública, com o propósito de contribuir para a consolidação de uma comunicação pública republicana – uma comunicação de Estado voltada à cidadania, à transparência e à escuta democrática.

Comunicar em tempos de tensão é, acima de tudo, um ato ético. É dar forma ao mundo sem deformá-lo. É buscar a verdade possível em meio ao ruído. E é nesse esforço coletivo que seguimos juntos.

Muito obrigado.

Prof. Dr. Paulo Nassar

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