23 de dezembro de 2020
BLOG Agenda 2030: Comunicação e Engajamento

2020: reflexões para um futuro melhor

 

2020 foi um ano atípico na vida de muita gente não só no Brasil, mas também no mundo todo. Imaginar que em março de 2019 estive em Hong Kong visitando o maior Buda da Ásia sentado ao ar livre com subida de 268 degraus; em Taiwan na torre de Taipei, com 101 andares e uma altura de 509 metros onde se usa um elevador para chegar ao topo em 37 segundos; na Coreia do Sul, em Busan, admirando o florescimento do sakura e na China, andando nas grandes muralhas próximo a Beijing e nas longas avenidas aglomeradas de pessoas em Shangai… inimaginável de ocorrer em 2020!

Mas, indo um pouco além, a partir de 2016, participei, de forma voluntária, com mais de 30 pessoas no grupo de governança do projeto Desenvolvimento Brasil 2035 (2016-2018) liderado pelo professor Antônio L. Aulicino, iniciativa do Núcleo de Apoio a Pesquisa e Planejamento de Longo Prazo (NAP PLP) da FEA USP, que culminou no lançamento do livro Desenvolvimento Brasil 2035[1], o país que queremos, neste ano de 2020.

Nesta obra, escrevo sobre algumas variáveis e, dentre elas, desenvolvo, junto com Fernando Marques, a variável “Superpopulação nas grandes cidades brasileiras” (AULICINO; FISCHMANN, 2020, p. 277-286). Vários pontos, tais como cultura, sociedade, economia, política e tecnologia, são explorados e descritos neste texto considerando a evolução histórica e chegando às análises da situação atual que vivemos no contexto global e, especificamente, no Brasil.

A partir desse entendimento, são exploradas e analisadas as tendências e as rupturas possíveis considerando os vários cenários. Interessante notar alguns trechos das tendências: “[…]com o advento da tecnologia, as pessoas não necessariamente terão de estar perto para se sentir perto. Isso pode mudar a simples reunião que já é possível acontecer remotamente, as transações econômicas que podem ser totalmente virtuais, a indústria de turismo, pois será possível, por meio de realidade aumentada, viajar e conhecer novos lugares[…]; a saúde, pois serão possíveis diagnósticos remotos[…] afetando o campo econômico, comportamental, cultural e social”. E alguns, de ruptura, “[…]os recursos e a evolução da tecnologia devem permitir desenvolvimentos que rompam com os modelos antigos e tradicionais e evoluam em direção à melhoria do uso dos espaços habitacionais […] seja mais sustentável de forma a viver melhor[…]”.

Pudemos comprovar, na prática, neste ano de 2020, que tivemos de encontrar soluções rápidas, adaptar-nos ao novo cenário, acelerar o uso da tecnologia que já estava disponível e mudar a nossa forma de trabalhar e de viver o dia a dia, o que afetou o nosso comportamento, a economia e as atitudes culturais e sociais.

Na linha das hipóteses para construção dos cenários, uma das hipóteses dessa variável descrita no livro é “em função da deficiência da infraestrutura de defesa civil, as cidades estão mais expostas às consequências de uma catástrofe, tais como epidemias e guerras químicas, entre outras”. Tão inesperado, mas vivemos e estamos vivendo uma grande pandemia!

E, em outra hipótese consideram-se “[…] deslocamentos da população de grandes centros urbanos em busca de melhor qualidade de vida[….]itens como inovação e tecnologia são pontos-chave com surgimento de novos modelos e formas de viver com prioridade para a qualidade de vida, causando profundas rupturas[…] melhoria do bem-estar individual e coletivo[…]surgem novas profissões[…]haverá uma redução expressiva da desigualdade da sociedade. Para este cenário, serão necessárias mudanças profundas na cultura, no crescimento do senso coletivo e na ação consciente da sociedade”. São fatos que estão ocorrendo na vida de muitas pessoas. Neste instante, está havendo um aumento da desigualdade, mas, no próprio texto, expressamos a necessidade de mudanças profundas na sociedade.

Comentários dos meus colegas: “fui à China antes da pandemia pois já tinha previsto o que iria acontecer – este e os demais textos do livro foram desenvolvidos em 2017, 2018 e finalizado em 2019”. Mas, brincadeiras à parte, refletir sobre o que pode acontecer no futuro, à luz da análise do momento passado e do que estamos vivendo hoje, pode nos ajudar a nos prepararmos para o futuro construindo o futuro que queremos ter. O futuro não se prevê! Possivelmente, se o Brasil tivesse construído melhor a sua infraestrutura sanitária no passado, hoje muitas vidas poderiam ter sido salvas.

