12 de abril de 2019

Aberje Trends 2019, 1º dia: democracia, negócios e reputação

Perspectiva do CEOs sobre os negócios no Brasil (Foto: João José Carniel)

Por Tiago de Medeiros, Maria Eduarda Oliveira, Thaislane Xavier (Jornalismo Júnior) e Andre Nakasone

Hamilton dos Santos faz a abertura do 4º Aberje Trends (Foto: João José Carniel)

“Hoje não pode mais haver dilema entre fazer a coisa certa e perder bilhões, você tem de fazer a coisa certa. A boa notícia é que é possível você fazer a coisa certa e ganhar bilhões”, afirmou Hamilton dos Santos, diretor geral da Aberje, na abertura da 4º edição do Aberje Trends. O evento aconteceu nos dias 3 e 4 de abril, no centro de eventos do Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, com o tema “Comunicação, Negócios, Política e Reputação: a nova atmosfera no Brasil”. Foram dois dias para discutir as principais tendências que impactam a comunicação e os negócios, com grandes nomes de profissionais da comunicação corporativa brasileira, além de palestrantes internacionais e presidentes de grandes empresas.

Hamilton aproveitou a ocasião para anunciar uma parceria da Aberje com a Associação Portuguesa de Comunicação de Empresa (APCE). Paulo Nassar, diretor-presidente da Aberje e professor titular da ECA-USP, e Eduardo Guedes, presidente da APCE, subiram ao palco para assinarem o termo de parceria. “Como disse Durkheim, o pai da sociologia, uma profissão só existe quando ela tiver prática, teoria e associação entre as pessoas. A comunicação, mais do que nunca, deve construir pontes e não muros”, afirmou Nassar. Eduardo Guedes acrescentou: “Esse é um grande passo para a língua portuguesa no universo da comunicação. Além do Brasil, pretendemos avançar também para outros países que falam nossa língua, como Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, Timor Leste, entre outros”.

Aberje firma parceria com a APCE – Associação Portuguesa de Comunicação de Empresas (Foto: João José Carniel)

Na pauta dos dois dias estava sustentabilidade, comunicação pública, negócios e política, governança corporativa, liderança, reputação, relações governamentais, transformação digital, tendências globais em comunicação, novas tecnologias, e co-criação. Confira abaixo os principais insights:

(Veja a cobertura do segundo dia aqui).

O Aberje Trends 4ª edição tem patrocínios da Accor, Amil, CCR, Coca-Cola Brasil, CPFL Energia, Latam Airlines, LexisNexis, McDonald’s e Vivo, e apoio da APCE (Associação Portuguesa de Comunicação de Empresas), Global Alliance for PR and Communication and Management, Instituto Marca e Reputação, I’max, Jornalista e Cia, Negócios da Comunicação, Mega Brasil e Plurale.

As fotos do evento podem ser conferidas na fanpage da Aberje no Facebook.

Quatro conferências para o amanhã

A manhã do primeiro dia do Aberje Trends trouxe quatro “conferências para o amanhã”. Os temas foram sustentabilidade e negócios; comunicação pública; governança corporativa; e jornalismo. A mesa redonda foi mediada por Leandro Modé, Superintendente de Comunicação Corporativa do Itaú Unibanco.

A primeira conferência, “A era dos ESG: as novas expectativas dos investidores”, foi apresentada por Denise Hills, consultora chefe de Sustentabilidade e Negócios Inclusivos do Itaú Unibanco. Ela refletiu sobre as enormes transformações digitais que a sociedade passa. A grande questão que se coloca é: esse avanço tecnológico também é garantido em termos de sustentabilidade? Essa pergunta é chave para os negócios, pois está cada vez mais claro que as demandas sociais e do meio ambiente afetam a sobrevivência das empresas. “Cada vez mais, os investidores buscam empresas que têm clareza de propósito”, afirma. Não apenas os investidores. Consumidores, funcionários e futuros talentos, há uma pressão da sociedade que cobra posicionamentos claros das empresas em relação aos problemas globais. “Por isso é preciso comunicar o que é genuíno”, afirma Denise.

Adolfo Mesquita Nunes, ex-secretário de Estado do Turismo de Portugal, falou sobre a importância e proporção que a Inteligência Artificial está ganhando no processo de comunicação. “O conhecimento sempre existiu no mundo. O que acontece agora é que a Inteligência artificial ajuda a compilar essa grande quantidade de informação. Essa é a grande revolução da comunicação pública nos novos tempos. E ela não está só na comunicação e nos negócios, mas na natureza humana. A IA dá capacidade de recolher, tratar e dinamizar o conhecimento que existe no mundo, de forma rápida e lógica”, afirma.

