13 de janeiro de 2020

O primeiro passo para trabalhar a diversidade nas empresas

(Imagem: Freepik/rawpixel.com)

É comum que a conversa sobre diversidade e inclusão nas organizações comece pelos números. Compreensível. De um lado, os dados sobre desigualdade e preconceito no Brasil são alarmantes; de outro, as pesquisas que associam diversidade a melhores resultados para os negócios são mesmo argumentos irresistíveis para avançar com esta agenda no meio empresarial. Números importam, sem dúvida. Mas eu prefiro começar pelas pessoas.

Falar de diversidade é falar de gente, de todas e todos nós, e do conjunto de características que nos tornam únicos. Por isso, antes de tratar deste tema sob a perspectiva da gestão, é preciso compreender de onde falamos e entender quem somos nós neste debate. Um bom começo é realizar os exercícios de reflexividade e posicionalidade.

O primeiro é uma prática de autoconsciência. Pensar em reflexividade envolve necessariamente discutir privilégios, aquele conjunto de coisas que a gente pode fazer apenas por ser quem somos – e que o outro, a outra, não pode fazer justamente por ser quem é. Exemplo: casais heterossexuais andam de mãos dadas na rua sem se preocupar em ser agredidos por isso; casais homossexuais, não.

Falar de privilégios não é tratar de culpas. Ninguém pediu para nascer homem, branco, heterossexual, rico ou sem nenhuma deficiência. Mas ocupar este espaço no mundo traz vantagens e oportunidades que não são distribuídas da mesma maneira para todo mundo. Quando se diz que uma pessoa caucasiana tem privilégios isso não quer dizer que a vida dela foi fácil, mas sim que a raça não dificultou ainda mais. Privilégio é menos sobre culpa e mais sobre responsabilidades. Se eu cheguei até aqui, como posso apoiar aquelas e aqueles que ainda não chegaram? O exercício de posicionalidade, por sua vez, nos convida a questionar de onde partimos. Ele é importante porque nosso lugar de fala pode nos levar a tomar decisões com base em vieses ou fazendo uso de generalizações indevidas. O lugar de fala é o espaço a partir do qual nos relacionamos com o mundo. O homem tem lugar na discussão sobre gênero nas empresas? Uma resposta possível é: sim, mas um lugar de saída limitado, pois não é ele o alvo principal do machismo. Deste modo, quando esta pauta surgir, o protagonismo é das mulheres, porque elas têm vivência com o tema. Homens aliados, no entanto, podem e devem sempre se manifestar a favor da equidade.

Diversidade não é um assunto de gestão como qualquer outro. É, sim, um tema de negócios, mas que não deve ser encaminhado apenas com planilhas e números. O melhor planejamento e a liderança mais comprometida podem não dar resultado quase nenhum se as pessoas envolvidas no processo de inclusão não forem capazes de refletir sobre seus privilégios e preconceitos. Quais são os seus? Pense nisso.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Ricardo Sales

Ricardo Sales é consultor de diversidade, pesquisador e conselheiro consultivo. É formado pela USP, onde também realizou mestrado sobre diversidade mas organizações. Atua para algumas das maiores empresas do país. É conselheiro do Comitê de Diversidade do Itaú. Foi eleito pela Out&Equal um dos brasileiros mais influentes no assunto diversidade nas organizações e ganhou o Prêmio Aberje de Comunicação, em 2019. Foi bolsista do Departamento de Estado do Governo dos EUA e da Human Rights Campaign, sendo reconhecido como uma liderança mundial no tema diversidade. É também palestrante, professor da Fundação Dom Cabral e da Escola Aberje de Comunicação, colunista da revista Você SA e do Estadão, além de membro-fundador do grupo de estudos em diversidade e interculturalidade da ECA/USP.

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