07 de fevereiro de 2020

Comunicação 2020

Robôs, drones, AI, IOT, big data, pesquisas sobre neuro marketing e a união do digital com o biológico numa velocidade estonteante. Isso não é mais filme de ficção científica, é uma realidade avassaladora invadindo o mercado, o universo empresarial e transformando a sociedade.

Segundo Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial e autor do livro “A Quarta Revolução Industrial”, muita gente ainda não está enxergando as consequências de todos estes movimentos disruptivos e revolucionários que a tecnologia está potencializando. O mercado de trabalho nunca mais será o mesmo e os desafios das organizações para contratar e capacitar pessoas para esse admirável mundo novo são igualmente desafiadoras.

A promessa da chamada indústria 4.0 será de maior autonomia para máquinas inteligentes, capazes de aprender sozinhas e se comunicarem entre si, liberando os operadores humanos para controles remotos e teoricamente possibilitando tempo para se dedicarem a outros trabalhos ou mesmo para ficarem com suas famílias. As cidades e seus espaços físicos, os centros comerciais serão inteligentes e interconectados a bancos de informações, imagens e dados capazes de identificar num piscar de olhos os interesses de um cliente ou até mesmo as intenções de um cidadão. Robôs humanizados e programados para a empatia substituirão telefonistas estressados nos call centers; drones farão o delivery das pizzas sem pedir gorjetas; em dias de chuva poderemos moldar nossas galochas de borracha em casa, nas nossas impressoras 3D, rapidamente, antes de sairmos para a rua encharcada. Smart offices farão grupos de profissionais trabalharem à distância através de reuniões holográficas reduzindo viagens internacionais ou evitando deslocamentos no trânsito; consumidores poderão vivenciar emoções e sensações através de gadgets instalados em seus dedos e sobre seus olhos ou mesmo vestir a experiência de uma marca antes de comprarem produtos ou serviços e assim, dezenas de milhares de hábitos e comportamentos deverão mudar ou mesmo desaparecer pela força de inovações deslumbrantes. Alguns teóricos dizem até que as prisões poderão acabar e no lugar delas, condenados receberão equipamentos de realidade virtual que, como tornozeleiras, não só indicarão sua localização como farão sua ressocialização. Tudo parece possível.

Mas para que tudo isso aconteça como imaginado pelos cientistas e pelos visionários empreendedores, tamanha revolução demanda não somente conhecimentos técnicos por parte dos profissionais, mas de preciosas habilidades pessoais. Conversar através de dispositivos vai ficar cada vez mais fácil e simples contudo, a frieza desses canais poderá distanciar ainda mais as pessoas umas das outras. Pode parecer estranho, mas a busca pela humanização dos robôs me parece crescer na mesma medida que a robotização dos humanos.

Não somos máquinas já nos alertou Charles Chaplin em seu “Tempos Modernos” e sua sátira aos avanços industriais. A inglesa Mary Shelley, muito antes de Chaplin, em 1818, escreveu seu romance Frankenstein ou o Prometeu Moderno no qual a criatura emocional se rebela contra seu criador, racional e deslumbrado com os potenciais inovadores da sua ciência. Potencialidades que se mostram incontroláveis.

Vamos lembrar que novas torres de Babel poderão ruir caso a comunicação entre as pessoas seja esquecida ou mesmo “mal dita”, fragmentada e ruidosa, mesmo que repleta da canais e conexões. Já vivemos isso nas organizações, sejam elas públicas ou privadas. Temos vivenciado o aumento da tagarelice pelos canais como o Whatsapp e testemunhado a perda de sentido e significado dessa enxurrada de informações e estímulos recebidos. Como nossa percepção é seletiva e num ambiente de extrema velocidade, vivemos sob um bombardeio sensorial extenuante e a tendência é selecionar uma parte mínima do conjunto. Só mesmo robôs darão conta de tanta informação. Mas quem programa esses robôs?

Acredito que as empresas precisam de gente com a paixão por aprender, desaprender e reaprender; capacidade colaborativa sob pressão e de trabalho em rede; capacidade de trabalhar em ambientes ambíguos e sob constante processo de mudança; flexibilidade e inteligência emocional para lidar com conflitos e capacidade para prever, entender e resolver problemas. Todos eles, no meu entender são baseados unicamente na habilidade de comunicação intrapessoal e interpessoal. Na base de tudo, a comunicação é o diferencial de processos de trabalho bem-sucedidos. Afinal, acredito que a comunicação é a base de um saber cuidar – minha definição para “sustentabilidade”.

Se a nova indústria 4.0  exigirá maior habilidade de comunicação e poucos apps ou plataformas on line serão capazes de dar conta do lado emocional das relações humanas, sinto que existe uma urgência pelo cuidado mais atento e afetivo dos relacionamentos humanos. Um simples clique, um simples send ou delete poderá afetar a vida de milhares de pessoas. E poderemos nem perceber que a mais nova e surpreendente inovação desta semana ou da próxima, tem poder de impactar vidas humanas de forma avassaladora.

Este desafio existe desde a produção industrial mecanizada – a primeira revolução industrial-, e passou pelas mudanças trazidas pela eletricidade, a manufatura em massa e também com a chegada da eletrônica, da tecnologia da informação e das telecomunicações. As inovações tecnológicas avançam, mas a dificuldade de conversar permanece. Ou não? Se robôs com reações humanizadas substituirão as pessoas em determinados postos de trabalho e cada vez mais no atendimento ao público, as interlocuções presenciais continuarão conflitantes pois as novas disputas por poder, reconhecimento do mérito, competitividade entre departamentos, egos e vaidades, iniciativa e estilos de liderança continuarão existindo prejudicando o diálogo.

A comunicação vai ganhar mais apetrechos digitais, repletos de cores e luzes inebriantes, mas precisará ganhar também mais qualidade de relacionamento, empatia e abertura, cuidado entre os interlocutores. Não queremos a multiplicação das máquinas inteligentes, mas sem coração, nem tampouco do monstro de Frankenstein com um coração amargurado, cegando a própria capacidade de raciocínio.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Luiz Antônio Gaulia

Jornalista. Mestre em Comunicação Social pela PUC-Rio. Especialista em Comunicação Empresarial pela Syracuse University/Aberje. Pós-graduado em Marketing e em Comunicação Jornalística. Ex-Gerente de Comunicação da CSN - Cia. Siderúrgica Nacional e da Alunorte (PA). Atuou no O Boticário e no Grupo Votorantim. Realizou projetos de comunicação corporativa e sustentabilidade para a VALE, a Light, Petrobras, Ajinomoto e Norsul. Foi Gerente de Comunicação Corporativa e Sustentabilidade do Grupo Estácio. É Diretor da Race Comunicação e professor da FGV Rio e da ESPM SP.

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