No caso do turismo, os dados mostram onde as pessoas estão, sua rotina de viagem, quais pontos turísticos que mais as atraem. “Quem melhor conhece o turista não é a oferta, é a procura”, explica. “Os dados podem falar diretamente com o turista, não mais com ‘o brasileiro’ genérico, mas com o indivíduo real que irá viajar”.

Sobre política, Adolfo reflete sobre a atmosfera polarizada que se instaura em nível global. “A democracia é lenta. Implica negociar, dialogar, encontrar consensos. Mas os meios digitais estão criando um ambiente impaciente, de pessoas que querem soluções rápidas. Isso é um risco para a democracia”.

Leila Loria, vice-presidente do Conselho de Administração do IBGC, falou sobre governança corporativa e reputação. Segundo Leila, os órgãos de governança das empresas começaram a apertar os pontos em relação aos riscos reputacionais. Se antes os conselhos avaliavam riscos operacionais, financeiros, etc, hoje os riscos reputacionais também entraram na agenda. “A reputação percorre todos os riscos da empresa”, afirma. Nesse tema, é importante o equilíbrio entre os riscos e a paralização completa, ou seja, buscar minimizar os riscos para garantir a operação. “Há uma certa arrogância e miopia dos executivos quando olham para seus próprios negócios e os riscos envolvidos nele. A comunicação tem que estar ao seu lado para aconselhá-lo”, explica.

Leila também comentou sobre a questão das mulheres no mercado de trabalho. “Não posso deixar de falar das mulheres no conselho. Esse tema é absurdo no Brasil. Tirando cargos de suplente, as mulheres são 4% nos Conselhos. Não é possível que não haja mais de 4% de mulheres competentes no mercado”. Sobre o tema, Denise Hills complementa: “Nenhum modelo de negócio inteligente e eficiente deixaria metade da humanidade para trás. Diversidade é no mínimo uma ótima oportunidade de negócio”.

João Gabriel de Lima, diretor da Época, contou sobre as novas formas de fazer jornalismo. Ele deu o exemplo de como dois dos maiores veículos de imprensa no mundo, NY Times e Financial Times, fizeram para ganhar prestígio na era digital. “O aumento da produção voltada para o assinante com boa qualidade, transparência e ética formam um casamento com o cliente, que passa a confiar no veículo”, afirma. Assim, o jornalista explica que, depois de muito tempo na incerteza, há um cenário claro do que está dando certo no jornalismo: assinaturas digitais e nova publicidade, que não tem a ver com compra de anúncio, mas com conteúdo.

João Gabriel de Lima, Denise Hills, Leandro Modé, Adolfo Mesquita Nunes e Leila Loria (Foto: João José Carniel)

Para onde caminham as relações governamentais?

Relações governamentais são um tema polêmico. Recentemente, o governo brasileiro reconheceu o lobby como ocupação, mas deixou lacunas nas atribuições do profissional de relações institucionais e governamentais. Por não ter regulamentação definida, o tema gera muitos questionamentos, motivadores da mesa Para onde caminham as relações governamentais?, que teve mediação de Maria Elisa Curcio, Diretora de Assuntos Corporativos para América Latina da International Paper.

A mesa contou com o professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Manoel Leonardo dos Santos, que apresentou dados de pesquisa feita pela universidade junto com Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Nela foi possível perceber que há uma profissionalização diversificada dos agentes que trabalham com relgov. Para Santos, isso mostra a interdisciplinaridade e alto nível de qualificação do ofício.

O professor cita que o Brasil segue uma “tendência mundial de regulamentação da atividade de relações governamentais”. Mas, apesar da regulamentação ser benéfica, a legislação pode ter efeitos inesperados, como o caso dos Estados Unidos em que a “lógica policialesca” de regulamentação é prejudicial à atividade do lobista. “As relações institucionais são um campo promissor de pesquisa”, diz. Cabe tanto aos órgãos públicos quanto à iniciativa privada investir na área. Afinal, um dos pontos frágeis é a falta de fonte segura de dados. Saber o quanto o Estado brasileiro é influenciado é questão fundamental para a democracia. “Não saber disso nos deixa às cegas”, conclui o professor.

