18 de dezembro de 2020

Capítulo Aberje Ceará fecha o ano com debate sobre o tema de 2020: Comunicação Não-Violenta

2ª edição do Encontro Ceará viabiliza troca de experiência e de vivência sobre CNV entre associados

2ª edição do Encontro Ceará viabiliza troca de experiência e de vivência sobre CNV entre associados 

O Capítulo Aberje Ceará realizou, no dia 10 de dezembro, o 2° Encontro Aberje na região, para abordar o tema Comunicação Não-Violenta. Na ocasião, a diretora do Capítulo Aberje Ceará Emanuela França, gerente de Comunicação da CSP – Companhia Siderúrgica do Pecém, recebeu Fernanda Moreno, coordenadora do curso de MBA em Gestão de Pessoas do Centro Universitário Farias Brito; Aline Castro, diretora de Comunicação do TRT-SP e VP do Fórum Nacional de Comunicação e Justiça; e Pamela Seligmann, psicóloga e pedagoga, também instrutora de CNV na Escola Aberje. Mediou o evento Mauro Costa, sócio-fundador e diretor de Comunicação Institucional da AD2M Engenharia de Comunicação.

Ao agradecer a presença de todos, Emanuela França salientou a Comunicação Não-Violenta (CNV) como prática cada vez mais necessária. “A pandemia tem nos exigido mais empatia, mais respeito, mais inclusão e mais escuta e dentro das organizações essa adaptação do híbrido virtual/presencial tem sido um exercício, um desafio para as lideranças e para os times, mantendo a comunicação saudável, humanizada e gerando resultados”.

Reflexões sobre a CNV

A proposta essencial da Comunicação Não-Violenta (CNV) é focar a comunicação na investigação das necessidades humanas universais. Marshall Rosenberg, criador dessa abordagem, diz que “podemos treinar para enxergar a expressão de necessidades a partir do que os outros falam, não importa como se exprimam” e que “não podemos nos responsabilizar pelas necessidades alheias, mas pela maneira que nos comunicamos”.

A coach Fernanda Moreno considera a CNV uma filosofia de vida: “é uma fonte inesgotável, quem cai nessa água não quer mais sair, quer se banhar sempre”, disse. Na ocasião, Fernanda compartilhou sua própria experiência com a Comunicação Não-Violenta por meio de várias reflexões. “Não está no nosso controle mudar ninguém, mas aprendi que o que eu posso fazer pelos outros é me tornar uma pessoa melhor”, iniciou.

Fernanda Moreno

Ela frisou que, em Comunicação, muita coisa pode ser mal interpretada. “Na forma alienante de se comunicar não há espaço para uma conexão honesta porque há crítica e julgamento. A CNV vem enfatizar a forma como as pessoas se comunicam e expressam suas necessidades. A ‘minha’ necessidade não é mais importante que a do outro”, ponderou. Uma inquietação muito veemente de Marshall era refletir sobre o que mantém alguém conectado ou afastado de sua natureza compassiva. “Todos temos a bondade, a compaixão e a empatia dentro de nós. Podemos reaprender a escutar, no sentido de nos conectarmos com o outro. O que está vivo em você? Reflita sobre isso, se observe internamente e perceba as suas necessidades”, provocou.

“Vivemos em uma realidade de conformismo ou de autoritarismo. Ou ‘eu’ faço o que as pessoas querem ou ‘eu’ faço o que todo mundo faz, porque é mais cômodo, mais confortável e esquecemos que temos a nossa essência, a nossa singularidade. A gente corre o risco de não ser visto, de estar vivo mas não existir, de ter saúde mas estar doente mentalmente”, analisou. “A vida, na sua simplicidade, nos chama à realização de sentidos e isso é algo muito grandioso mas, muitas vezes, não percebemos o que há nas entrelinhas do que é dito e também do que não”, refletiu a especialista em logoterapia – tratamento terapêutico com foco no sentido da vida criado pelo psiquiatra Viktor Frankl. 

A metáfora da girafa e do chacal

A girafa é o mamífero terrestre que tem o maior coração e do alto do seu pescoço, consegue ver mais longe, enxerga outras possibilidades, consegue ir além. Por isso a girafa representa, na CNV, uma forma de comunicação que amplia o olhar diante das situações. Já o chacal, animal predador e agressivo, simboliza uma comunicação com pouca ou nenhuma conexão com o outro, através de um olhar raso sobre as coisas, cheio de críticas e julgamentos. 

Marshall Rosenberg e a metáfora da girafa e do chacal

“Podemos aprender tanto com a girafa quanto com o chacal. Ao nos aprofundarmos na CNV percebemos que não temos inimigos e paramos de entender as situações como afronta ou embate; passamos a perceber a necessidade do outro”, salientou a coach Fernanda Moreno.

Tecnicamente, a CNV apresenta quatro passos para uma comunicação conectada: a observação, o sentimento, a necessidade e o pedido. “Observar um fato sem julgamentos é o primeiro passo. Muitas vezes vemos apenas um recorte de algo que é muito maior do que o que estamos vendo naquele momento específico”. 

