19 de setembro de 2016

Mais sobre o fim da Avaliação de Desempenho como a conhecemos

Sérgio Piza, Diretor de Gente de Gestão da Klabin

Conheci o Sérgio há mais de 20 anos, quando trabalhamos juntos na Ford. Em todo esse tempo, eu nunca cansei de admirá-lo pela habilidade de enxergar o que é essencial na gestão de pessoas, e tirar todo o supérfluo da cena, para garantir a execução. Inteligente, competente e boa pessoa. Foi por isso que quis trazer os pontos de vista dele sobre as mudanças.

 

Paula: Sérgio, sei que você está promovendo, na prática, uma mudança importante no jeito de medir o desempenho na Klabin.  Pode contar por que mudou e como funciona a gestão do desempenho nesse novo modelo? Você confia que o novo jeito vai estimular o foco no resultado sustentável que a empresa quer entregar?

Sérgio: Estamos investindo num processo que favorece relacionamentos e um ambiente que garantam o resultado desejado, pela pessoa e pela empresa, olhando para o futuro, e não para o passado. Eu tinha duas críticas ao modelo atual:

  1. A nota, seja pelo lado do processo, ou pelo lado do relacionamento entre as pessoas, atrapalha. Acabamos com as notas, rótulos ou conceitos, como “atende parcialmente” ou “supera expectativas”. Ao eliminar as notas no processo, diminuímos a tendência do chefe de tentar fazer seu time parecer melhor do que efetivamente foi, para influenciar sua remuneração. As notas, que nasceram para diferenciar desempenhos excepcionais, foram se perdendo – ao longo dos anos a curva deixou de ser normal, aqueles que ficam na empresa vão melhorando suas notas e os desempenhos vão ficando todos muito parecidos. E, pelo prisma dos relacionamentos, o fim da nota é um alívio, porque era muito duro ter que dizer para um subordinado ou ouvir de seu chefe que você teve uma nota baixa.
  2. Avaliar o desempenho é julgar. Não cria um ambiente de confiança, porque a organização está legitimando que o chefe sabe alguma coisa que o subordinado não sabe, ou que o 360o disse alguma coisa diferente do que ele percebia. Cria-se um ambiente em que a pessoa tende a esconder suas dificuldades ou gastar tempo e esforço em parecer forte em algo que talvez ela não seja. Ao avaliar formalmente, o chefe sentia-se no papel de juiz, o que já dificulta o feedback e a conversa. O avaliador escamoteia, se comunica por eufemismos, ou usa um jeito muito americano nessa conversa – “vamos falar primeiro os pontos positivos, depois as oportunidades de desenvolvimento…” pouco natural, não? Como consequência, a pessoa não tem um feedback de verdade e é julgada, o que também é ruim.

 

Entendi o que “morre”, mas não sei o que nasce no lugar.

Sérgio: Sou contra a nota e sou contra avaliar, mas não sou contra fazer a gestão do desempenho. Para mim, é importante para a empresa e para a pessoa que ela faça bem seu trabalho, sinta-se bem e entregue bons resultados. Se o ambiente não for favorável, a pessoa não vai se conectar com a empresa, e dificilmente entregará resultados de forma sustentável. Acredito no binômio conexão e resultado – só um deles não garante a sustentabilidade.

Por isso, cheguei à conclusão que era melhor tirar a avaliação, tirar o feedback e substituir esses dois pelo termo “conversas de desenvolvimento”.

Nessas conversas, eu chego para você e te pergunto quais são seus desafios para o futuro, o que você precisa para ter êxito e o que eu posso fazer para te ajudar a atingir seus objetivos – não em termos de recursos, mas de conhecimento e comportamentos.

 

E como as pessoas reagiram à mudança?

Sérgio: Nas primeiras conversas dessa natureza, não é incomum que a pessoa diga que não precisa de nada. Cabe ao gestor, se for necessário, relembrar a performance passada, para encontrar naquelas circunstâncias o que foi difícil quando não houve êxito, ou quais comportamentos estavam presentes quando houve. Nesse tipo de conversa, meu foco é o futuro, e não estou julgando ou avaliando.

 

Quando você investe nessas interações mais corriqueiras e informais para gestão de desempenho, como você garante que a empresa terá clareza sobre seu pipeline de talentos e sucessores?

Sérgio: Acabamos de promover na Klabin uma grande conversa anual de desenvolvimento, que substituiu a reunião de calibragem. Só que, ao invés de falarmos sobre o passado, discutimos o potencial de cada indivíduo e o que nós e ele podemos fazer para entregar mais. Sem usar o tradicional modelo 9-boxes, falamos do potencial dos indivíduos, com base nas competências de liderança da empresa. Durante a reunião nos perguntamos: “quem, se entregar, merece um próximo degrau de desafio?”. Como não havia nota de avaliação ou 9-box,  tivemos que mudar a forma como conversar sobre remuneração.  Projetamos todos os salários em ordem decrescente, com outros dados como tempo, experiência, e houve clareza entre o time de liderança sobre quem merecia mais, quem já estava bem remunerado. A compensação foi avaliada versus a entrega, mesmo, sem nenhum material ou nota.

 

Vocês já tem, na organização, uma uniformidade de critérios nessa reunião?

Sérgio: O maior desafio não foi chegar a uma uniformidade de critérios, e sim, o qualificar o gestor para ter essas conversas, porque ele sempre foi ensinado a avaliar, a olhar para o passado em busca de evidências e exemplos para justificar o que quer dizer e embasar seu feedback.  Antes das conversas, o time de RH ajudou cada gestor a se preparar para cada conversa, com cada indivíduo. “Sobre essa pessoa, o que você vai dizer?” Teve muito “ensaio” antes da reunião.

 

O foco no futuro requer uma conexão total com o planejamento estratégico da empresa – em que áreas ou atividades a empresa vai crescer, que novas habilidades vamos precisar. Vocês tiveram esse capítulo de conversas entre os gestores, como preparação para o ciclo de gestão de desempenho?

Sérgio: Focamos primeiro em preparar as pessoas para o novo tipo de conversa. Dentre os quase 14.000 funcionários, mais ou menos 700 já foram envolvidos no novo modelo.  A grande sacada foi ganhar a adesão de todas as pessoas para a conversa de desenvolvimento. Foi um desafio para os gestores – deu muito trabalho para eles e para o RH. E não foi só novo para os gestores, tivemos que ensinar também o subordinado a participar dessa conversa, ele tem que ser menos passivo, tem que participar tanto quanto o gestor.

 

Mas foi um aprendizado importante, da próxima vez vai ser ainda melhor.

 

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Paula Traldi

Depois de uma carreira de mais de 20 anos de realizações e sucesso como executiva de Recursos Humanos, decidi iniciar minha consultoria, a Blossom Consulting. Meu propósito é ajudar os líderes a melhorar a performance de suas organizações através das pessoas. Como? Propondo e implementando maneiras práticas de alinhar os processos de gestão de pessoas à estratégia e à cultura da empresa. Meu diferencial? Trago muita experiência desde a estratégia até a implementação, ofereço uma solução única para cada cliente e acredito na simplicidade. Sou psicóloga, cursei pós-graduação em administração, trabalhei no Brasil, América Latina, Estados Unidos e na Inglaterra. Sou filha, irmã, mãe e esposa.

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