O Secretário Executivo da Secretaria de Comunicação do Governo do Estado de São Paulo, Eduardo Pugnali, falou sobre as relações institucionais sob a perspectiva do governo. O secretário esclareceu o estigma ao redor da atividade lobista: “O lobby não é ruim. Ele apenas se tornou um termo pejorativo”. O palestrante relatou que, com o fenômeno das fake news, uma das principais atribuições da Secretaria da Comunicação é “desatar nós de informação mal construída”. Informação que, às vezes, é resultado de falta de transparência. “O que está claro não gera dúvidas e não traz problemas”, ressalta. E por isso também defende a regulamentação da atividade: “Se a conversa não pode acontecer no Congresso, vai acontecer no café em frente ao Congresso. Isso vai na contramão da transparência”.

Falando também na perspectiva do governo, Márcio Gonçalves, diretor da Secretaria de Transparência e Prevenção da Corrupção, enfatizou que ética, confiança e transparência devem permear relações governamentais. A assimetria informacional existente no contexto brasileiro é um empecilho para que a sociedade possa exercer de forma plena seus direitos. E, por isso, é preciso pensar em que país queremos em termos de relações público-privadas. O diretor apresentou alguns índices, como o da Percepção da Corrupção, que mostram que o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer.

Paulo Castelo Branco, presidente do Conselho de Ética da Associação Brasileira das Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), lamentou o fato de que a atividade de relgov seja associada com práticas ilícitas. Os últimos ataques ao ofício fizeram que com que as autoridades ficassem com receio de se relacionar com os profissionais das relações governamentais. No entanto, ele considera que os órgãos públicos estão mostrando esforços para lidar com a iniciativa privada.

Márcio Gonçalves, Paulo Castelo Branco, Eduardo Pugnali, Manoel dos Santos, e Maria Elisa Curcio (Foto: João José Carniel)

Palco e público se misturam

O Pitch ABERJE foi um painel dinâmico moderado pela gerente de Engajamento com a Comunidade e Sustentabilidade da International Paper, Tamara Natale. Consistiu no sorteio de participantes da plateia, o que tornou a atividade mais interativa e com grandes possibilidades de aprendizado.

A pergunta motivadora do pitch foi: “o que a empresa de vocês está fazendo para cocriar com públicos estratégicos?”. A necessidade de interação com o cliente foi enfatizada no painel, que contou com três profissionais de áreas diferentes. O trabalho conjunto de uma agência de comunicações com a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e uma série em formato de animação da Embraer foram alguns dos projetos apresentados.

Transformação Digital: construindo o engajamento de equipes internas e externas em espaços colaborativos

Com a presença de Maurício Martinez, gerente da Oxigênio Aceleradora, Diana Rodrigues , diretora de marketing da TOTVS, Daniel Sincorá, gerente de comunicação interna do BNDES e Paulo Henrique Soares, diretor de comunicação do Instituto Brasileiro da Mineração, a mesa discutiu o que é feito nas respectivas instituições para ajudar startups não só a nascer, mas também permanecer no mercado.

Como dito por Soares, inovação tem que ser “cultural e de dentro para fora”. Para uma empresa ajudar aquela que acabou de nascer é necessário entender seu perfil e suas necessidades antes de qualquer outra coisa e geralmente há falhas na comunicação interna.

Rodrigues acrescentou ao dizer que “não é fácil se inovar em comunicação quando estamos focados apenas em inovação tecnológica e esquecemos de enxergá-la como tudo que ainda não foi pensando”.

Transformação digital, inovação e universo das startups (Foto: João José Carniel)

Os negócios e a nova atmosfera do Brasil: a perspectiva com o CEOS

O painel que fechou o primeiro dia de evento foi moderado pela diretora de redação da Época Negócios, Sandra Boccia, e contou com cinco CEOs de grandes empresas: Carlos Zarlenga, presidente da General Motors América do Sul, Cristina Palmaka, presidente da SAP Brasil, a atriz Bruna Lombardi, empreendedora e CEO da Rede Felicidade, Luiz Sérgio Vieira, CEO da EY, e Patrick Mendes, CEO da Accor América do Sul.

O objetivo da conversa foi ouvir a visão de líderes empresariais sobre os negócios e a atmosfera do Brasil, as mudanças de comportamento e as redes sociais. Transparência, liderança e crises foram alguns temas comentados no palco.

Carlos Zarlenga, da GM, falou sobre as redes sociais e a relação das empresas com os consumidores. “No começo, todo mundo estava aplicando um manual corporativo. Mas essa não é a linguagem nativa da rede, tem que ter uma coisa mais pessoal”, afirma. “Temos que perder o medo e deixar as pessoas interagirem.”

