Encontro da Aberje com Alan Gripp discute transformação digital nos 100 anos d’O Globo

No mês em que o jornal O Globo completa seu centenário, o diretor de Redação Alan Gripp participou de um encontro virtual com integrantes do Comitê Aberje de Relacionamento com a Imprensa. Organizado pela Aberje, o evento reuniu lideranças profissionais de comunicação de organizações associadas para discutir os desafios do jornalismo em meio à transformação digital, às novas tecnologias e à fragmentação da atenção do público.
“O momento dos 100 anos tem sido de celebração e também de autoconhecimento”, afirmou Gripp. Segundo ele, ao revisitar sua trajetória, o jornal tem reafirmado a inovação como linha mestra desde sua fundação, em 1925, quando o Rio de Janeiro abrigava mais de 30 periódicos, muitos deles ligados a partidos políticos. A proposta d’O Globo era outra: colocar o leitor no centro, como principal público e agente.

Hoje, o jornal está entre os maiores do país em diversas métricas digitais, como audiência, assinaturas e alcance. “O digital deu ao jornal uma escala nacional que antes era limitada pela geografia da edição impressa”, explicou Gripp. “Noventa por cento da nossa circulação impressa ainda está no Rio de Janeiro, mas no digital isso desaparece. A audiência é nacional”, continuou. Com isso, O Globo passou a disputar a atenção não só com veículos rivais, mas com plataformas como Spotify e Netflix. “Nosso concorrente hoje é o orçamento familiar e a atenção das pessoas”, resumiu Gripp.
Transformação digital
A inflexão digital do jornal ganhou novo impulso a partir de 2017, quando a edição impressa passou a ser tratada como uma das muitas entregas possíveis a partir da produção digital realizada ao longo do dia. A transformação exigiu revisão de práticas, reorganização de processos e mudanças culturais. “Hoje estamos no momento de maior circulação da história do jornal, e não falo só de tiragem impressa”, disse Gripp, ao explicar que o número de visitantes únicos nos canais digitais do veículo equivale a 15% da população brasileira.
Com o digital, o jornalismo também se tornou mais orientado por dados. As métricas, que antes não existiam ou eram de difícil acesso, passaram a integrar as rotinas editoriais. “Elas não são o único motor da produção, mas nos ajudam a entender o comportamento da audiência e a renovar pautas e colunistas. A ‘intuição jornalística’ deixou de ser a única bússola”, afirmou Gripp, brincando que o jornalista antes se achava o “dono da verdade”, mas hoje conta com dados para orientar sua apuração. Um exemplo disso é a mudança na abordagem da editoria de Saúde, que passou a tratar o tema a partir da lógica do bem-estar no pós-pandemia, e não mais apenas como relato de doenças.

O jornal também tem investido em inteligência artificial, com iniciativas voltadas para conteúdo, ferramentas para leitores e ganhos de produtividade – sempre com a supervisão humana. Entre os exemplos, Gripp citou o uso de IA na análise de discursos parlamentares realizados ao longo de vários anos, a oferta de serviços como simuladores de aposentadoria e o desenvolvimento de funcionalidades como resumos, tradução automática e buscadores. Ao mesmo tempo, alertou para o impacto da IA sobre o modelo de negócios baseado em assinaturas. “É uma tecnologia extremamente disruptiva, mas pode causar um colapso se continuar usando conteúdo jornalístico sem pagar por isso”, afirmou.
Compromisso público
A combinação entre tradição e inovação tem permitido ao jornal expandir seu papel de utilidade pública. Durante a pandemia, todos os conteúdos relacionados à Covid-19 foram abertos, isto é, podiam ser acessados livremente, sem paywall. Da mesma forma, reportagens e serviços de interesse amplo seguem disponíveis sem barreiras. “Para o público mais geral, produzimos conteúdos voltados a toda a população”, explicou. Ferramentas como calculadoras de aposentadoria ou comparadores de combustível mostram como o jornalismo pode ajudar o leitor a tomar decisões do cotidiano a partir de informações confiáveis.
Gripp também destacou o esforço em manter a relevância do jornal impresso, ainda valorizado por parte da audiência. Embora o número de assinaturas físicas tenha caído, o interesse pela edição em PDF dentro do aplicativo digital se mantém alto. “Há dez anos, ouvíamos que o impresso ia acabar. Passaram-se 20, e ainda não sabemos quando isso vai acontecer. Ele ainda tem valor e permanecerá presente durante um bom tempo.”
No plano estratégico, a atuação nacional é tida como questão de sobrevivência, especialmente diante da crise econômica que atingiu o Rio de Janeiro nas últimas décadas. “Acredito na recuperação do Rio, mas estar em São Paulo como um player de primeira linha é inegociável para qualquer jornal que vive de assinatura digital”, afirmou Gripp, apontando para a necessidade de escalar produtos digitais e a relevância das grandes cidades brasileiras para isso.
Outro ponto abordado foi a mudança no perfil exigido dos líderes executivos dos veículos de comunicação. Segundo Gripp, hoje, cerca de 70% de seu tempo está dedicado à gestão executiva, criação de produtos e estratégias de crescimento digital. “Não há jornalista que já saia da redação preparado para isso, é algo que se aprende no cotidiano. Criamos inclusive um curso, o ‘Jornalismo do Futuro’, porque a academia ainda não forma profissionais com esse tipo de repertório.”
A relação com o setor empresarial também evoluiu. A abertura do jornal às pautas de negócios e economia tem refletido um novo entendimento sobre o interesse público. “O leitor quer saber das empresas, porque lida com elas no dia a dia. Perdemos o preconceito com o mundo corporativo”, afirmou Gripp. Para ele, essa aproximação não compromete a independência editorial, mas amplia a relevância do jornal. “A gente não passa um domingo sem publicar uma entrevista com um CEO.”
Na visão do diretor, o papel social do jornalismo permanece central, especialmente diante da disseminação de desinformação. “O jornalismo precisa equilibrar o uso de novas ferramentas com a defesa de seus valores e da qualidade editorial. E, ao mesmo tempo, batalhar para que seus direitos não sejam atropelados.” Nesse contexto, a conexão direta com o leitor se torna cada vez mais relevante. “Perdemos a intermediação, e os jornais devem liderar a discussão sobre como restabelecer esse vínculo.”
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