28 de maio de 2020

Qual o impacto dos vieses cognitivos na tomada de decisão dos comunicadores durante a pandemia?

Comunicar em meio a situações complexas e incertas, como a crise gerada pela Covid-19, é um enorme desafio. Principalmente porque nestes momentos sempre exigem dos profissionais de comunicação ações rápidas e assertivas. Ressaltando que muitas dessas tomadas de decisão trazem impactos profundos e de longo prazo para a reputação de pessoas, negócios e organizações.

A pergunta que sempre vem à mente neste momento é: será que estou acertando?

E em busca de como ajudar pessoas a tomarem decisões mais assertivas, principalmente em situações de crises, pesquisadores se debruçaram e, através de vários estudos e experimentos sociais, chegaram a uma conclusão no mínimo inusitada:

O nosso grande inimigo nesse processo somos nós mesmos. Ou melhor, a nossa mente!

Nesse artigo vamos explicar brevemente sobre o que são os Vieses Cognitivos e como eles mascaram as nossas tomadas de decisão e faz com que as pessoas achem que estamos no caminho certo. Compreender e aprender qual o impacto que tais comportamentos trazem para as nossas decisões é um grande passo para que possamos tomar decisões mais corretas e assertivas, ainda mais quando estamos tratando de profissionais de comunicação que lidam com um dos maiores ativos das organizações: a reputação.

Entendendo os vieses cognitivos

Recebemos milhares de informações constantemente. Nosso cérebro é estimulado a cada segundo por fontes distintas. E para lidar com essa infinidade de mensagens, nossa mente aciona uma espécie de “caminho mais curto” para a tomada de decisão e conclusão para alguns tipos de problemas.

Os Vieses Cognitivos são atalhos mentais que fazem com que ajamos de forma simples e instintiva diante determinadas situações, sem que seja preciso chegar aos níveis mais profundos do pensamento. Esse mecanismo foi desenvolvido há milhares de anos, quando os ancestrais do ser humano não tinham muito tempo de analisar profundamente as situações antes de agir.

Porém, nos dias atuais, para que seja possível tomar decisões inteligentes e assertivas, é indispensável que se analise objetivamente a situação, o contexto, as possibilidades e os envolvidos. Ou seja, é necessário saber driblar esses atalhos.

No ambiente organizacional, um bom profissional de comunicação é aquele que, mesmo sob pressão, consegue evitar soluções fáceis e instintivas. É aquele que reflete, busca informações externas, entende situações e avalia a melhor forma de agir e de comunicar.

Estamos sujeitos a inúmeros vieses, tanto no âmbito individual, quanto no âmbito coletivo. Ao longo das últimas décadas, já foram catalogados mais de 170 vieses cognitivos que tendem a impactar nosso julgamento. Os vieses podem nos fazer tomar decisões erradas não apenas do ponto de vista técnico, mas também até do ponto de vista ético.

A seguir, separamos alguns que podem atrapalhar a qualidade das tomadas de decisões pelos profissionais de comunicação, sobretudo, em plena crise gerada pela pandemia da Covid-19.

1. Viés do narcisismo e do beneficio próprio.

Ele visa proteger a nossa autoestima. Faz com que nossa mente inconscientemente processe e absorva a informação que é vantajosa para nós e ignore ou mesmo apague de nossa memória aquela que não é boa. Outra manifestação é atribuir o sucesso ao nosso talento e o fracasso às circunstâncias e aos outros.

2. Viés do egocentrismo.

Tendemos a ter uma percepção inflacionada sobre nossa contribuição pessoal para qualquer esforço coletivo. Qual é o percentual de boas ideias de sua equipe de trabalho geradas por você? Pesquisas realizadas após o término de projetos mostram que a soma dos porcentuais do grupo pode ultrapassar facilmente os 200% quando os membros são questionados individualmente sobre a sua contribuição.

3. Viés da confirmação.

Tendemos a atribuir mais importância e a procurar ativamente por informações que confirmam nossa crença ou opinião inicial. Esse argumento é corroborado por pesquisas que mostram que tendemos a gastar duas vezes mais tempo para encontrarmos informações que apoiam nosso ponto de vista do que informações que o contradizem. Outro dado coletado pelos pesquisadores é que o efeito do viés de confirmação tende a ser maior em temas com maior carga emotiva e com preconceitos mais enraizados, como política e religião.