Luiz Sérgio Vieira, da EY, falou sobre estratégia e propósito nas redes sociais. O executivo contou que, no Dia Internacional das Mulheres, publicou três conteúdos em seu perfil no LinkedIn: um vídeo institucional da empresa sobre o tema, outro sobre um programa de desenvolvimento de carreiras das funcionárias, e o último contava a história de uma colaboradora com síndrome de Down, que fazia aniversário na mesma data. Esta última postagem teve um alcance muito maior que qualquer outra, cinco vezes mais do que o vídeo institucional. “As pessoas querem autenticidade”, afirma.

Patrick Mendes, da Accor, contou que, ao assumir a presidência, mudou seu posicionamento em suas redes sociais e tornou-se mais ativo, um trabalho em conjunto com a sua equipe de comunicação. “Preciso falar tanto com os colaboradores quanto com os clientes. A imagem da empresa está cada vez mais ligada à imagem do CEO”. Tal postura ativa em suas redes pessoais tem a ver também com o setor de atuação da empresa, uma vez que no Instagram 60% dos posts são ligados à gastronomia, turismo e viagens. “Sou quase um garoto propaganda”, diz.

Porém não há uma fórmula única. Cristina Palmaka, da SAP Brasil, concorda que é preciso representar a companhia, mas deve ser feito de forma genuína. Assim, ela prefere reservar-se nas redes: “O meu Facebook é pessoal. Já o LinkedIn é uma ferramenta de trabalho, porque é uma excelente mídia para contar tudo o que a gente faz de legal na empresa”. Além das redes pessoais, Cristina comenta sobre a presença das marcas nas mídias sociais. “A SAP tem a sua fanpage, que é onde ela fala com a comunidade. Não somos somente uma empresa BtoB. Nos entendemos como ‘BtoBtoC’, porque nosso propósito é ajudar as empresas a serem melhores. A gente toca o cliente dos nossos clientes”.

Bruna Lombardi pondera sobre os benefícios que as redes sociais promovem ao dar voz a todos. “As redes possibilitam participação, pessoas que não tinham voz, que eram invisíveis, que não tinham oportunidade, hoje têm. Eu adoro a democratização da rede. Tem sim muita porcaria nas redes, mas isso tem em qualquer. A escolha sempre vai ser sua sobre a maneira que irá usar essa ferramenta”

Outra questão levantada pela mediadora é sobre como eles lidam com fake news. Zarlenga contou sua experiência, quando a transparência foi necessária. Em janeiro, o presidente da GM anunciou os problemas pelos quais passava a empresa aos seus funcionários, contando que havia risco da montadora fechar as portas. “Não foi um erro. A transparência que tivemos no começo foi o que nos ajudou a virar a situação e fazer o ano de investimento ser o maior da história da empresa no Brasil”.

Patrick Mendes também contou como lidar com fake news na Accor. “Tivemos cerca de quatro anos complicados no setor hoteleiro e nesse ambiente, é comum os rumores de que a empresa encerraria as atividades. A nossa resposta foi se comunicar. Eu aprendi que quanto mais se comunica, menos fake news se gera”. Internamente, ele participou de uma ação onde foi entrevistado ao vivo por um empregado da área de comunicação. Ele reproduzia os questionamentos que surgiam nos cafés, nas conversas de corredor, a chamada “rádio peão”. “Eu não sabia o que iam me perguntar. A ideia foi me aproximar das equipes, e lidar de forma lúdica com um assunto tão pesado.”

Vieira comentou sobre as eleições que deixaram o país muito polarizado e trouxe à tona discussões sobre diversidade e direitos humanos. A EY percebeu que alguns de seus funcionários estavam preocupados. Sem declarar sua preferência política ou seu candidato, o CEO contou que enviou uma mensagem a todos. “Primeiro, parabenizando ao país, que, de forma democrática, conseguiu eleger um presidente. Sem fazer juízo de valor. Mas deixei bem claro quais são os valores da nossa empresa: diversidade e inclusão. Queremos que todo mundo se sinta incluído nessa empresa”. E continua: “Nós precisamos gastar sola de sapato e conversar com as pessoas. Esse negócio de CEO que fica num pedestal não existe. O CEO tem que ter obsessão pelo cliente e pelas suas pessoas. Então ele tem que estar lá, conversando com todo mundo, entendendo quais são os problemas”.

Perspectiva do CEOs sobre os negócios no Brasil (Foto: João José Carniel)

 

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