13 de dezembro de 2021

Webinar com Shoshana Zuboff debate dados, manipulação de comportamentos e democracia

Evento teve participação de Shoshana Zuboff, principal pensadora da era da informação

Considerada uma das principais pensadoras da era da informação, Zuboff falou sobre seu conceito de Capitalismo de Vigilância

A Aberje, Fundação FHC e Editora Intrínseca promoveram um webinar no dia 9 de dezembro, com a principal pensadora da era da informação, Shoshana Zuboff,  autora do best seller “A Era do Capitalismo de Vigilância: A Luta por um Futuro Humano na Nova Fronteira do Poder” (Editora Intrínseca). O evento contou com a participação do jornalista Pedro Doria e do editor de conteúdo da FHC Otávio Dias como entrevistadores. Na ocasião, a professora emérita de Harvard alertou para uma nova era do capitalismo em que os cidadãos são constantemente vigiados por uma arquitetura digital ubíqua, que possibilita a extração incessante de volumes gigantescos de dados sobre o comportamento das pessoas – com total desrespeito à privacidade e sem nenhum tipo de contrapartida. 

Shoshana Zuboff iniciou contando uma história real. Segundo ela, não há nada melhor do que uma história para passar conceitos. “Uma equipe jornalística de Londres escreveu essa história em setembro de 2020, sobre a campanha de 2016 do Trump que impedia que cidadãos negros pudessem votar nas eleições. A equipe investigativa viu mais de 5 mil artigos com detalhes de perfis e características de personalidades, atitudes, interesses e preocupações, vulnerabilidades. Tudo isso para manipular o comportamento de quem vota, especialmente em Michigan e Ohio”, contou.

Nas campanhas – prosseguiu Shoshana – o diretor digital Brad Parscale utilizou as ferramentas de anúncio do Facebook para identificar cidadãos que tinham menos probabilidade de apoiar Trump e dissuadi-los. Isso incluía cerca de 3,5 milhões de pessoas negras. “Esses cidadãos negross foram bombardeados com conteúdo corrupto para convencê-los a não votar. Isso seria, de acordo com mecanismos algoritmos padrão, utilizados nos anúncios do Facebook todos os dias. Eles queriam mudar o comportamento em massa e em escala. Este foi o maior declínio que houve nos Estados Unidos”. 

“Alguns anos depois, em 2020, um dos executivos do Facebook fez a seguinte pergunta: será que o Facebook foi responsável pela eleição de Donald Trump? ‘Acho que a resposta é sim’, disse ele, ‘mas não pelos motivos que as pessoas acreditam’. Ele disse que Trump foi eleito porque ele fez a melhor campanha de anúncios digitais, utilizando as ferramentas que temos para  mostrar a coisa criativa para cada pessoa”, continuou.

Shoshana frisou que essas pessoas desistiram do seu direito de votar e fizeram isso sem nenhuma ameaça de ninguém. “Isso não é um pesadelo de totalitarismo. Esse trabalho é o que eu chamo de poder instrumental, secretamente tirado de dados através da instrumentação digital. Eu chamo a economia que formatou esses mecanismos de capitalismo de vigilância, porque você tem elementos de capitalismo tradicional, mas isso não pode ser realizado sem as tecnologias e relações sociais da vigilância, de observação, secretamente consumindo a experiência humana, uma vez considerada privada, transformando esses dados humanos em ativo corporativo disponível para fabricação e venda”.

Lei Geral de Proteção de Dados

O Brasil é um dos países que criou legislação específica em relação a dados, a Lei Geral de Proteção de Dados, que prevê uma série de cuidados que as empresas precisam ter com os dados dos usuários. Nesse contexto, como as companhias, especialmente na área de Comunicação, podem contribuir para ir além do simples compliance e, realmente, caminhar para uma verdadeira cultura de proteção de dados?

Shoshana entende que há muitas empresas que estão dispostas a caminhar nessa direção, sem o “capitalismo de vigilância”. Entretanto, a pesquisadora acredita que a oportunidade para fazer isso será melhor alavancada por meio de leis. “Quando nós falamos sobre as leis de proteção geral de dados no Brasil e em outros países, até fora da União Europeia, estamos falando sobre proteção de fluxos de dados e concentrações de dados. Em primeiro lugar, muitos desses dados não deveriam nem existir, eles foram roubados ilegitimamente”, enfatizou.

“Muito de nossa privacidade já foi destruída. Portanto, quando falamos de proteção de dados, estamos falando de uma atividade posterior. Eu acredito que as nossas leis precisam atacar o problema anterior: a coleta primária de dados, essa extração secreta e ilegítima de dados sobre comportamentos de nossas experiências pessoais. Na era digital, vamos precisar de dados e das tecnologias, mas que isso opere de acordo com direitos fundamentais e ligado ao uso público, à necessidade pública. Quando tornamos a coleta desses dados ilegais, nós limpamos a paisagem competitiva, de modo a estimular que floresçam todo tipo de empresas que querem nos trazer produtos e serviços alinhados com ideais e princípios democráticos”, completou.

A live está disponível na íntegra no Youtube da Fundação FHC (em inglês):
Ou na página da Fundação FHC no Facebook (tradução simultânea em português).

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