4. Viés do otimismo ou excesso de confiança.

Este viés nos faz superestimar as perspectivas de resultados de nossas atividades e a subestimar seus riscos e geram uma espécie de “ilusão de controle” acerca dos resultados das nossas atividades, mesmo quando não possuímos qualquer controle sobre os diversos fatores que as impactam.

5. Viés do favoritismo.

Este viés nos faz ter uma forte tendência a apoiar e a favorecer as visões de pessoas que pertencem ao nosso grupo, em comparação com as opiniões daquelas vistas como fora do nosso círculo. A ideia de grupo compreende não apenas as pessoas de nossa família ou equipe de trabalho, mas também aquelas que pertencem à nossa religião, raça ou gênero.

6. Viés do desconto excessivo do futuro.

Temos uma preferência desproporcional pelo benefício imediato em relação ao benefício futuro. Aplicar este viés nos leva a minimizar as consequências de nossas ações.

Superando os vieses

É muito importante conhecer e saber diagnosticar os vieses que atrapalham a nossa tomada de decisão e é necessário também ter claro como mitigar estes impactos.

Independente do viés que você esteja sendo impactado, uma boa forma de mitigá-lo é sempre tentar olhar a situação com uma visão mais holística e completa. É seguir o roteiro: parar, dar um passo pra trás, analisar, compreender, tomar a decisão correta e seguir em frente.

É preciso entender que às vezes estamos tendo determinado tipo de pensamento por ser o caminho mais fácil. Porque queremos que seja assim, porque é mais cômodo ir de acordo com o que os outros pensam, ou porque aquilo deu certo pra outra pessoa. Mas é imprescindível olhar se aquela situação realmente está de acordo com o que você precisa decidir.

É simplesmente agir de maneira serena, inteligente e mantendo os pés no chão, focando no que é real. Por isso, reflita sempre nos motivos pelos quais você, profissional de comunicação está tomando determinada decisão. Ela está de acordo com a realidade? Quais são as opiniões contrárias? Quem será afetado? A ideia da maioria é realmente a que eu acredito? Quais são os exemplos positivos e negativos que eu devo considerar?

Dessa forma, o profissional de comunicação com uma visão mais analítica e ampla tem mais condições de tomar decisões corretas. Não permita que a sua mente te atrapalhe durante as suas decisões! Use ela da melhor forma possível. Até porque os vieses cognitivos que existem são muito importantes para a nossa mente funcionar. O importante mesmo é entender em que ponto isso passa a te prejudicar.

 

Referências:

SILVEIRA, A. M. Ética Empresarial na prática: soluções para Gestão e Governança no Século XXI.

TONETTO, L. M.; KALIL, L. L.; MELO, W. V.; SCHEIDER, D. Di G.; STEIN, L. M. O papel das heurísticas no julgamento e na tomada de decisão sob incerteza. Estudos de Psicologia, v. 23, n. 2, p. 181-189, 2006.

Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor.

Fábio Risério

Palestrante, consultor, pesquisador e professor dedicado à cultura de integridade e sustentabilidade nas organizações. Formado em Relações Públicas pela UNESP, com especializações em Comunicação Empresarial pela ECA/USP e Inteligência de Mercado pela FIA/USP e MBA em Gestão de Sustentabilidade pela FIA/USP. Profissional com 20 anos de experiência, em projetos em organizações como o Instituto Ethos, Grupo Promon, Organização das Nações Unidas/ONU; Câmara Brasileira da Indústria da Construção/CBIC; Fundação Alphaville, entre outras. Sócio-Fundador da Além das Palavras: Negócios Éticos e Sustentáveis e professor da Fundação de Direito de Vitória/FDV, da Fundação de Dom Cabral/FDC, da Fundação e Instituto de Administração/FIA e da PUC-Campinas. É facilitador de cursos na Aberje, Instituto ARC e no Instituto Ethos.

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