A CNV também ensina a parar para refletir sobre o que realmente se quer. “Ao se conectar com esse sentimento do que se quer com honestidade é possível perceber quais são as nossas necessidades. É preciso se conectar a elas para fazer pedidos a mim mesma ou a alguém. Mas antes se pergunte o que você pode fazer por você hoje. A CNV nos traz essa autorresponsabilidade: cuidar de si mesmo antes de cuidar do outro”, complementou.

A CNV no universo corporativo

O modelo estruturado por Marshall, baseado em quatro passos – observação, sentimento, necessidade e pedido – não tem o objetivo de tornar as relações mecânicas. Pelo contrário, esses elementos abrem caminho a uma conexão com mais verdade nos processos de comunicação, em que há respeito pelas necessidades alheias e pelas próprias, contribuindo para relações mais harmoniosas, inclusive no ambiente de trabalho.

Ao abordar a Comunicação Não-Violenta no universo corporativo, Aline Castro acredita ser um processo que não ocorre da noite para o dia. “Para mim, a maior expressão de uma comunicação violenta é aquela que está no ‘piloto-automático’. Vivemos num mundo autocentrado e egóico, num ritmo de vida acelerado e inconsciente e essa abordagem vem nos convidar a ganharmos mais consciência dos processos comunicativos em todas as esferas. Muito mais do que uma técnica que remete à mecânica, a CNV é um misto de linguagem com pensamento e pode dar um novo significado para nossas relações em múltiplos níveis”, disse.

Aline Castro

Em sua análise, a CNV pode estar em tudo nas organizações mas, principalmente no que se refere à gestão de pessoas e às políticas de comunicação. “Ela pode transformar nosso jeito de liderar. A pandemia tornou as coisas mais difíceis com as pessoas trabalhando à distância e, ao identificar com mais clareza o que eu estava sentindo e o que eu estava precisando – por meio do conhecimento na CNV -, eu consegui fazer pedidos mais claros”, contou.

“Incorporamos a escuta no nosso processo comunicativo, para atender às necessidades organizacionais e ao mesmo tempo, colocar nossos públicos no centro desse processo, com menos modismo de redes sociais e mais essência em nossas manifestações. Uma comunicação feita com real humanidade, carregada de sentido e consciência dá vitalidade e energia à organização. Se unirmos isso a lideranças mais perceptivas e conscientes”, complementou.

Uma maneira de estar no mundo

Segundo Marshall, o cerne da Comunicação Não-Violenta é que toda violência é a expressão trágica ou dramática de uma necessidade que não está sendo atendida. “Nós passamos por momentos em que nossa expressão é violenta quando deixamos de atender a nossa própria necessidade”, esclareceu a psicóloga Pamela Seligmann, instrutora da Escola Aberje, que estuda a CNV há 13 anos.

A CNV é a nossa oportunidade diária de contribuirmos a partir do nosso local de trabalho, da nossa família, das nossas relações para não aumentarmos ainda mais o grau de violência que existe no mundo. “Não somos violentos, estamos violentos. Por que o entretenimento das famílias à noite na TV é um filme de assassinato? Por que o videogame mais vendido no mundo é o Fortnight, um jogo cuja finalidade é correr atrás de alguém com uma arma para exterminá-la?”, questionou a especialista. “Porque está no nosso lazer atentar contra o nosso semelhante. É a banalização do mal”, respondeu.

Pamela Seligmann

Pamela segue sua análise dizendo que ‘construímos uma sociedade que, além de perseguir a violência como lazer, anula e vê de forma pejorativa as emoções negativas, aquelas nada agradáveis de sentir – como raiva, medo e tristeza. “São elas que justamente nos protegem e nos alertam que nossas necessidades não estão sendo atendidas. Nós criamos uma sociedade egoísta em que só há lugar para o prazer e a alegria”, avaliou.

Ao trazer a questão da consciência, a especialista frisou que não é possível desvincular a CNV da psicologia, já que se trata de um caminho de autoconsciência. “Eu preciso estar atento às minhas necessidades. As necessidades universais humanas são comuns a todas as pessoas. Normalmente as pessoas brigam porque querem empurrar as suas estratégias para o outro, achando que a sua é a melhor”, explicou.

Mais do que uma metodologia, a CNV é uma abordagem, uma maneira de se colocar no mundo e de olhar para as relações, que tem a ver com ‘poder’, mas o ‘poder com’ e não o ‘poder sobre’. “Todos os dias buscamos atender as nossas necessidades e não a dos outros. Não é difícil falar girafa, difícil é desconstruir as estruturas de chacal, ou seja, permanecer em algo que não funciona mais. CNV é prática e no começo sai uma girafa com orelha de lobo, com rabo de guaxinim, uns ‘Frankensteins’, tudo menos girafa. É preciso praticar, praticar e praticar”, recomendou.

 

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