Semelhante a essa análise, o livro apresenta outras 37 variáveis, nas quais são descritas hipóteses desejáveis e hipóteses não desejáveis com análise de tendências e rupturas possíveis. Ou seja, das análises de todas as variáveis para construir o Brasil que queremos com as hipóteses que foram consideradas, é possível nos prepararmos para o futuro sendo protagonistas e possíveis atores dessa transformação desejada com construção do futuro que seja possível e desejável pela sociedade, alinhado com o bem comum.

Para não ficar somente na academia e também mais um livro que iria apenas para a prateleira, a partir deste trabalho desenvolvido no projeto “Desenvolvimento Brasil 2035, o país que queremos”, utilizando o Processo Prospectivo (GODET, DURANCE, DIAS, 2008)[2], criamos o Instituto Prospectiva – INSPRO em julho de 2018, que tem a “finalidade de fomentar a criação e construção do futuro de forma sustentável, com base na Prospectiva, incentivando a apropriação pelos diversos interessados por meio de abordagens multidimensional e transdisciplinar”.  E um exemplo prático é a participação do Inspro no desenvolvimento do Projeto Cristalina 2040 após abril de 2020, iniciado pelo professor Antônio L. Aulicino em fevereiro de 2019, com o objetivo do fortalecimento do Arranjo Produtivo Local (APL) de gemas, joias, artesanato mineral e turismo de Cristalina, com participação de sua sociedade construindo o cenário possível e desejável em 2040 com implementação de ações  a partir de hoje.

Acreditamos também que a Agenda 2030, da ONU, com os seus 17 ODS e 169 metas e uma centena de indicadores, ajude nesse processo de sensibilização, conscientização e movimento para a ação com a criação do futuro que queremos em 2030 para todos e de forma coletiva.

Aproveitando o texto com o qual participei da publicação, no qual relato que “os ODSs são interligados, integrados e correlacionados, sendo assim devemos trabalhar nesse sentido, devemos unir esforços, trabalhar em conjunto e compartilhar responsabilidades. O ‘meu’ tem que dar lugar ‘ao nosso’, as ‘ações isoladas’ têm que dar lugar ao ‘trabalho em equipe, para um bem maior’, o ‘fazer sozinho, no meu pedaço’ tem que dar lugar ao ‘diálogo’”, reforço a necessidade de que essa construção precisa ser coletiva, multi e transdisciplinar.

2021 está chegando! Muito aprendizado e grandes desafios foram enfrentados em 2020 e as sequelas ainda continuarão – esses acontecimentos foram e continuarão sendo marcantes e perdurarão por vários anos. A capacidade do ser humano de esquecer as coisas ruins e lembrar as coisas boas poderá ajudar em ações mais conscientes, em sermos mais minimalistas, com menos desperdício, em procurarmos as coisas mais simples e naturais, em acentuarmos o nosso senso coletivo, em não prejudicar a si nem a outros ao redor. Todo esse conjunto deve ajudar na mudança de comportamento.

É uma transformação lenta, mas o choque causado pela pandemia ficará ainda na memória de muitos e pode contribuir para essa mudança de atitude. E, utilizando a reflexão e a prática que a Prospectiva traz, como o futuro desejado é o desenvolvimento coletivo, a redução da desigualdade, o consumo consciente e ter um Brasil mais justo e solidário, cada um de nós deve ajudar a construir este futuro que queremos!

[1] AULICINO, A. L.; FISCHMANN, A. A. (Orgs.). Desenvolvimento Brasil 2035: o país que queremos. Curitiba, PR: CRV, 2020.

[2] GODET, M.; DURANCE, P.; DIAS, J. D. A prospectiva estratégica para as empresas e os territórios., Paris: Dunod, 2008. Cadernos do Lipsor, n. 20. Coleção Topos.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Clarice M O Kobayashi

Clarice M O Kobayashi é engenheira Elétrica, EPUSP; EMBA, BSP; membro de board de empresas, sócia diretora da CK Counseling & Knowledge; fundadora e diretora do Instituto Prospectiva – INSPRO – com atuação em Planejamento de Longo Prazo; membro do CONECTICIDADE da PRO Poli USP; membro do CRA SP nos grupos TST, GENE, GPG e participa da CEC Comissão de Engajamento e Comunicação da Rede do Pacto Global.

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